Johniere 06/07/2022
]...[o passado-presente-e-o-que-há-de-vir: herança e memória
[...] o passado-presente-e-o-que-há-de-vir: herança e memória em Ponciá Vicêncio
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"Vida era um tempo misturado do antes-depois-e-do-depois-ainda. A vida era uma mistura de todos e de tudo. Dos que foram, dos que estavam sendo e dos que viriam a ser". Este trecho representa bem a espinha dorsal do romance "Ponciá Vivêncio" da escritora Conceição Evaristo, que nessa obra conseguiu compor uma escrita de "entre mundos", pois transita em temas complexos que estruturam a sociedade brasileira, a saber: escravidão, loucura, preconceito racial, pobreza, ancestralidade, violência contra as mulheres fruto do machismo, dentre outros que estabeleceram uma grande nódoa difícil de ser removida das estranhas da nossa História.
Todos esses temas são revolvidos dos escombros da historiografia social do nosso pais. E isso é feito a partir do momento que conhecemos a vida de Ponciá Vicêncio, narrada em terceira pessoa. Por intermédio da voz desta narradora compreendemos que urgência da apresentação do modo como foi arquitetado os silenciamentos das comunidades preta pós-libertação. Sem bandeiras erguidas, Conceição Evaristo denuncia a "voz de mando advinda da terra dos brancos, a resistência teimosa e muita vezes silenciosa do negro, transvestida de uma falsa obediência ao branco. O tempo de indo e vindo. E neste ir e vir". "Ir" e "vir" traduz as andanças de Evaristo no campo das memórias, no réquiem de um passado que no agora projeta fragmentos de reconciliação com toda a herança adquirida da ancestralidade, que na verdade é uma confluência de temporalidades
Dito isto, ao analisar a obra " Ponciá Vicêncio" ficamos diante de movimentos múltiplos da linguagem, o que torna o enredo um maquinário de expressão potente, efetuados em desvelamentos micropolíticos ricos ao arcabouço da escrita de Conceição Evaristo. Para usarmos conceitos de Deleuze e Guattari, estamos diante de um romance de tom rizomático calcado em um devir. Devir que se constitui em modos construtivos de outridades existenciais minoritárias, sempre em processo. Nesse sentido, o devir nesse romance coloca em seu eixo a composição-decomposição de uma corporeidade como rota de fuga da presunção hegemônicas e imperativas.
Portanto, não há dúvidas que "Ponciá Vicêncio" não poderia ficar fora do nosso radar. Por isso, o DE OLHO NA ESTANTE indica esse livro, que pode marcar sua vida enquanto leitor.
( Johniere Alves Ribeiro)