Imaginários

Imaginários Douglas MCT...




Resenhas - Imaginários - volume 3


8 encontrados | exibindo 1 a 8


Tibor Moricz 13/06/2011

Lido e comentado.
Foi com enorme prazer que recebi da Draco Editora o terceiro volume da coleção Imaginários. Com a recomendação do Erick “Draco” Santos para ler e comentá-lo com a mais absoluta sinceridade. Claro que fiquei meio ressabiado. Temeroso de que uma avaliação negativa pudesse queimar meu filme na Editora.

O Erick, porém, reafirmou o desejo de uma leitura e de uma avaliação sinceras, como é de praxe ocorrer no É só outro blogue.

Eduardo Spohr, Marcelo Ferlin Assami, Rober Pinheiro, Douglas MCT, Lidia Zuin, Marcelo Galvão, Cirilo S. Lemos, Fernando Santos de Oliveira, Ana Cristina Rodrigues e Fábio Fernandes desfilam seus trabalhos em quase 130 páginas.

Vamos aos contos e aos meus comentários:

1- A torre das almas – Eduardo Spohr

Não conheço o livro de sua autoria A batalha do apocalipse, mas me parece que esse conto percorre o mesmo universo. Guerra de anjos contra anjos, com a ajuda de humanos. O conto tem um bom ritmo e cenas consistentes.

2- Breve relato da ascensão do Papa Alexandre IX – Marcelo Ferlin Assami

Esse conto me criou algumas dificuldades. Numa primeira leitura me senti meio perdido, sem referências. Comentei isso com o Erick e ele me disse que o conto merecia uma segunda leitura. Li novamente. Eu o considero bem escrito, com descrições e algumas imagens que surpreendem, mas senti falta de uma pedra angular que a tornasse mais sólida. Não tenho nada contra narrativas não lineares, desde que eu encontre nelas um fio condutor que me possibilite uma leitura sem dúvidas excessivas. Minha leitura se deu com desconforto. Faltou um contato mais efetivo entre eu e a trama.

3- As noivas brancas – Rober Pinheiro

Quem tentar comparar o conto dele publicado na coletânea UFO (De amizades e restos de Sol) com esse, vai enxergar um abismo separando-os.

Uma história de resgate numa aventura Space Opera, cheia de ação, descrições elaboradas, cenário e ritmo bons. Muito bem escrito.

4- Bonifrate – Douglas MCT

Demorei um pouco a me adaptar à prosa um tanto quanto sui generis do Douglas (estilo próprio ou ainda procurando um?), mas acabei mergulhando de cabeça numa bela narrativa. FC ou fábula, com direito a Gepetto e Pinochio (figuradamente), a idealizações pré-programadas, lutas e busca por respostas.

5- Dies Irae – Lidia Zuin

Uma história Cyberpunk com bom ritmo e muito bem escrito. Só achei que o cenário e a ambientação são recorrentes, tirando dela qualquer pretensão de originalidade.

6- Vida e morte do último astro pornô da Terra – Marcelo Augusto Galvão

Já havia lido esse conto na comunidade de Ficção Científica do Orkut, em prêmio literário realizado. O Marcelo me disse, no Fantasticon, que acrescentou algumas coisas. Minha opinião não mudou. Continuo achando o conto ótimo.

7- Corre, João, corre – Cirilo S. Lemos

Fui surpreendido por esse conto. Achei-o comovente. Uma belíssima narrativa onde um pai procura defender com unhas e dentes… A alma do filho. Trata-se de uma verdadeira aula de como imprimir emoção num texto. Arrebatador.

8- Uma segunda opinião – Fernando Santos de Oliveira

Estudante traída resolve, com ajuda de uma misteriosa figura, se vingar daqueles que a traíram. Trata-se de uma mistura de Sessão da Tarde, Betty a Feia e horror trash. Trama sem nenhuma novidade; aborrecida. Muito fraco.

9- Maria e a fada – Ana Cristina Rodrigues

Trata-se de um conto belo, com ótima ambientação. Por outro lado, tem o ritmo prejudicado por certa apatia que afasta da história o sentimento. Sem emoção, ele corre num ritmo fluído, mas frio.

10- O primmeiro contacto – Dr. Eleutherio Penna Filho (Fábio Fernandes)

Hipotético conto resgatado do passado (1929) e escrito por autor não satisfatoriamente identificado. Escrito com a grafia original da época, o que a torna especialmente interessante. Guerra dos mundos em realidade alternativa rica em citações, batalhas espaciais e uma tremenda vontade de querer ler mais. Que essa história tenha um prosseguimento. Muito envolvente.



Nada como um sopro de ar fresco depois de longa imersão nas águas profundas e poluídas de algumas coletâneas de valor discutível. Pela somatória de avaliações eu dou ao Imaginários 3 um , chegando bem perto de um . Parabéns a todos os autores e ao Editor Erick Santos pela excelente organização. A continuar assim, teremos uma coleção primorosa ainda pela frente.
comentários(0)comente



Anna 23/05/2012

Resenha no www.pausaparaumcafe.com.br
De modo geral, eu estava urgentemente precisando ler um livro de fantasia tão bom.

