Pandora 21/05/2020Primeiro, acho que falou um prefácio para introduzir Edmond Charlot - de quem muitos nunca ouviram falar - e para situar o leitor na Argélia enquanto colônia francesa. O livro começa com o fechamento das portas daquela que foi a Les Vraies Richesses (As verdadeiras riquezas), de Charlot, nos anos 90; pula pra uma conversa entre nativos em 1930 e depois vai para o diário de Charlot, cinco anos depois. E este é só o começo caótico da narrativa.
Kaouther Adimi misturou neste livro uma história verdadeira, a de Edmond Charlot com uma falsa, a de Ryad e como pano de fundo a conturbada história da Argélia. O problema é que ela não explica nada, as informações são jogadas ao leitor: os diários de Charlot, os fatos históricos, as suas impressões como cidadã (ela se coloca como parte das vozes argelinas no livro)... e se o leitor não tem o mínimo conhecimento sobre a Argélia e o papel de Charlot no círculo literário, é necessário fazer várias pesquisas sobre tudo para se conectar minimamente à história.
A coisa que mais me encantou no livro foi o entusiasmo de Charlot e seu amor pelos livros. Ele era um otimista. Quando decide abrir uma filial de sua editora em Paris, em determinado momento em que os negócios vão mal, ele escreve: ‘Um poeta. Um assassino. Se nem com isso a gente não sair dessa…’ Isto porque a editora seria instalada num antigo bordel, em que um dos frequentadores era um famoso poeta e cujo dono teria sido assassinado.
Até o fim de sua vida Charlot continuaria dizendo que a livraria e a editora não teriam existido sem os seus amigos e ignorava fofocas e maledicências do tipo ‘andam falando mal de você’. Mas se falaram, ele também teve amigos fiéis que o honraram: em 2010, seis anos após a sua morte, o poeta Frédéric Jacques Temple fez uma grande doação para que fosse criada a fundação editorial Edmond Charlot. Charlot tinha apoiado Temple e sido o primeiro a publicá-lo. Também foi o primeiro a publicar Camus, e sua pequena livraria foi ponto de encontro de intelectuais, escritores, pintores e jornalistas argelinos e franceses.
O diário de Charlot (1935-1961) é importantíssimo porque além de tratar de questões pessoais e profissionais, nos dá um panorama das dificuldades da guerra, da falta de matéria prima, a morte em voo de Saint-Exupéry, a prisão do próprio Charlot em 1942, a distribuição de livros como resistência, a luta pela libertação da Argélia...
Enfim, embora eu não amado a execução desta narrativa, eu adorei ler sobre a Argélia e de ter tido contato com os diários de Charlot. Terminei este livro agradecida pela sua existência. Adoraria tê-lo conhecido.