jiangslore 29/04/2022
[3/5]
Eu estaria mentindo se dissesse que não me diverti com a leitura de "Prazeres Violentos", entretanto, quanto mais penso sobre o livro, mais percebo que ele não me agradou tanto quanto acreditei que tinha no momento em que terminei a leitura. Penso que o maior problema da obra está nos personagens, entretanto, também há alguns aspectos negativos no enredo. Por outro lado, os pontos mais fortes do livro são a ambientação e a escrita.
O desenvolvimento da ambientação do livro foi feito incrivelmente bem. Não conheço o suficiente sobre Xangai para dizer em que ponto se pode traçar o limite entre a realidade e ficção sobre a história da cidade, então não sei o quão fiel é a descrição da autora (claro, não estou considerando os aspectos fantásticos do livro para aferir essa fidelidade). Mas isso não muda o fato de que fiquei muito entretida pela forma que a cidade foi descrita no livro – é quase como se ela fosse, também, um personagem. A Xangai de "Prazeres Violentos" é muito vívida, e é possível perceber, por meio do detalhamento das descrições feitas, que a autora teve uma grande preocupação em demonstrar o contexto da cidade e em falar sobre os grupos que lá habitavam.
Descobri, após finalizar a leitura, que um ponto muito criticado sobre "Prazeres Violentos" é a escrita, que é considerada adjetivada demais e visualmente bonita, mas sem substância ou significado. O que achei interessante nessa crítica é o fato de que, em parte, eu concordo com ela, mas ver a escrita dessa forma me fez gostar muito dela. Realmente, a autora embeleza bastante a escrita e usa muitos adjetivos, e isso pode até ser interpretado como algo "sem significado", porque a escrita em alguns momentos não é tão impactante quanto se propõe a ser. Mas eu gostei disso porque combina com a história e a proposta do livro: Xangai é descrita em alguns momentos, também, como uma beleza sem significado, uma cidade perdida que não sabe encontrar sua identidade entre as tradições e as influências do ocidente.
Com relação ao enredo, acredito que o problema é que há alguns acontecimentos que não foram tão elucidados e parecem ter possuído o único propósito de ser um plot twist sem uma construção prévia. Dá para perceber que a autora procurou confiar no choque que algumas coisas causariam no leitor e, infelizmente, nenhuma delas me surpreendeu de forma significativa. Além disso, tem um aspecto específico e relativamente importante da narrativa que foi incluído por ser parte da obra original – para quem não sabe, "Prazeres Violentos" é uma releitura de "Romeu e Julieta" – e que não foi bem incluído na obra. Penso que este aspecto específico acabou chamando minha atenção mais do que deveria porque, em geral, a autora soube adaptar os aspectos do material de origem muito bem, então fiquei surpresa quando isso não foi feito.
E, sobre o romance: "Prazeres Violentos" sem dúvidas preenche todos os requisitos de um "enemies to lovers", portanto, acredito que qualquer pessoa que goste deste tipo de casal vai adorar o livro. Para mim, "enemies to lovers" é uma roleta-russa, porque, apesar de em geral não ser muito fã desse tipo de romance, há alguns casos em que gosto bastante de casais construídos assim. No final das contas, acho que Roma e Juliette ficaram no meio termo. Não me apaixonei pelo casal, mas gostei das interações deles. O fato de a autora ter desenvolvido a relação deles abordando algumas nuances que vão além de um ódio puramente fundado em uma rivalidade familiar abstrata foi interessante.
(Na verdade, para mim, o casal secundário é que tem o melhor romance do livro – afinal, eu tenho uma tendência a preferir "friends to lovers" – e, quanto mais penso sobre isso, mais tenho a certeza de que a única coisa que me impulsiona a ler a continuação é saber o que vai acontecer com este casal.)
Os maiores problemas do livro tem relação com os personagens. Digo desde já que os personagens, em si, são interessantes, no sentido de que possuem personalidades agradáveis, detalhadas e diversificadas. O problema é que a grande maioria dos eventos que determinaram essas personalidades ocorreram antes do início do livro – os personagens quase sempre não são desenvolvidos durante a narrativa, pois o desenvolvimento foi prévio. É como se "Prazeres Violentos" fosse a história de personagens desenvolvidos anteriormente lidando com problemas novos.
Em razão disso, o aprofundamento do personagem quase sempre ocorre com uma descrição de seus pensamentos. É algo como: "aconteceu X com a pessoa, então ela concluiu Y". E, bem, a conclusão mencionada é algo que faz sentido (na maioria dos casos), o que faz com que o relato seja realista e sensível, mas acho que teria sido muito melhor se essas conclusões fossem pensadas durante os acontecimentos do livro, e não antes deles. É meio chato ler sobre pessoas que praticamente não mudam.
Há, ainda, outro problema: em alguns casos, este desenvolvimento prévio não é muito coerente. Isso acontece, principalmente, com Juliette. Parece que ela é mais um caso do famoso "vou-criar-uma-Protagonista-Feminina-Forte-sem-demonstrar-de-forma-crível-como-ela-adquiriu-essa-força" que é tão comum na fantasia YA. E, nesse caso, não estou falando de uma força mental (acredito que essa parte de Juliette foi explicada adequadamente), mas, sim, do tipo de força que Personagens Femininas Fortes costumam ter. É bem complicado falar sem dizer spoilers, mas, em suma, Juliette é colocada como alguém que entende plenamente uma realidade específica, mas, na grande maioria dos momentos de sua vida prévia, ela não estava inserida nesta realidade.
Por fim, acredito que a leitura é muito recomendável para quem gosta de enemies to lovers e YA, principalmente porque dá para sentir pela forma que o livro é narrado que a autora possui um nível de comprometimento e esforço que não é tão comum no gênero. Por outro lado, não posso dizer que a obra é marcante o suficiente para ser recomendada para quem não gosta dos gêneros mencionados.