1 – A Torre das Almas: Nesse conto Eduardo Spohr volta com o que ele sabe fazer de melhor, um pequeno conto sobre uma aventura angelical, onde encontramos personagens de A Batalha do Apocalipse em uma missão passado por Gabriel. Em uma troca de tweets com o autor no Twitter ele me disse que: “ ’A Torre das Almas’ é o prequel de ‘Filhos do Éden’ “.
Tenho uma queda por histórias fantásticas com anjos e demônios e aqui o autor leva muito bem, em um conto rápido e objetivo, só acho que para aqueles que não tiveram nenhum contato com A Batalha do Apocalipse ou a mitologia criada por Spohr talvez ache o conto sem graça, por achar que o final deixe a impressão de estar ‘faltando algo’.
2- Breve relato da ascensão do Papa Alexandre IX: Gosta de histórias que dão saltos no tempo? Encontrou aqui uma que você irá amar. Esse conto com um nome um tanto quanto grande é uma breve história fantástica que me lembrou muito alguns contos de Stephen King. Quem ja leu um conto do King em que uma maquina de lavar roupa estava amaldiçoada e corria atrás do personagem da história e gostou vai se encontrar aqui. Temos vários relados de objetos, famílias, mortes completamente inexplicáveis e voltas no passado e presente para explicar o porque.
Talvez seja preciso ler algumas 2 ou 3 vezes para conseguir pegar todo o conto sem deixar passar nada. Ele é muito bem escrito, surpreende os leitores que possam não estar adaptados com o gênero. Mas é nota 10.
3- As Noivas Brancas: Já comentei com vocês que adoro anti-heróis e histórias que fogem do clássico e dão um tapa na cara do leitor com palavrões e uma linguagem menos coloquial? Aqui eu encontrei tudo isso. Em “As Noivas Brancas” Viajamos para o espaço em uma história Cyberpunk com misticismo e aventura. Um dos melhores contos de toda a coletânea.
4- Bonifrate: Perfeito. O melhor conto de toda a coletânea. Ficção científica pura com uma carga dramática surpreendente. Emocionante, instigante. Uma máquina do tempo, um herói criado bom um cientista, zepelins, robôs e recortes de jornais foi tudo o que precisou para construir um enredo que me prendeu do início ao fim.
5- Dies Trae: Hacker, computadores, submundo, esgotos, melhor amigo travesti, drogas, corrupção. Poucas alternativas na vida dessa personagem. Sofrimento e nenhuma saída. Chega a ser comovente. Com tantos palavrões e sujeiras Dies Trae traz de uma forma brusca um pouco de verdade.
6-Vida e morte do último astro pornô da Terra: Um título um tanto quanto chamativo, e como o próprio nome ja diz, o conto conta a história do ultimo ator pornô da Terra que acaba depois de sua vida ser praticamente jogada fora por drogas e mulheres é tido como herói e nunca mais é visto na Terra virando uma lenda. Um dos pontos que mais gostei nessa história foi o fato do autor misturar tão bem os “robôs” na história e ter caprichado tão bem em sua descrição.
7-Corre, João, corre: O conto que mais me surpreendeu, Com seu começo um tanto estranho e um protagonista nem um pouco cativante “Corre, João, Corre” no final se tornou um conto lindo, que nos mostra o que somos capazes de fazer no desespero quando sentimos a dor de quem amamos. Com uma pitada sobrenatural que faz todo o sentido e completa a história.
8- Uma Segunda Opinião: Uma história trágica que toda garota deveria ler. Um conto que nos transmite medo. Nós faz pensar onde estamos escondendo a pior parte de nós. Confesso que a primeira coisa que você vai fazer se tiver a mesma reação que é a minha é se olhar no espelho. Uma história de terror sem pitadas sobrenaturais como chegamos a pensar no começo do livro. Ele se classifica como um terror psicológico surpreendente.
9- Maria e a fada: Lindo. Lindo. Lindo. Eu sempre me encantei por histórias de fadas, aquelas que se contam para crianças dormirem. E essa é uma das mais cativantes que já cheguei a ler. E alem de fadas o conto ainda apresenta um mundo fantástico, com cavaleiros, reis e dragões. Como não gostar?
10- O Primmeiro Contacto: Confesso que de todos os contos na história esse foi o que menos gostei. Talvez seja uma questão de gosto pessoal, em um primeiro momento nem tive vontade de ler. Mais aos poucos até que ele consegue prender um pouco nossa atenção. A Editora deixou o conto permanecer com sua grafia original, um português antigo, e que faz o leitor estranhar muito a leitura, mas consegue trazer uma outra visão ao leitor sobre ficção científica.
Bem… essa foi a resenha de domingo. Espero que vocês tenham gostado! Um grande abraços a todos. E espero que vocês tenham ficado com uma super vontade de ler. Eu quero logo os próximos volumes.
comentários(0)comente



Josué de Olivei 09/12/2010

Imaginários 3 - Não tão fantástica, mas eficiente.
(originalmente postada no blog www.gotashumanas.blogspot.com)

Lançado esse ano, o terceiro volume da coleção Imaginários reúne dez contos que transitam entre os muitos e variados gêneros da ficção fantástica. Escolhi começar pelo mais recente dos três volumes devido a alguns dos nomes presentes na lista de autores, com os quais já me deparei de forma positiva ao longo de 2010, e outros que, pela boa reputação dentro desse fandom literário, me despertaram certo interesse. De um modo geral, a "Imaginários 3" me agradou muito, a maioria de seus contos conseguindo cumprir a missão de proporcionar entretenimento de boa qualidade, fugindo ou não do óbvio.

É a primeira vez que resenho um livro de contos, de modo que não sei se minha avaliação crítica de narrativas menores conseguirá soar convincente. De todo modo, seguem comentários de cada conto separadamente.

1) A Torre das Almas - Eduardo Spohr
Spin-off do sucesso de vendas "A Batalha do Apocalipse", já resenhado aqui, o conto que abre os trabalhos da "Imaginários 3" conta as desventuras de um grupo de anjos que veem à Terra investigar determinado episódio sobrenatural. Novamente apostando em personagens unidimensionais, que agem somente segundo suas naturezas, Spohr entrega um texto de trama e prosa envolvente que expande o já vasto universo de seu livro. Pode pecar por alguns diálogos artificiais, mas mantém a boa pegada nas cenas de luta. Uma boa leitura, embora não se possa negar que seja apenas mais do mesmo.

2) Breve Relato da Ascenção do Papa Alexandre IX - Marcelo Ferlin Assami
Difícil falar desse texto, uma intrincada viagem de ácido que chuta a linearidade e mistura velhas senhoras monstro com espigas de milho mutantes e conspirações Papais. Assami constrói um conto difícil assimilação, sendo necessário no mínimo um segundo olhar para conseguir entender a trama. E eu não consegui, diga-se de passagem. De todo modo, vale destacar a escrita fluida do autor e a criatividade na criação do "Breve Relato", além, claro, da fuga de uma estrutura mais usual. Assami ousa bastante em seu conto, tornando-o algo labiríntico e, por conseguinte, menos acessível. Quem sabe numa próxima leitura eu consiga entendê-lo melhor.

