Raquel 12/03/2022Uma guimba para queimar os neurôniosEncontrei a indicação de “A guimba” numa lista de distopias e me interessei pela sinopse: num país-continente, que nos lembra a Australia, o turista Tom Brodzinski, de férias com a família, queima um outro hóspede do hotel ao jogar nele, sem querer, a bituca (ou guimba, como o título do livro) do que seria seu último cigarro, o que leva a uma sequência de eventos inimagináveis para Tom. A história se desenrola com a família de Tom voltando para casa enquanto ele fica preso no país, já que o homem que ele feriu é casado com uma nativa, estando protegido por leis locais de proteção dos aborígenes. Tom precisará cruzar o país para cumprir a sentença recebida e reparar o erro cometido.
Eu li em 12 dias, mas não foi fácil. O autor usa muitos neologismos e palavras incomuns (tipo sinônimos pouco usados de palavras mais comuns), além de muitas palavras que nomeiam os habitantes e os costumes do país, o que dificulta a fluidez. Fiquei com dó do tradutor....
A princípio parece uma história cheia de situações absurdas, na qual o personagem principal vai se enrolando cada vez mais sem resistir, com um desfecho sem pé nem cabeça, mas se você olhar bem há metáforas e referências em toda parte. Esse não é um livro apenas para ser lido, você precisa refletir sobre a história e discutir com outras pessoas se possível.
Conclui que se trata de é uma crítica à colonização e ao desastre da interferência das potências ocidentais em outros países, ao modo como o homem moderno vê o que sobrou dessa colonização/interferência e como ele distorce a situação dos povos nativos, inventando sistemas de crenças a partir de fragmentos de culturas anteriores. O autor deixa claro que o homem branco, apesar de minoria, tenta criar uma sociedade multicultural, honrando o maior número possível de detalhes da vida nativa, mas que isso é um completo desastre (vide a história da família Von Sasser na trama) e que pode geral mais violência (vide as apólices de seguro das Tontinas). É uma metáfora sobre a humilhações impostas às populações nativas pelos ocidentais ao longo dos anos.
E o autor demonstra o absurdo da situação vivida por colonizadores e colonizados usando tiradas cômicas, como na proibição ao fumo, e passagens grotescas, como nos rituais e costumes locais.
A final do livro, fiquei sem respostas para muitas questões menores, como:
- Por que a prima do advogado de Tom parecia ser irmã gêmea de sua esposa??
- Como o cônsul honorário no país sabia que a bebida favorita de Tom era whisky com gelo???
Acho que essa era a intenção do autor, mas isso me instiga a futuramente reler o livro, para tentar extrair mais detalhes que eu tenha deixado passar nessa primeira leitura. Foi o primeiro livro de Will Self que li e fiquei interessada em ler outros.