Tihh.Goncalves 24/12/2014
Em resumo, grande equívoco de Frank Viola. Uma pena.
Confesso que por anos resisti ler esse livro, simplesmente pela pejoratividade do título. Por recomendação e insistência de amigos queridos, acabei lendo-o para não ficar no “eu acho que sei o que esse livro fala e não gosto” e ter uma resenha mais formada e incisiva.
- Importância de conhecer nossa própria história.
Apesar de minha desconfiança, li o livro na esperança de ser surpreendido, torcendo para que eu tivesse me equivocado. Gostei quando já logo nas primeiras páginas o autor deu uma pincelada resumida da história da igreja primitiva, surgimento dos seus ritos e liturgia exercida até hoje. Acho que é importante conhecermos nossas história e Frank simplificou em poucas linhas cada tópico, achei bem bacana e bem resumido pro que o livro propõe.
- Questionar e refletir é indispensável.
Acho que questionar é indispensável em qualquer situação. Sócrates, que pelo número de citações no livro me faz pensar que o autor também aprecia seus pensamentos, já dizia que “Vida sem questionamentos é vida sem valor.”, ou então: “A Sabedoria nasce na reflexão”.
- Tropeços de Frank.
Porém, apesar das importantes indagações que o livro propõe, ele nos dá respostas que ao meu ver são equivocadas e rasas. Diante da grandeza proposta de querer retirar as amarras da religiosidade em suas perguntas o autor peca, lamentavelmente, ao tentar responder instituindo novas leis no lugar das que isentou.
Grande equívoco de Frank Viola, uma pena.
Quando alguém cria uma prática ou um ritual, pratica-la não nos faz escravos dos ideais de quem a criou. E digo isso tanto no aspecto positivo quanto negativo.
Escrevo essa resenha praticamente à véspera do Natal, que por muitos é chamado de uma festa pagã. Porém, não é por causa de eu celebrar a tradição do Natal ou porque enfeitei minha casa com um pinheirinho e piscas, que fará de mim um homem pagão. Isso é pensamento do que eu chamo de “crente místico”. Não é o que eu faço, o que eu vejo ou o que eu como em minhas refeições que dirá quem sou, mas a essência da minha existência. Uma maça ainda plantada na macieira ou na geladeira da minha casa, seja onde estiver, na sua plenitude continuará sendo sempre uma maçã.
- Mentalidade legalista.
Honestamente achei Viola acirradamente legalista ao questionar, por exemplo, a homilética e a retórica. Achei infeliz quando colocava que se tal prática não está na bíblia, então é anti-bíblica. O cristianismo não é limitado aos exemplos bíblicos. O próprio Jesus certa vez disse que iríamos além dele e isso não se dá porque somos mais poderosos ou melhores que Ele, mas sim porque os tempos mudariam e faríamos coisas em nosso tempo que no dele não eram possíveis. Se Frank Viola tivesse coerência ao pré-julgar práticas extra-bíblicas como anti-cristãs, não poderia, por exemplo, utilizar de recursos que contribuíram para propagar suas ideias no seu livro. Afinal, se ele escreveu sua obra com intúito de contribuir com o cristianismo, deveria, de acordo com sua visão, ter se limitado aos recursos mencionados na bíblia, mais especificamente aos do século I.
Confesso que o teor das narrativas me incomodaram um pouco também. Frank Viola na maior parte do seu livro utilizou um tom ameaçador e prepotente, como quem quisesse ser intimidador desde a introdução dizendo “se não quiser acordar pra vida, nem leia esse livro”. Todo grande questionador sabe da relevância de questionarmos nossos conceitos. Me decepcionei nesse quesito com o autor que tentou o tempo todo estabelecer suas ideias e conclusões como as únicas certas, ao invés de trazer seus leitores a reflexão, como disse que faria no início de sua obra.
- Carência de Equilíbrio.
Saliento que questionar é necessário! Muitas práticas das igrejas hoje, talvez até a maioria, são costumes inventados por legalistas. Sou totalmente a favor a questionarmos tudo isso. Acho que o maior problema hoje da igreja está na ignorância, ou seja, na falta de consciência da essência das coisas de Deus.
Mas na minha opinião faltou equilíbrio do Viola ao redigir sua obra. Provavelmente não recomendarei esse livro aos meus colegas de caminhada, simplesmente por considerá-lo perigoso. Conhecer é importante, mas mais do que conhecer historicamente a origem das práticas é conhecermos a essência do nosso Deus. É como a diferença de um universitário que estuda as Escrituras como tese teológica de um cristão que lê as Escrituras para conhecer e caminhar com seu Criador. As vezes a narrativa de Frank me pareceu um religioso querendo comprovar sua que sua religião estava históricamente equivocada e queria voltar a ser como os religiosos do século I, enquanto deveria estar deixando a religião de lado e viver exclusivamente a simplicidade do caminhar com Deus.
Entenda que não vejo obrigatoriedade de ninguém a praticar nenhum rito, seja qual for. Nem mesmo pertencer a uma instituição eu acho obrigatório. Acho que tudo o que alguém faz ou deixa de fazer é de foro íntimo. O que estou sendo contra o livro é na intenção do autor, em praticamente toda sua obra, de demonizar quaisquer práticas extra-bíblicas.
Uma das minhas principais discordâncias, foi do autor referenciar a “Igreja Primitiva” como um modelo perfeito a ser seguido eternamente. Uma vez disse a um amigo que pensar assim é tão equivocado quanto a considerar a oração do “Pai Nosso” um ritual pra cumprirmos (como lei) do que um exemplo da liberdade e da proximidade que temos com nosso Criador. Um fator ignorado por Viola é por exemplo as cartas paulinas, escritas praticamente com objetivo de resolver problemas da igreja. Ele combateu em suas cartas a carnalidade, legalismo, oportunismo, divisão e heresias das principais igrejas mencionadas no Novo Testamento. Em outras palavras, as igrejas eram complicadas e exigiram atenção de Paulo para adverti-las.
Abaixo vou mencionar uma das palavras de Frank no primeiro capítulo que gostei e anotei, mas que acabaram sendo contraditas por ele próprio no restante do livro, uma pena:
“[…] O uso de cadeiras e grossos tapetes tampouco têm apoio bíblico. Ambos foram inventados pelos pagãos. Mas quem disse que sentar em uma cadeira ou utilizar grossos tapetes é “ruim” pelo simples fato de ser uma invenção pós-bíblica dos pagãos? A realidade é que muitas coisas que fazemos em nossa cultura têm raízes pagãs. Considere nosso calendário. Os nomes dias da semana e dos meses do ano são homenagens a deuses pagãos. Mas, o uso do calendário não torna ninguém pagão. […]”
- Conclusão
Aos amigos que estão lendo minha resenha e estão lendo ou já leram o livro “Cristianismo Pagão”, de Frank Viola, deixo um amoroso recado: Tomem cuidado! Não há liberdade de quem quer isentar uma lei instituindo outra. Como tenho sempre dito: “Somente é livre pra não ir no culto todo domingo aqueles que são livres pra ir, caso queiram”. A legalidade não está naquilo que você pratica, mas na sua consciência. Frank inúmeras vezes demonizou as práticas como anti-cristãs, mas não percebe que está sujeito a religião histórica cristã, o que faz dele um religioso tão quanto aos que ele condena.
site: http://www.estacao.org/2014/12/cristianismo-pagao-frank-viola-resenha/