3) As Noivas Brancas - Rober Pinheiro
Um conto divertido e bem escrito, que narra a incursão de um grupo de mercenários galácticos, liderados por um capitão viciado (também o narrador) a uma instalação onde se encontram as noivas brancas, uma carga que eles devem entregar a um empregador. Dinâmico na maior parte do tempo - em alguns momentos a narração no presente do indicativo torna-se cansativa, a meu ver - e recheado de boas cenas de ação, o texto é de leitura fácil e acessível e merece destaque pela boa construção do clímax.

4) Bonifrate - Douglas MCT
A reimaginação da história de Pinóquio do autor do recém lançado "Necrópolis - A Fronteira das Almas" é um dos contos que mais me agradaram. Bem escrito e envolvente, "Bonifrate" é uma fábula sobre a busca por si mesmo, funcionando admiravelmente bem no desenvolvimento de seu personagem principal. MCT também ganha muitos pontos pela ambientação sombria de sua história. A reviravolta final, apesar de absurda, rima de forma adequada com o desenvolvimento "weird" do conto. O romance de estréia do cara já está na minha lista.

5) Dies Irae - Lidia Zuin
Cyberpunk até o talo, incrivelmente bem narrado, com descrições cruas combinando perfeitamente com a decadência da protagonista, uma hacker que divulgou na rede diversos videos snuff de uma sádica gangue, de quem agora precisa fugir. Uma pena que termine de maneira tão abrupta, dando a impressão de inacabamento.

6) Vida e Morte do Último Astro Pornô da Terra - Marcelo Galvão
Meu favorito. Num passado reimaginado, onde andróides tomaram de assalto a indústria de entretenimento adulto, um exímio ator procura voltar aos seus tempos de glória. Com uma pegada hardboiled que me agradou demais, Galvão dá vida a um conto surreal e divertido, com uma narração seca que se aproxima do noir e boas cenas de briga. Está aí um cara cujo trabalho vou querer acompanhar daqui para frente.

7) Corre, João, Corre - Cirilo S. Lemos
Quando uma procissão de fantasmas vem atrás da alma de seu filho, João tem que se mexer para impedir que o pequeno se vá. O conto é inteiramente centrado em seu protagonista, e nesse sentido é louvável que Cirilo não tenha criado um João certinho e unidimensional. Trata-se de um personagem humano e com diversos defeitos, e seu crescimento no decorrer do conto é sem dúvida o ponto forte do texto. A narração é leve, agradável, fluida. Um dos melhores.

8) Uma Segunda Opinião - Fernando Santos de Oliveira
Garota decide se vingar de três colegas de escola após passar por uma situação humilhante, e passa a seguir os conselhos de uma desconhecida. A temática infanto-juvenil não é desculpa para a artificialidade de todos os diálogos, nem para algumas falhas de lógica que saltam aos olhos (uma garota tem que ser muito ingênua para não desconfiar de uma figura que se esconde o tempo todo nas sombras). As personagens são desinteressantes em sua totalidade. Em minha opinião, o texto mais fraco da coletânea.

9) Maria e a Fada - Ana Cristina Rodrigues
Ao lado de "A Torre das Almas", é o conto que mais se aproxima da fantasia propriamente dita. Ana Cristina narra a tentativa de um velho servo de manter viva a memória das origens místicas de uma importante família da Idade Média européia. Naufragando em suas tentativas de apelar para o emocional, o conto definitivamente não conseguiu me convencer. Perde pontos ainda por apresentar personangens distantes e pouco envolventes, o que o torna esquecível, apesar de bem escrito.

10) O Primmeiro Contacto - Fábio Fernandes
Autor de "Os Dias da Peste", já resenhado aqui , Fábio Fernandes entrega o conto mais inusitado da coletânea, ao lado do de Assami: como seria se um brasileiro tivesse escrito uma space opera em 1929, com o estilo próprio da época? O conto tem em sua maior qualidade o que pode ser também seu ponto fraco, pois, se por um lado o estilo datado e espalhafatoso de narrar soa incrivelmente divertido, por outro a reprodução da ortografia da época e o desfile de personalidades em voga nas primeiras décadas do século XX pelas páginas o tornarão um pequeno desafio que, me parece, poucos gostarão de enfrentar. De todo modo, o autor merece créditos por construir uma história envolvente de maneira tão pouco óbvia.

É isso.

Boas leituras.


comentários(0)comente



Antonio Luiz 01/09/2010

Um leque bem aberto
A coleção "Imaginários", de antologias de contos de fantasia e ficção científica da Editora Draco ganhou um terceiro volume, desta vez com maior participação de autores pouco conhecidos e mesmo de primeira viagem. Nem por isso o resultado final foi ruim. A qualidade média é comparável à dos dois primeiros, nos quais a maioria dos contistas eram mais experientes e conhecidos. Dos dez contistas, só quatro haviam publicado profissionalmente: Eduardo Spohr, Ana Cristina Rodrigues, Fábio Fernandes e Douglas MCT (alguns outros publicaram em coletâneas pagas pelos autores). É um bom exemplo da diversificação de temas e estilos na literatura especulativa brasileira, que se abre num leque cada vez mais amplo de temas, estilos e públicos.

A coletânea se abre com "A Torre das Almas", do jornalista Eduardo Spohr. É um exemplo de uma moda que cresce na literatura de fantasia juvenil e ameaça destronar a dos vampiros: histórias sobre anjos pouco angelicais. O primeiro romance de Spohr, "A Batalha do Apocalipse", foi um dos sucessos mais comentados da Bienal do Livro de 2010, em São Paulo. Nestes dias pode ser visto em destaque em muitas grandes livrarias e em sétimo lugar na lista dos mais vendidos da revista Veja, à frente dos últimos Dan Brown e Stephenie Meyer. Entre autores brasileiros de fantasia juvenil, só André Vianco, o rei dos vampiros, teve sucesso comparável nos últimos anos. Nos dois casos, a simpatia pessoal do autor e seu esforço para promover a obra ajudaram nas vendas, mas com certeza há mais. Nenhum deles é particularmente criativo ou hábil com linguagem, mas sabem tocar alguma corda sensível do seu público.

Este conto, apresentado como “o primeiro spin-off (derivado) oficial de A Batalha do Apocalipse”, tem a típica estrutura de uma aventura de videogame ou de RPG tradicional, identificável desde as primeiras páginas: um pequeno grupo de heróis com diferentes habilidades topa com um mistério, encontra as pistas certas para o inimigo, enfrenta primeiro capangas menores e depois o terrível “chefe”, no seu reduto ao fim do labirinto.

