Retrato do artista quando jovem é uma obra limiar na trajetória do irlandês James Joyce. Com traços autobiográficos, esse "romance de formação" traz vários elementos que estavam presentes na coletânea de contos Dublinenses: o ambiente estagnado de Dublin (sua cidade natal), o peso asfixiante da religião católica e a questão da identidade nacional e cultural da Irlanda (com sua sempre incômoda subserviência à coroa inglesa). Mas, se os dois livros foram publicados no mesmo ano de 1914, as narrativas de Dublinenses foram escritas muito antes e ainda pertencem a um registro mais linear e realista, ao passo que Retrato do artista quando jovem já traz o germe do terremoto estilístico produzido por Joyce em Ulisses (1922) e Finnegans Wake (1939). Com fluxos de consciência e uma aguda descrição das convulsões interiores pelas quais passa o protagonista Stephen Dedalus (cujo nome remete a Dédalo, o fabuloso artífice da mitologia grega), a linguagem do livro vai mudando conforme ele amadurece, até ceder a voz (já no epílogo, em forma de diário) ao próprio personagem - que assim se liberta dos fantasmas da moral católica, da culpa por suas fantasias eróticas, do ambiente amesquinhado da família e da Irlanda, fazendo da própria literatura o instrumento para conquistar liberdade e autonomia.