Mariana 30/05/2021isto era uma América da qual eu não era um nativo, e nunca seria, e que no entanto pertencia a mim como americano"Eu nunca havia conhecido ninguém cuja vida fosse tão profundamente circunscrita por uma parcela tão grande da história americana, ninguém que estivesse pessoalmente familiarizado com tantos elementos da geografia americana, que tivesse enfrentado, face a face, tanta coisa na vida dos americanos pobres. Eu nunca conhecera ninguém tão mergulhado no seu tempo ou tão determinado por ele. Ou tão tiranizado por ele, ao mesmo tempo seu vingador, sua vítima e seu instrumento. Imaginar Ira fora do seu tempo era impossível."
'Casei com um comunista' traz boas reflexões, mas não consegui me conectar muito bem com ele, apesar de me parecer muito bem escrito. Me identifiquei bastante com o protagonista, talvez por esse sentimento de insuficiência de não ter vivido a vida de verdade, e a pretensão de se sentir complexo demais diante da simplicidade do destino das pessoas. "É só que eu não consigo suportar que você seja tão convencional", lhe disse um de seus professores. Essa busca incessante por uma simplicidade que nos faça sentir algo.
"Mas se algo na minha complexidade escarnecia dele, algo na sua simplicidade também escarnecia de mim. Eu fazia tudo virar uma aventura, andava sempre atrás de mudanças, ao passo que Brownie vivia sem outra preocupação que não a estrita necessidade; ele tinha sido tão moldado e domado pelas repressões que só era capaz de representar o papel de si mesmo."
O contexto da narrativa conta pra gente um pouco da história estadunidense no século XX: a lei de Jim Crow, o McCarthismo, a perseguição ao comunismo da qual Hollywood não escapou, o antissemitismo, a pobreza, o discurso status quo dos democratas vendido como transformação pro país, Reagan, Nixon, as barbaridades e a hipocrisia no alto escalão do governo.
"Quando alguém se está educando pela primeira vez e sua cabeça se está transformando num arsenal armado de livros, quando essa pessoa é jovem, petulante e parte aos pulos, cheia de satisfação, para descobrir toda a inteligência que se encontra escondida pelo planeta, ela está apta a exagerar a importância da realidade nova e fremente, e desdenhar tudo o mais como uma coisa irrelevante."
Acho que preciso digerir um pouco antes de dizer se gostei ou não gostei. Talvez a história não tenha me prendido tanto, e talvez minha falta de interesse por história norte-americana também tenha minado um pouco a leitura, mas tive muita reflexão boa ao longo do livro. Ficamos, então, com três estrelas. Quem sabe? Numa releitura talvez as coisas mudem...