Se fosse inspirado no jogo Dungeons & Dragons, teríamos tipicamente um guerreiro, um mago, um elfo e um anão; se a matriz fosse "Vampiro: a Máscara", teríamos vampiros de diferentes clãs. No caso deste conto, o modelo parece ser o RPG In Nomine (mais conhecido no Brasil pela versão publicada na linha GURPS, adaptada de um original francês). Neste, os personagens dos jogadores são anjos (caracterizados segundo uma interpretação peculiar das tradicionais hierarquias judaico-cristãs) que encarnam em corpos materiais sem deixar de reter capacidades especiais. Os corpos materiais não são invulneráveis, mas como bons personagens de RPG, estes têm direito a múltiplas vidas e podem retornar dentro de certas regras.

O conto obedece às mesmas regras. O grupo contém um hashmalim, “anjo da punição”, um ishim, guerreiro da “linha de frente do exército de Gabriel”, um querubim com “sentidos de predador” e uma serafim com poderes místicos para manipular a fronteira entre o mundo físico e o espiritual, conforme as explicações ao longo do texto. Esses nomes são plurais hebraicos: o hashmalim corresponde ao “domínio” da nomenclatura católica tradicional e o ishim ao “anjo” propriamente dito, o soldado raso da hierarquia angélica. Apesar da previsibilidade do esquema geral, as soluções particulares são suficientemente engenhosas para manter o interesse.

O atrativo para seu público está provavelmente na convergência (dentro da estrutura familiar dos games de aventura) do imaginário moderno da ação hollywoodiana com o de uma cultura religiosa tradicional ainda bem presente: encontram-se aqui céus, infernos e almas penadas, numa concepção pouco ortodoxa, mas não inteiramente estranha ao imaginário difuso do catolicismo popular brasileiro.

Por fantásticos que pareçam à primeira vista, o ambiente e a ação são familiares e a assimilação é fácil. Mesmo se, a julgar pela amostra, este autor se permite frases mais intrincadas e palavras menos comuns que, digamos, André Vianco, e personagens mais distantes dos gostos, sentimentos, inseguranças e hábitos de leitores adolescentes. Os anjos de Spohr parecem alheios à cultura pop e são objetivos e eficientes como um pelotão de fuzileiros de cinema. Funciona, enquanto a escrita for razoavelmente ágil, a narrativa consistente e os detalhes inesperados.

Segue-se a esse conto linear e de leitura fácil outro que é o seu exato contrário. O "Breve relato da ascensão do papa Alexandre IX", do também jornalista Marcelo Assami, é o mais complexo e intrigante da coletânea. Isto não tem nada de semelhante a jogar um game: é muito mais como decifrar um problema de palavras cruzadas dos mais difíceis, que exige conhecimentos sobre literatura do século XX (a começar por escritoras brasileiras), papas do século XV e XVI e libertinos do século XVIII, pelo menos, numa sequência nada linear de ações e eventos, cheia de saltos inesperados de tempo e ponto de vista e intrincados jogos de palavras. É preciso ler pelo menos duas vezes a história para captar a maior parte de suas ironias. Um prazer de outro tipo, bem construído e adequado como entretenimento – mas para um público bem reduzido.

"As Noivas Brancas", do publicitário Rober Pinheiro, é um típico conto de ficção científica à moda das revistas pulp estadunidenses dos anos 1940, com direito a tiroteios com armas de raios, muita violência e mulheres (ou coisa parecida) bonitas e indefesas. Não inova no tema, nem no enredo – um anti-herói interestelar, líder de uma equipe de alienígenas estrambóticos, disputa um carregamento com uma quadrilha rival – mas vale pelos pormenores criativos e pela linguagem, atitude e ponto de vista do protagonista, verossímeis a ponto de tornar convincentes as cenas mais estranhas e improváveis.

"Bonifrate", de Douglas MCT, roteirista de quadrinhos, desenhos e cinema, é uma interessante releitura de um conhecido clássico infanto-juvenil italiano dentro da linguagem e sensibilidade do New Weird – um novo subgênero da fantasia, tipificado pelo romance Perdido Street Station do britânico China Miéville, que incorpora elementos de realismo social urbano, ficção científica e muitas vezes (como neste caso) tecnologia e estética do século XIX ou steampunk. Também se ouvem ecos das batalhas metafísicas da trilogia Fronteiras do Universo, de Philip Pullman. O conto é sensível sem ser piegas e tira inspiração de um livro para crianças sem ser pueril. Deixa a desejar em detalhes, como a reviravolta forçada do epílogo, que exige demais da suspensão de descrença do leitor. Também ficaram sobrando certas alusões a notícias de época e personagens de ficção, que pendem como pontas soltas que não ajudam a avançar a trama ou caracterizar o cenário.

"Dies Irae", da estudante de comunicação Lídia Zuin, é um episódio de ficção científica cyberpunk, em um futuro tão próximo e plausível que se torna praticamente realismo urbano: uma hacker divulga snuffs – filmes que retratam violência sádica e assassinatos reais – produzidos por uma gangue que passa a caçá-la impiedosamente. O estilo é seco, forte e eficiente e a linguagem é inteiramente adequada: um achado, e vindo de uma autora muito jovem em sua primeira publicação. A maior restrição a fazer é a falta de um fechamento mais satisfatório. Mais fragmento de romance do que conto, o texto não foca especificamente uma ideia ou incidente, mas aponta para uma trama e uma personagem demasiado complexas e interessantes para serem satisfatoriamente desenvolvidas dentro de seus limites.

De Marcelo Augusto Galvão, "Vida e morte do último astro pornô da Terra" é uma peça eficaz de humor negro e retrofuturismo – quer dizer, um cenário baseado em um futuro do pretérito. Uma possibilidade histórica ou tecnológica que não se realizou, mesmo se foi imaginada em algum momento do passado. Neste caso, que 1) andróides biológicos, ou “biôs”, de aparência e comportamento passavelmente humanos tivessem sido inventados nos anos 70, como chegaram a imaginar muitos autores de ficção científica (a começar pelo próprio inventor da palavra “robô”, Karel Capek, numa peça escrita em 1921 e ambientada nos anos 50 ou 60) e 2) usados como autores de filmes pornô, desempregando os atores humanos.

