ariano 25/09/2010
Uma história de amor anticonvencional
Li Comer, Rezar, Amar há dois anos e gostei bastante. Lembro que fiquei empolgadíssimo na época com os pontos de vista da autora Elizabeth Gilbert, uma jornalista bem sucedida na carreira e com um casamento estável que resolve chutar o balde do seu relacionamento convencional porque ela e o marido tinham opiniões diferentes sobre coisas fundamentais na vida de um casal como, por exemplo, ter filhos. Elizabeth ou Liz estava na virada dos 30 pros 31 e já tinha conquistado coisas que a maioria das mulheres talvez nem sonhem nessa idade. Estava tudo certo na sua vida e justamente por isso o marido lhe perguntou: por que não um filho? Acontece que nem todas as mulheres tem essa pulsão pela maternidade e Liz encarou isso de uma forma muito franca e direta. Não tenho vontade de ser mãe e não enxergo nada de errado nisso. Além desse questionamento que acabou se tornando um embate litigioso com o marido, Liz também questiona os valores da família média americana. Talvez o ponto-chave para que resolva mudar radicalmente sua vida e aí sim começar a história do livro seja uma observação de um amigo próximo que faz uma comparação entre Liz e os cachorros que ficam cada vez mais parecidos com os donos. No caso, Liz é quem ficava com a cara dos namorados. Nesse momento, ela para pra pensar que talvez nunca tenha dado um tempo pra si mesma, estava sempre às voltas com uma companhia masculina e então decide viajar por um ano. 4 meses na Itália. 4 meses na Índia. 4 meses na Indonésia. Não vou falar sobre sua jornada aqui porque espero que você leia o livro.
Comecei falando sobre Comer, Rezar, Amar porque achei o livro um relato de autoconhecimento feminino muito autêntico. E me espantei quando dei de cara com o título do livro seguinte de Liz - Comprometida. Como assim? Uma mulher que escreve um livro sobre anseios e questões femininas tão preponderantes, resolve agora escrever um livro sobre estar comprometida com um homem? Uma história de amor banal tão avessa ao que eu havia lido em Comer, Rezar, Amar? Pra começo de conversa, leitor/a, não se deixe enganar pela capa da edição brasileira, tampouco pelo subtítulo 'Uma história de amor' a não ser que esse amor venha acompanhado do adjetivo anticonvencional. Liz é obrigada a se comprometer/casar com Felipe, o brasileiro que conhece no final de Comer, Rezar, Amar. Não é uma decisão espontânea. Ela não tem escolha. Ou ela casa ou Felipe nunca mais poderá entrar nos EUA por determinação do Departamento de Imigração. E como não tem escolha, resolve entrar nessa aventura de forma muito consciente. Como? Analisando de maneira profunda a instituição do casamento sob os mais diversos aspectos: político, histórico, religioso, sexual, racial. Muito bem embasada em pesquisas e estudos psicológicos o que vemos nas páginas desse livro é um verdadeiro Raio X da união matrimonial institucionalizada. Liz, continua firme, em sua verve feminista, e se você leitora, está a fim de encontrar uma história de amor açucarada, acho melhor procurar por Nora Roberts ou Nicholas Sparks. Uma das coisas que Liz nos mostra é como desde os primórdios até os dias atuais, o casamento é muito mais vantajoso para os homens do que para as mulheres. Nos traz dados estarrecedores, como por exemplo o primeiro casamento inter-racial nos EUA ter sido aprovado somente em 1967!!!! Nos faz viajar pelas tradições tão pouco afeitas à paixão no casamento de uma pequena tribo vietnamita à supervalorização do matrimônio na sociedade ocidental, onde mulheres supermodernas e descoladas querem entrar de véu e grinalda numa cerimônia bafônica simplesmente porque quer que todo mundo veja que ela foi escolhida. Traz estudos psicológicos interessantes que mostram o grau de furada que é se casar quando se está apaixonado, pois a paixão, segundo sua pesquisa é um vício como outro qualquer e deixa qualquer ser humano desestabilizado. Mas Liz também mostra o outro lado da moeda: a sabedoria de conviver com alguém que é diferente de você, a verdadeira necessidade de se fazer uma cerimônia e, mais do que tudo, nos mostra que mesmo em situações de extremo embaraço e insegurança é preciso estar em equilíbrio. É preciso olhar para si para poder enxergar com reflexão o que há em volta. Tudo isso numa narrativa inteligente e envolvente. Quando terminei de ler o livro, fiquei pensando no título. Comprometida não é uma palavra fácil. Para se comprometer com alguma coisa, é preciso estar de olhos bem abertos e ciente das responsabilidades que estão por vir para poder aproveitar a plenitude quando ela vier. O que Liz Gilbert parece querer nos dizer é o que Caetano já disse numa de suas famosas canções: cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.