spoiler visualizarMarí 24/01/2024
Te lembro, nas xícaras de café e em céus tingidos de cinza
Te lembro,
Nas xícaras de café e em céus tingidos de cinza e lágrimas,
Em cartas, em livros velhos tão empoeirados que quase não se consegue enxergar o título na lombada,
Em máquinas de escrever de teclas duras que rangem ao toque,
Em uma mulher de corpo violão, cabelos encaracolados, batom vermelho e cigarro na boca,
Em um homem cuja vida lhe roubou a alegria, a sorte, e a esperança, e que se esconde em
casacos de chuva, chapéus, e na sombra das madrugadas em que o céu chora,
Em um amor não correspondido, em uma tentativa falha de ser amado.
Eu comecei a leitura desse livro no ano passado, e terminei no dia do aniversário da minha mãe.
Eu ouso dizer que talvez tenha sido uma das melhores histórias que eu já li na vida. Um conto que é quase palpável. Que me arrancou um pouco de tudo. Uma história que me deu frio na barriga, que me fez pintar esse cenário gótico e melancólico que carrega as coisas boas nos detalhes.
Esse livro tem cheiro de chuva, de café preto sem leite com bastante açúcar, de livro velho tão empoeirado que quase não se consegue ler o título na lombada, de cigarro e de fumaça, e de perfume barato de mulher.
O cenário desse livro é de um céu carregado de nuvens negras, e chove quase o tempo todo. Os cenários desse livro se dividem em bibliotecas, casarões abandonados mal assombrados pela história de quem antes viveu por ali, apartamentos de condição humilde e mofados, um colégio pique internato.
A história gira em torno de um quinteto, uma amizade, que acaba em ódio e morte. Foca na busca pelo autor desconhecido.
Uma história de gente fracassada, frustrada, miserável, desgraçada, que não conseguiu a sorte em nenhum aspecto da vida. Acompanhamos amores frustrados, não correspondidos. Gente carente de amor.
Contexto de guerra, miséria, sobrevivência.
Gente que a única motivação e motivo de permanecer viva é o ódio e vingança.
As pistas aparecem por partes. Pessoas com elo em comum, que sabem do passado. Um quebra cabeça embolado, e resolvido por cartas.
Mulher de cabelos encaracolados e corpo de violão, lábios tingidos de vermelho e cigarro na boca, a solidão e decepção são suas marcas registradas. Gente boa demais de coração, gente que não sabe nem o que isso significa.
Cômodos abandonados, imergidos no completo breu, redescobertos, que cheiram e atraem a morte. Ela espreita observadora, acompanha nas calçadas e nos becos, nos quarteirões, nos calçadões e nas praças.
A inocência parte, e dá lugar para os jovens apaixonados um pelo outro desde o primeiro olhar, que consumam seu amor pelo ato.
Agonia, torturas, morte, dores, e ver-se no precipício. Todos perdendo as esperanças na vida.
Gente que sobreviveu por um milagre, porque alguém estendeu a mão. Um ciclo vicioso que se repetiu.
Isso é A Sombra do Vento, completamente a grosso modo.
Esse livro é um sentimento.