A história é escrita do ponto de vista de um pornófilo nostálgico, que se lembra com carinho do tempo em que a pornografia produzia “roteiros e atuações convincentes” (como os de Garganta Profunda e O Diabo na Carne de Miss Jones…) e narra a revolta – em parte luddita, em parte humanamente justa – do último ator masculino humano do gênero ao ser pressionado a ontracenar com um pornobiô em uma cena que contrariava seus princípios. Uma ótima piada e, ao mesmo tempo, uma sátira inteligente da lógica das questões sociais ligadas ao desemprego tecnológico e, ao mesmo tempo, indústria do entretenimento, da pornografia e da crítica.

"Corre, João, corre", de Cirilo Lemos, é, sem favor nenhum, o texto mais humano e comovente da coletânea, sem deixar de ser fantástico – e o mais poético, sem deixar de ser realista. É o amor ou a culpa que leva o pai tolo, fraco e inerme à loucura pela culpa ao ver o filho bebê nas garras da Morte? Ou talvez ele realmente veja espíritos? Ambas as interpretações são possíveis, mas em qualquer delas, é uma história muito bem construída, que comunica emoções intensas sem cair na pieguice ou na banalidade. Concentra mais emoção e conteúdo nesse conto, e o faz com mais gosto e elegância, do que escritores experientes e bem vendidos – como, digamos, André Vianco em O Caminho do Poço das Lágrimas – precisaram de um romance para tentar transmitir.

Por outro lado, "Uma segunda opinião", de Fernando Santos de Oliveira, é seguramente o conto mais fraco da coletânea. Uma menina é conduzida pelo ciúme e pela inveja a ações cada vez mais malvadas, aconselhadas por uma garota misteriosa que encontra ao procurar um livro numa biblioteca (um lugar perigosamente sedutor, cheio de maus conselheiros, deve-se supor) e faz as vezes de porta-voz de Satanás (e dos clichês da literatura de autoajuda, que podem ser ainda piores). Parece uma dessas histórias de terror moralista que o cinema dos EUA produz em série para tentar educar plateias adolescentes nos princípios puritanos, mas contada de maneira tão entediante que sufoca até o humor involuntário que às vezes essas produções conseguem proporcionar.

"Maria e a Fada", da historiadora Ana Cristina Rodrigues, é um belo conto, de sentimentos sutis e discretos. Uma família aristocrática – que realmente existiu e foi muito importante na Idade Média e início da Moderna – ensina às novas gerações as tradições sobre suas origens lendárias, ou (no conto) não tão lendárias. O que atrapalha um pouco a narrativa é a tentativa de alternar a objetividade fria da historiadora que explica o contexto político e histórico com o ponto de vista mágico e envolvente dos remanescentes da casa de Borgonha, que enfrentam pacientemente a decadência e os infortúnios enquanto tentam dar felicidade e transmitir o orgulho pela linhagem às suas meninas.

Dada a delicadeza e fragilidade dos sentimentos em jogo, talvez funcionasse melhor como ficção história se o lado histórico fosse dispensado – deixando ao leitor curioso o trabalho de pesquisar o lado real da narrativa – ou, caso não se queira abrir mão de transmitir a informação de caráter didático, que ela fosse concentrada numa introdução inicial ou num epílogo final. Autores e leitores contemporâneos (ao contrário dos clássicos do século XIX e início do XX) tendem a torcer o nariz ante a concentração de informação, pejorativamente apelidada de infodumping, por ser tediosa para leitores ávidos por ação e movimento, mas neste caso talvez fosse a melhor solução.

O "Primmeiro Contacto", do professor de comunicação Fábio Fernandes, é um outro tipo de retrofuturismo: neste caso, tentou-se emular como um brasileiro poderia ter escrito uma space opera em 1929, usando o estilo, a ciência popular e a "orthographia" da época – façanha que deu um bocado de trabalho aos revisores, diga-se de passagem. Várias personalidades reais da época, inclusive Henry Ford, Alberto Santos-Dumont, Howard Hughes, Amelia Earhart, Anésia Pinheiro Machado, Edmond Hamilton e Fernando Pessoa, envolvem-se numa missão a outro sistema solar e numa batalha épica com invasores alienígenas. A linguagem e as concepções científicas implícitas no conto são, na opinião deste resenhista, demasiado ingênuas mesmo para os anos 20 – por exemplo, uma mensagem de rádio é transmitida instantaneamente de Alfa Centauri para a Terra, ignorando as limitações da velocidade da luz (embora, por outro lado, a história esteja consciente da teoria da relatividade, ignorada pela maioria dos autores de FC reais da época). Como o conto de Marcelo Assami, é um conto curioso e cheio de alusões para poucos – neste caso aqueles que, além de apaixonados pela história da ficção científica, tenham a paciência de enfrentar os ff, mm, th e ph de nossos avós. Estes, certamente, jamais voltarão a reclamar das reformas ortográficas.
comentários(0)comente



Junior Cazeri 10/07/2011

Da orelha do livro: “Grandes e novos autores exploram infinitos imaginários nesta coletânea da Editora Draco. A coleção Imaginários trará, a cada volume, contos inéditos que encontrarão o fantástico em todas as suas variantes, contando histórias de ontem, de hoje, de amanhã e – por que não? – de nunca. Conheça esse maravilhoso universo e reimagine a literatura fantastica.”

Reunindo grandes autores, a Editora Draco, lança o terceiro volume da coleção Imaginários, uma antologia de contos que não se prende a nenhum gênero específico, e permite ao leitor um passeio literário que vai da space opera ao cyberpunk, passando pela fantasia, horror e steampunk sem qualquer pudor ou amarras. Infelizmente, não conheço os volumes anteriores, por isso não posso fazer comparações. O que posso dizer, com toda a sinceridade, é que fiquei absolutamente surpreso com a grande qualidade dos contos aqui apresentados que, salvo pequenos deslizes, são todos fabulosos. E já posso adiantar que, até o momento, Imaginários 03 foi o que encontrei de melhor na literatura nacional nesse ano. Sim, outros lançamentos virão, mas, até lá, corra pra conseguir o seu.

