rxvenants 25/01/2022"I want to stay and fight, while you go."Aviso de conteúdo: Agressão sexual, trauma, pensamentos suicidas e tiroteio em escolas. Se você é sensível a um ou mais temas, não leia o livro ou leia-o com cuidado.
"Know My Name" é a história de Chanel Miller e sua maneira, por meio da escrita, de retomar seu nome após o ato de agressão sexual que sofreu no campus da universidade de Stanford em Janeiro de 2015, enquanto estava em uma festa com suas amigas e irmã. Ela foi encontrada inconsciente com Brock Turner por cima dela atrás de duas lixeiras por dois estudantes suecos que gritaram para que Turner parasse e o derrubaram no chão quando ele tentou fugir.
O livro é extremamente difícil de ser lido e os temas contidos neles não são bonitos, mas é definitivamente um dos melhores livros de não ficção que já li.
Chanel não só narra com detalhes excruciantes como foi se tornar uma vitima e como tudo aconteceu, mas fala também sobre sua história, sua descendência chinesa, o nascimento do trauma, o caminho muitas vezes sem fim para a recuperação ou melhora de vida, as mudanças pelas quais vítimas passam, as crueldades do sistema judiciário (e como ele desumaniza e constante pede às vítimas que elas revivam seus traumas, bem como destrói os familiares), de ter seu caso sob a vista do público e privilégio, além de também trazer diferentes observações sobre a taxa alta de agressão sexual nas universidades americanas, como é difícil ver pessoas no poder serem predadores sexuais, uma sociedade que desacredita e cria diversas perguntas para minimizar sobreviventes e como a própria sociedade foi fundada para a normalização do abuso de - majoritariamente - mulheres.
È uma narrativa extremamente doída, mas é lindamente escrita.
Dá claramente pra perceber como a sua experiência na corte mudou sua forma de pensar.
Existem detalhes em absolutamente tudo que ela se propõe a contar, de roupas e cheiros a sentimentos, localização de objetos e palavras exatas.
É claro pro leitor como o exame minucioso pela qual ela passou nas mãos do advogado de Turner e em todo o processo legal fizeram dela alguém que é extremamente detalhista em tudo que vê.
Eu sinceramente não entendo como alguém consegue abandonar ou não gostar desse livro. Eu chorei ou fiquei com lágrimas nos olhos em TODOS os capítulos (principalmente quando ela ia contar para alguém sobre o caso), ainda mais lendo e ouvindo o audiobook, narrado por ela própria.
Eu consegui identificar a voz dela mudando em duas partes diferentes na narração do livro e tenho quase certeza que ela chorou nesses momentos. Foi bem, BEM difícil.
Eu tenho certeza que pode ser difícil de ler várias das coisas que ela conta, mas como a própria Chanel escreve no livro, é extremamente importante que as pessoas saibam que a recuperação não é bonita e não é fácil. Não é uma linha reta, mas um ciclo constante de altos e baixos.
Miller é incrível por pegar essa experiência que mudou a vida dela e passá-la por um microscópio para falar sobre o tratamento que as vítimas recebem, bem como tentar entender como o sofrimento dela poderia ajudar outros no mesmo caminho. Se você não entende pelo que essas pessoas passam, a Chanel te mostra. É bem fácil entender o motivo pelas quais diversas pessoas nunca vão atrás de justiça ou até mesmo falam sobre seus casos. O processo judiciário é moldado para encarar e exigir muito do tempo, da vida, da memória, da sanidade e da alma de vítimas esquecendo que elas não são somente evidências de um ato fora da lei, mas sim pessoas que foram marcadas pro resto da vida.
"This habit born in court has never died; now when I’m thinking hard or in a stressful situation, my hands involuntarily curl tightly and I begin pinching. At night, I ache in my hands and forearms, fantasize peeling them open, scooping out the hot, thick, pain buried there, until my arms and fingers are limp and empty."
Apesar de ser um livro de temas angustiantes - eu inclusive quase tive um ataque de ansiedade no capítulo que o juiz decide dar apenas seis meses de cadeia para Turner (que acabaram sendo só três por cada dia de boa conduta) -, Chanel também trás esperança na luta. A mudança não é rápida e Miller mesmo fala como às vezes leva uma vida inteira para pequenas mudanças, mas tenho certeza que vítimas se sentirão ouvidas e vistas nas palavras de Miller, muitas outras se sentirão mais fortes para seguirem e melhores aliados existirão para todos que passarem por situações parecidas.
Eu gostaria de colocar diversas partes do livro, pois a escrita da Chanel é realmente linda e tocante, mas vou só colocar duas delas. Se você tem a chance de ler o livro, leia. O livro saiu em português pela Intrínseca como "Eu Tenho Um Nome" e ele vale MUITO à pena. Ela descreve muito melhor que eu sobre os e as críticas que merecem ser ouvidas. Ela é extremamente forte e merece que todos saibam o nome DELA, Chanel Miller, ao invés de conhecerem-na por "garota inconsciente" ou "vítima de Brock Turner".
Em uma passagem sobre a Stanford fazer um jardim no lugar do ataque (e depois da universidade negar constantemente suas frases para colocação de uma placa no local), Chanel escreve:
“I encourage you to sit in that garden, but when you do, close your eyes, and I’ll tell you about the real garden, the sacred place. Ninety feet away from where you sit there is a spot, where Brock’s knees hit the dirt, where the Swedes tackled him to the ground, yelling, ‘What the [*****] are you doing? Do you think this is okay?’ Put their words on a plaque. Mark that spot, because in my mind I’ve erected a monument. The place to be remembered is not where I was assaulted, but where he fell, where I was saved, where two men declared stop, no more, not here, not now, not ever.”
Algumas linhas abaixo, ela continua:
“I often get scared of speaking out, of confronting lawyers and institutions bigger and better equipped than me, but when I’m afraid, all I have to do is think of the two of them. I think of how I want to return the favor; to pull the heaviness off you, to be the one yelling it is not okay, pinning your demons down in the dirt, so you suddenly find yourself free, given the chance to begin your journey, growing on your own, uncovering your voice, finding your way back. I want to stay and fight, while you go.”