Mariana Destacio 15/09/2019Liga, Desliga - Colleen McCulloughEntão, antes de começar, devo dizer que li esse livro em 2010, quando ainda não me considerava uma leitora, pois até então eu havia lido cerca de 5 livros, se muito. Mas ainda me lembro da sensação que a ultima página me deixou e que me fez favoritar o livro de imediato. Assim, decidi ler ele de novo, depois de 9 anos só pra saber: favoritei por que fiquei impressionada na época, ou era realmente um livro bom?
A trama se passa em 1965, começa com a descoberta de um um corpo parcial encontrado por acidente em um incinerador de uma faculdade de medicina, que logo descobrimos que é um complexo enorme, chamado popularmente de "Hug". Carmine Delmonico, o detetive encarregado logo começa a investigação, e todos sem exceção são suspeitos.
Entendo por que esse livro nunca foi um sucesso: ele requer atenção extrema nos detalhes, é cheio de personagens e nomes. Altamente recomendado o uso de papel e caneta pra anotar quem é quem. Se não, lá no meio do livro você começa a pensar: quem era esse mesmo? Como essa foi minha segunda leitura, eu já estava esperta e essa quantidade de personagens não me causou aquela confusão que a primeira leitura deixou. Porém, logo vai passando e você vai percebendo em quem tem que prestar atenção até o grande final ser revelado. Se não conseguiu prestar atenção em tudo, não tem problema, você ainda vai conseguir entender, mas pra mim, essas "histórias paralelas" é o que faz o livro ser tão bom. E eu entendo, que pra alguns, pode ser o que fez o livro ser ruim.
Pontos mais do que positivos: neste livro você não vai encontrar o detetive com problemas psicológicos, que entra na cena de um crime e consegue ver "a cena se desenrolando na sua mente, entrando na pele do assassino, como ninguém nunca conseguiu antes" e blá blá blá. Não vai ver um patologista que "apesar de ser extremamente experiente, a brutalidade do crime o chocou de tal forma que ele (e todo o resto) parece pálido, sudoreico e nauseado". Não vai ver o chefão ficando "pressionado pela imprensa" e começando a chamar especialistas. E o mais legal, não vai ver a "mocinha" do livro sendo uma beldade, doce e infinitamente linda pela qual o detetive se apaixona. Não me entenda mal, a mocinha existe sim, mas o romance, assim como a aparência dela não são nada como de costume. Uma surpresa mais que agradável, Desdemona é seu nome.
Carmine é um detetive competente, já trabalha há algum tempo nesse ramo, é um veterano de guerra. Tem uma casa aconchegante, tem um restaurante favorito, confia nos seus parceiros, e é baseado em um olhar aguçado e um bom instinto. Quando a investigação revela que o corpo encontrado é só mais um entre cerca de dez garotas desaparecidas, eles percebem que estão lidando com um "assassino múltiplo". Pois é, nada de serial killer, já que nessa época ainda não existia o termo, e pouco se sabia sobre esse tipo de assassino. Alguns psiquiatras são consultados, mas nada muito explícito. Afinal como sempre, o papel deles nesses livros geralmente é de impressionar o leitor, aquela cena clássica do psiquiatra falando que o assassino é solitário, odeia mulheres, homem branco por volta dos 30 etc. Sempre achei desnecessário a participação deles, e aqui neste livro não me fez nenhuma falta. Patsy (o patologista) já consegue explicar tudo que precisamos saber, sem ser cansativo ou ficar apresentando achismos sem fim, sendo sempre baseado em fatos.
Então, o livro vai mostrando a visão de Carmine, juntos com seus parceiros, investigando os "huggers", acompanhando e eliminando os suspeitos. Descobrindo o perfil das garotas da quais o assassino prefere, que não são totalmente negras, mas tampouco brancas. O que pra alguns a regra é clara: se não é branca, então é negra. A questão racial é bem explorada, assim como a questão de nacionalidade. Carmine é de descendência italiana, Desdemona é inglesa, há suspeitos japoneses e alemães, além de mostrar a dificuldade que as mulheres tinham de entrarem no meio da medicina, ainda mais em neurocirurgia, já que o Hug é um centro de pesquisa e doenças neurológicas e neurocirurgia.
Nota: achei muito interessando a autora mostrar como funcionava esse avanço de pesquisas em neuro naquela época. Até quando Carmine faz perguntas para um determinado "hugger" e eles lhes respondem com termos médicos que pra mim são familiares, mas para o detetive não, achei fantástico. O fato do microscópio Zeiss ser mencionado como um super equipamento para época me deixou ainda mais fascinada, pois te digo que ainda é usado nos dias de hoje. A autora fez um ótimo trabalho de pesquisa para escrever. Só deixando claro que trabalho como instrumentadora cirúrgica, e já fiquei um bom tempo acompanhando a neurocirurgia, portanto, o que é dito no livro não é invencionice, nem tampouco foi feito para impressionar o leitor. Simplesmente adorei. E posso ver que para alguém não acostumado, pode ser mais um ponto cansativo / negativo.
O livro não é marcado por cenas de ação, o diálogo é o caminho a ser tomado, e vemos que Carmine tenta fazer o que pode com o pouco que sabe. Para mim, mais um ponto positivo aí. Tudo me pareceu muito real. O nome do livro é um mistério, parece desconexo, e você só irá saber do que se trata no último capitulo. Ahh! Aquele último capitulo, o que me fez favoritar o livro, aquela luz no fim do túnel. Não me entenda mal, apesar de respostas importantes aparecerem somente nas ultimas páginas, não há aquela sensação de ser corrido nem mal feito. Pra mim, foi perfeito.
Liga, desliga é o primeiro livro da série Carmine Delmonico contendo cinco livros (que eu saiba), porém aqui no Brasil só foi publicado os dois primeiros volumes. Já que não é um livro popular, não acredito que os outros três livros serão algum dia publicados por aqui. Ainda que faça parte de uma série, ao que parece essa história está encerrada e cada livro tem uma história diferente.
Não sei se essa resenha irá te ajudar, ou te fazer desistir de vez de lê-lo. Só acho que pra quem gosta do gênero, é altamente indicado. Mas lembrando: seja paciente, leia sem pressa. Pegue seu papel e caneta e acompanhe o drama. Vamos dar um passeio. Acredite, vai valer a pena no final.