Uma geral do que você vai ler, com minha opinião intromedita, é claro.

A Torre das Almas – Eduardo Sphor: Um spin-off de “A Batalha do Apocalipse”, que traz um grupo de anjos em ação para vencer um perigoso inimigo. Em uma narrativa breve, Sphor mostra o que sabe fazer de melhor: criar personagens interessantes, descrever cenas de ação e mostrar criatividade. É esse pique que espero ver em seus próximos trabalhos. Direto e cortante como uma espada sagrada.

Breve Relato da Ascensão do Papa Alexandre IX – Marcelo Ferlin Assami: temos aqui um verdadeiro desafio ao leitor. Não é um conto fácil de ler, mas, com um pouco de esforço, torna-se compreensível e, mais que isso, surpreendente. A trama não é tão envolvente quanto poderia, mas a apresentação é surpreendente.

As Noivas Branca – Rober Pinheiro: dizer que As Noivas Brancas é uma space opera é menosprezar o trama, que bebe de várias fontes, da fantasia ao cyberpunk, na construção de uma aventura espacial impossível de parar de ler. Um grande trabalho de Rober Pinheiro.

Bonifrate – Douglas MCT: cruzando sentimentos profundos com ação, Douglas reconstrói uma fábula universal usando um cenário steampunk com influências de Matrix. Parece loucura? Não é, todos os ingredientes combinam perfeitamente, tal a engrenagem de um relógio, e o resultado é fantástico.

Dies Irae – Lidia Zuin: um conto cyberpunk, gênero cuja popularidade, e também originalidade, teve seu apogeu em um passado já distante. Lidia oferece o seu melhor, apesar do desgaste desse universo de hackers, drogas, látex e cirurgias plásticas. Sem novidades, mas divertido.

Vida e morte do último astro pornô da Terra – Marcelo Galvão: “Boogie Nights” encontra “Eu, Robô” (versão cinematográfica), nesse conto. Um dos mais envolventes da antologia, e muito bem escrito por sinal, pra ser lido sem olhar para os lados. No entanto, devo admitir que estranhei a atitude do personagem Robb (sem spoilers) e, numa segunda leitura, achei sua caracterização contraditória. Será que deixei passar alguma coisa?

Corre, João, corre – Cirilo S. Lemos: Que me perdoem os demais autores, mas o conto de Cirilio é, de longe, o melhor da antologia. Com simplicidade e elegância, a narrativa convincente do pai que busca salvar o filho vai caminhando para o fantástico e uma angústia conduz até o desfecho da história. Tocante e bela. Parabéns, Cirilo.

Uma segunda opinião – Fernando Santos de Oliveira: estranho ter o conto mais fraquinho da antologia logo após o melhor. Uma trama adolescente, com direito a escola, brigas no pátio e picuinhas. Tudo muito banal e com cara de filme americano de terror. Nem mesmo o final, muito bem pensado, salva a história, que precisava de uma visão mais inovadora.

Maria e a Fada – Ana Cristina Rodrigues: uma fantasia medieval, muito bem escrita por Ana, que é historiadora, e traz uma atmosfera realista à narrativa. Só penso que o desfecho ficou um tanto vazio de sentido e significado. Não vi justificativa para a ação da fada na floresta (calma, isso não vai comprometer sua leitura), o que quebra o encanto da primeira parte, que é ótima.

O Primmeiro Contacto – Fábio Fernandes: é até difícil encontrar as palavras certas para elogiar esse conto, uma rica homenagem aos clássicos primordiais da ficção científica, que narra uma batalha espacial após uma invasão alienígena, ocorrida em 1929, e com a grafia da época! Uma leitura deliciosa, que encerra de forma memorável a antologia.

Resenhado no http://cafedeontem.wordpress.com/
comentários(0)comente



Leitora Viciada 28/03/2012

O terceiro volume de Imaginários mantém o padrão dos anteriores, tanto na qualidade gráfica quanto no conteúdo literário. Pessoalmente este volume foi o que mais gostei da série (mas ainda tenho o 4 para ler). Cada volume da série é independente e forma uma coleção muito interessante. Ótimos momentos de leitura e diversão para os fãs da literatura fantástica nacional. Vocês podem também conferir as resenhas que fiz para o volume 1 e para o volume 2.
Como é comum ocorrer, alguns contos agradam mais que outros, porém todos são excelentes. Mesmo sendo diferentes em narrativa e estilo (afinal são de escritores distintos), a leitura flui e agrada a todos os fãs de gêneros fantásticos. Também gostei muito da capa e projeto gráfico.
Parece que nesse volume o destaque está para alguns subgêneros da Ficção Científica, como o Cyberpunk e o Steampunk. Claro que existem contos mais puxados para a fantasia ou terror.
Alguns dos contos estão disponíveis na Amazon em e-book.

A coletânea inicia muito bem com o autor Eduardo Spohr, famoso pelo sucesso A Batalha do Apocalipse. A Torre das Almas, como eu deduzi, faz parte desse universo e imagino ser interessante a todos os fãs do livro que leiam este conto. Não tive a oportunidade ainda de ler A Batalha do Apocalipse, mas gostei muito desse aperitivo, onde uma equipe de anjos enviados por Gabriel investiga na Terra um caso de um espírito aprisionado. Claro que a história, embora curta, traz outros acontecimentos cheios de ação.

O segundo conto é Breve relato da ascensão do Papa Alexandre IX e o autor Marcelo Ferlin Assami conseguiu criar uma história muito mais complexa que o longo título. Confesso que tive certa dificuldade em ler o conto e reli muitos trechos diversas vezes. Ás vezes eu perdia o fio condutor principal. No entanto, creio que seja uma deficiência minha, porque o conto é muito bem escrito, surpreendente e fantasticamente criativo. Espigas de milhos mutantes e uma motocicleta sanguinária devoradora, numa trama fluida e de saltos temporais. Pequenos fatos integram uma teia instigante e curiosa, mesmo que possa ser um pouco confusa para alguns leitores.

Em seguida vem o conto de Rober Pinheiro, intitulada As Noivas Brancas. Uma história fantástica e uma excelente aventura com mistura de Space Opera e Cyberpunk. O ritmo da narrativa é intenso e os ambientes e seres apresentados são incríveis e estranhos. O conto possui boas doses de ação e violência. Mercenários espaciais liderados um anti-herói sarcástico precisam recolher e entregar uma carga formada por mulheres bonitas, indefesas e condenadas. Um pouco machista, mas divertido.

O que dizer de Bonifrate de Douglas MCT? Perfeito, eu me apaixonei por cada detalhe, e são muitos! O conto é uma releitura de uma história infantojuvenil clássica com elementos da Ficção Científica, principalmente do Steampunk. Diferentemente do clássico referente, Bonifrate transmite uma carga dramática e singela sem ser sentimental demais. É uma fábula um pouco sombria e envolvente. Vai para minha lista de contos preferidos.

Dies Irae de Lidia Zuin é um dos melhores do livro. A autora mostra componentes do Cyberpunk, como hackers, drogas, gangues e a cibernética num submundo social cruel. Mesmo não agregando nada de novo ao subgênero, o conto é intensamente bem detalhado, com a violência e decadência perseguindo a protagonista. Ela é uma hacker que divulgou filmes com assassinatos, estupros e torturas sádicas e reais. Agora ela é a caça.

O conto Vida e morte do último astro pornô da Terra mostra uma realidade alternativa com grande toque sarcástico. Marcelo Augusto Galvão usa o humor negro para apresentar um mundo onde os biôs foram construídos para serem utilizados em filmes pornôs, substituindo os astros do mercado pornográfico. Um conto inteligente e divertido que faz críticas ao desemprego tecnológico e falta de princípios morais.

Corre, João, corre é o conto que mais surpreende na coletânea, por ser o mais poético e humano. O protagonista imperfeito é cativante. De início não entendi o porquê de o conto estar em Imaginários, apesar de ser maravilhosamente bem escrito. De repente, o choque, a surpresa: o fantástico surge, trazendo um pouco de terror. João encontra-se numa situação desesperadora e não sabe muito bem como agir, porém nada de ficar de braços cruzados. Estaria ele louco ou realmente isso tudo estaria ocorrendo? Parabéns ao autor Cirilo S. Lemos.

O conto seguinte é de Fernando Santos de Oliveira. Com Uma segunda opinião o autor trouxe uma história de terror leve que eu a classificaria mais como feita para o público juvenil. Uma garota excluída dos grupos populares da escola se sente humilhada com uma determinada situação e decide se vingar dos colegas causadores do constrangimento. Ela encontra uma menina desconhecida e sombria na biblioteca esquecida e passa a seguir todos os seus conselhos, praticando maldades e entrando num jogo macabro. A protagonista é ingênua e sem autoestima.

O penúltimo conto do livro é uma Fantasia Histórica graciosa: Maria e a fada, escrito pela historiadora Ana Cristina Rodrigues. Além de termos um ótimo conto com magia intrincada nos acontecimentos, nos deparamos com informações sobre História, inseridas de forma leve e complementar. A origem mística de uma importante família da Idade Média é passada de geração em geração, preservando seus segredos mágicos. Gostei muito dos detalhes, uma mistura de realidade com fantasia muito bem equilibrada.

Fábio Fernandes escreveu um conto ousado: Como seria se um brasileiro tivesse escrito uma história de Ficção Científica no estilo de Space Opera em 1929? Com direito a grafia antiga, bem diferente da nossa atual e com os "absurdos" da Ciência típicos da época, quando a ficção era mais ainda especulativa. O Primmeiro Contacto me atraiu e ao mesmo tempo me repeliu, dependendo do momento. Um conto muito original, desafiador e interessante.

Agora é partir para Imaginários volume 4!

Contos que mais gostei: Bonifrate; Dies Irae; Corre, João, Corre; Maria e a Fada.

Trechos:
"Zarion enfiou a mão dentro da jaqueta e materializou sua espada, tirando uma lâmina de meio metro de onde não havia absolutamente nada." A Torre das Almas, Eduardo Spohr.

"Um leve torpor começou a tomar conta dos moradores de X. Se olhassem pelas janelas da prefeitura veriam as espigas gigantescas a assumir a forma dos cidadãos, que iam ficando mais e mais sonolentos." Breve relato da ascensão do Papa Alexandre IX, Marcelo Ferlin Assami.

"Um novo tranco e cruzamos a atmosfera até o centro de um continente ressequido pelo calor abrasivo dos dois sóis gigantes, um lugar coberto de sombras vivas e parcamente adornado com três ou quatro árvores murchas e retorcidas." As Noivas Brancas, Rober Pinheiro.

"Carlo caminhou por silhuetas familiares. Todos os corpos tinham o mesmo tamanho, os mesmos maneirismos e forma de andar ou se mover, e vestiam o mesmo uniforme, mas ignoraram sua presença. Usavam máscaras de prata com pequenos orifícios e jamais revelavam seu rosto." Bonifrate, Douglas MCT.

"Enlouquecida pelo medo, ordenou à máquina que deletasse toda e qualquer informação guardada. Da rede, tentou apagar todo o registro que remetesse a sua pessoa virtual. Mas nada é realmente perdido, na internet." Dies Irae, Lidia Zuin.

"No dia seguinte, Nicholas Richards deixava para trás não só o subemprego, mas também a mãe com eterno hálito de vinho barato o padrasto que abusou dele sexualmente durante a infância e adolescência, o trailer apertado onde viviam." Vida e morte do último astro pornô da Terra, Marcelo Galvão.

"Centenas de vozes a desfiar um cantochão monótono, formado por choros inconsoláveis, preces tristes e lamentos agudos; João, assustado, cutuca o pai, que parece alheio ao desfile de um cortejo que vem subindo a rua." Corre, João, corre, Cirilo S. Lemos.

"A garota do outro lado da mesa começou a falar coisas terríveis. Suas ideias eram tão obscuras quanto sua imagem que ainda se escondia no meio das trevas." Uma segunda opinião, Fernando Santos de Oliveira.

"Estendeu a caixa para Maria, que, incrédula, abriu. La Marche não mentira nem exagerara. Era uma escama dourada, imensa, perfeitamente entalhada, de uma forma que jamais artífice algum conseguiria fazer." Maria e a Fada, Ana Cristina Rodrigues.

"Elle vê o immenso salão adjacente aos hangares e acompanha em silêncio os trabalhos dos computadores. Cuidando das immensas machinas estão os homens que as inventaram." O Primmeiro Contacto, Fábio Fernandes.

+resenhas em www.leitoraviciada.com
comentários(0)comente



Rahmati 22/09/2015

Vale a pena ler

O volume 3 foi o primeiro das incríveis coletâneas Imaginários da editora Draco que consegui ler. Como os outros volumes, são contos de fantasia, ficção científica e terror, sempre de autores nacionais — como é o procedimento dessa editora. Achei o resultado desse volume muito positivo, e, no geral, fui surpreendido positivamente! Mas, sem mais enrolação, vamos às (breves) análises dos contos.

1.º: A torre das almas, de Eduardo Spohr.
Um conto passado no universo ficcional de A batalha do Apocalipse, do autor. Mostra uma aventura curta, com a solução de um "caso policial" pelos celestiais infiltrados no mundo físico — mas sem emoções e sem fatos intrigantes. Como esse volume 3 é de 2010, espero que o autor tenha melhorado também sua escrita depois disso, porque tem muito tell e pouco show (da pérola estilística "show; don't tell" — mostre; não conte). Dava para ter contado tudo o que ele queria contar sem tanta explicação gratuita, mas... De qualquer forma, serve como introdução ao seu universo. E para mim já foi o suficiente.
Nota 2 de 5.

2.º: Um breve relato da ascensão do Papa Alexandre IX, de Marcelo F Assami.
Um conto interessante. Bom. A narrativa de uma sucessão papal nada convencional (ou seria...?), com um algo a mais. O escritor mostra bastante ao invés de contar, e isso é ótimo. Dá a sensação de que estamos deixando passar algo despercebido. Interessante também ele usar os sobrenomes de escritores (inclusive o dele próprio) para seus personagens; apesar disso ser bastante feito por aí (até eu já fiz), sempre é legal.
Nota 3 de 5.

3.º: As noivas brancas, de Rober Pinheiro.
Um conto muito legal. Uma aventura de resgate, num cenário de ficção científica, com toques de psicodelia engraçadíssimos. Vale ressaltar que Rober escreve muito bem.
Nota 3 de 5.

4.º: Bonifrate, de Douglas MCT.
Conto de ficção científica muito bom! O autor conseguiu aqui, nessa releitura de um conto popular, criar um mundo muito mais interessante do que o da outra outra que li dele, Necrópolis. Lembrei-me de um filme de que gostei muito — o Inteligência artificial —, então isso deve ter ajudado na apreciação da obra. Muito bem escrito também.
Nota 4 de 5.

5.º: Dies irae, de Lidia Zuin.
Conto de ficção científica regado a drogas e perseguições. Escrita muito boa; uma protagonista sem chance de redenção ou ajuda possível; um final, pelo menos para mim, enigmático — e, não sei bem dizer por quê, mas histórias sobre a decadência humana são sempre atrativas.
Nota 3 de 5.

6.º: Vida e morte do último astro pornô da Terra, de Marcelo Galvão.
Conto compacto e excelente! Criativo na forma e com uma virada interessante no final; muito bem escrito e com um tema mais profundo do que aparenta. Apesar do nome... suspeito, digamos, é o melhor conto da coletânea.
Nota 5 de 5.

7.º: Corre, João, corre, de Cirilo S Lemos.
No começo, dá de se pensar onde estará o elemento fantástico desse conto, mas tudo muda do meio para o fim, quando a história dá uma guinada e o ritmo, que já estava agitado, se torna frenético e agoniante. Ótimo. Não podia ser diferente; quando vi que seria uma história desse autor, já imaginava que não ia me decepcionar.
Nota 4 de 5.

8.º: Uma segunda opinião, de Fernando Santos de Oliveira.
Um conto de vingança estudantil, com um "quê" de Carrie: A estranha. A escrita é, claramente, de um autor iniciante (tanto que sua biografia ao fim do livro não cita outros títulos), e o tema não me prendeu; achei até meio bobinho, inocente. Esse é o mais fraco da coletânea.
Nota 2 de 5, porque o final foi interessante e diferente do que esperava.

9.º: Maria e a fada, de Ana Cristina Rodrigues.
Conto interessante, bem escrito, com uma ambientação medieval que me agradou bastante. Tem uma aura mágica e o jeito da autora contar a história ajudou muito na trama relativamente simples.
Nota 3 de 5.

10.º: O primmeiro contacto, de Fábio Fernandes.
Conto muito criativo na forma — o autor escreve como não fosse ele o autor do conto; como se este tivesse sido encontrado num sebo, escrito por um suposto Dr. Eleutherio Penna Filho, pseudônimo de um artista desconhecido, no ano de 1929 —, mas nem tanto na trama. Ok, o conto tem que ser encarado como se tivesse realmente sido escrito antigamente, então a trama está adequada — até mesmo a "inocência" relativa às viagens espaciais é justa, porque faltariam ainda décadas para o início das aventuras espaciais da humanidade. A ortografia também simula a escrita antiga; no entanto... as contruções frasais não convencem. Não sei dizer por quê, mas o... linguajar?... estilo?... algo me incomodou. Talvez seja o estilo mesmo; os "cortes" da cena parecem muito modernos, muito dinâmicos. Antigamente as narrativas eram mais lentas, mais descritivas, menos cinematográficas... Enfim; de qualquer forma, é um conto muito bom para o que propõe. Usa personagens históricos (outro recurso que também acredito ser mais moderno do que clássico), mas acho que acabou faltando um pouco de emoção na trama.
Nota 3 de 5.

No final, posso dizer com tranquilidade que a coletânea vale o que custa — e deixa o leitor com vontade de ler os outros volumes. Acho que vale um 3,5 de 5 de nota final :)

site: oblogdorahmati.blogspot.com.br
comentários(0)comente



Luiz Eduardo 03/12/2010

Imaginários Volume 3: steampunk, cyberpunk e o que há de melhor na literatura fantástica nacional

Segue o link da minha resenha: http://wp.me/pvLVM-cBZ
comentários(0)comente



8 encontrados | exibindo 1 a 8


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR