Os Pensadores: Erasmo de Rotterdam - Thomas More (Vol. X)

Os Pensadores: Erasmo de Rotterdam - Thomas More (Vol. X) Erasmo de Rotterdam...



Resenhas - Elogio da loucura (Erasmo), A utopia (More)


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Carol 25/02/2024

Muitas críticas aplicáveis? atemporal
Um livro bom, porém em alguns momentos cansativo na leitura devido à época na qual foi escrito.

?? pode-se amar alguém quando se odeia a si mesmo? Pode-se viver em bom entendimento com os outros quando não se está de acordo com o próprio coração? Pode-se oferecer algo de bom à sociedade quando se está aborrecido e fatigado com a própria existência? Seria preciso ser mais louco que a Loucura mesma para responder afirmativamente a essas perguntas.?
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Wagner254 04/11/2023

Análise válida somente para "Utopia"
Incrível, os livros que remetem a uma sociedade perfeita particularmente me encantam.

No que se refere a Utopia, dispensa comentários, a leitura não cansa, as páginas voam, é agradável de ler e nos dá muito conteúdo para debates e possíveis dissertações...
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Hanna.Fernandes 13/07/2021

século XV ou XXI?
Um livro cheio de critica e ironia, o cara tá P da vida e expondo os podres de todo mundo, gosto assim!

É um livro de 1500 e pouquinho e por vezes enche o saco, mas garante boas gaitadas, no fim das contas, é um livro legal.

Uma coisa que me impressionou é que mesmo sendo escrito a tanto tempo atrás, algumas críticas funcionam perfeitamente hoje em dia, me pergunto se Erasmo se revira muito no túmulo quando vê que mais de 500 anos depois, a sociedade e a igreja continua tão hipócritas quanto antes
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Lordlima 30/05/2021

Um livro para ser lido varias vezes
Terminado a leitura do elogio a loucura vejo que a obra de Erasmo se torna bastante atual quanto ao contexto teológico e religioso atual , principalmente no que se tange o Evangelismo moderno que se tornou o que tanto Erasmo criticava

O "Elogia da loucura " é uma das obras mais importantes e realmente vale ser lida varias vezes mesmo , sendo favorável ou contra o cristianismo ( eu mesmo não gosto do cristianismo ) pois se trata de varias reflexões por meio do escárnio sobre questões muito interessantes sobre a vida .

Sobre a edição , pelo menos a minha estava muito boas condições e com nenhum problema de erro ortográfico ao não ser pelo uso da palavra "mister". Apesar do vocabulário pouco simplificado da tradução trucada vejo que é a que mais se aproxima do original comparando com a concorrente da martin claret .
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jessylins 07/05/2021

um clássico
Um livro bem interessante porém difícil de ler, tive que me esforçar muito pra chegar ao final.
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Luciano Ventura 23/03/2020

ESTUDO DA OBRA

Em Utopia, Thomas More conta, por meio de uma narrativa empreendida pela personagem Rafael Hitlodeu, sobre a existência de uma república que, segundo seu ponto de vista, seria a única nação realmente merecedora deste título.

Após More situar o leitor no tempo e no espaço, falando que a viagem à Flandres, na qual teria conhecido Rafael Hitlodeu, sua própria personagem dentro da trama, fora consequência da necessidade de mediar uma contenda entre o rei inglês Henrique VIII e Carlos, o príncipe de Castela, ele apresenta as personagens que fazem parte de seu texto.

Com maior relevância, percebemos Rafael Hitlodeu, um experimentado viajante português que participara de algumas aventuras em companhia do célebre navegador italiano Américo Vespúcio, e Pedro Gil, o amigo em comum que fora responsável pela apresentação de Rafael a Thomas: criatura e criador.

Após um primeiro contato, suficiente para que More se desse conta da grande sabedoria da qual Rafael era portador, aquele afirma que este seria de grande valia na corte de qualquer rei. Mas Hitlodeu reage negativamente afirmando que os monarcas são cercados por interesses diversos do bem público e que seus conselhos não surtiriam efeito em meio a estas pessoas. Em face à insistência de More, Rafael descreve como reagiriam os príncipes e seus conselheiros diante de opiniões que recomendassem o abandono da ambição territorial, do luxo excessivo e da futilidade que permeava a conduta da nobreza. Para exemplificar, passa a narrar algumas de suas experiências, dentre elas, um debate à mesa do clérigo John Morton, protagonizado por ele próprio e alguém por ele descrito como um bufão.

O debate por ele descrito ter-se-ia motivado pelos elogios declamados pelo citado fanfarrão às leis inglesas que condenavam ao enforcamento mesmo aqueles que praticavam pequenos delitos, como roubo, por exemplo. Hitlodeu rebate seus argumentos, buscando as causas que levariam homens de bem à prática de pequenos delitos que objetivavam a manutenção da própria sobrevivência. Afirma, ele, não ser justo a condenação à morte de qualquer pessoa que subtraia algo de outrem, antes que a sociedade como um todo crie maneiras para que todos possam prover de alguma maneira o seu bem-estar. Que se existia mendicância nas ruas das grandes cidades inglesas, ela seria devida às Leis de Cercamento que haviam substituído, no campo, a produção de alimentos pela de lã e, como consequência, o homem pela ovelha.

Ao tratar, então, de legislação, estrutura social, modo de vida, enfim, da lida com a coisa pública, Rafael Hitlodeu cita um lugar que conhecera quando acompanhava o navegador Américo Vespúcio, em uma das quatro viagens por ele empreendida , dizendo que de todas as nações por ele conhecidas, aquela seria a mais merecedora – senão a única – de ser chamada de República.
Devido ao interesse demonstrado por More e Gil em saber mais sobre este fabuloso lugar, o livro primeiro da obra é encerrado e inicia-se o seu segundo, composto pela descrição detalhada de como seria organizada esta república ideal chamada Utopia.

INFLUÊNCIA PLATÔNICA E NOMENCLATURA UTILIZADA
A admiração de Thomas More por Platão é perceptível nesta obra, não somente por citá-lo em várias passagens, tendo A República por pano de fundo, mas por fazer de suas ideias exemplos correspondentes das atitudes que considera corretas.

É interessante perceber a maneira utilizada por More para nomear os lugares e pessoas existentes em sua república ideal. Conforme já fora apontado por muitos, o próprio nome do local, Utopia (nenhum lugar, lugar que não existe), expressa em si a sentença de ser este inexistente; e alguns componentes da república também recebem nomes que reforçam esta noção de algo idealizado, ainda não concebido nem concretizado, como ocorre, por exemplo, com o nome de um dos rios Anidro (sem água), ou com a palavra que designa o rei, Ademo (sem povo), assim também com a denominação da capital do país, Amaurota (aquela que some como miragem). O próprio nome dado à personagem principal, Hitlodeu, “contador de histórias”, no grego, reforça o papel desempenhado por ela. Lembrando que o conceito que hoje empregamos à palavra utopia, e às suas derivações, adquire seu significado a partir de Thomas More e sua obra.

SOBRE O SEGUNDO LIVRO
Conforme citamos acima, a segunda parte de Utopia destina-se à narração da república idealizada, onde, por meio da personagem Hitlodeu, More não só cita os vários aspectos componentes da sociedade utopiana, como defende cada um deles por meio da comparação com o ocorrido nas nações europeias.

DESCRIÇÃO GEOGRÁFICA DA ILHA
Ele inicia por fazer o leitor imaginar a Geografia do local. Sempre que precisa descrever as distâncias, Rafael utiliza o passo como medida de espaço. Explica que se trata de uma ilha cujo território se apresenta no formato de lua crescente, tendo, entre seus extremos de terra, a formação de uma grande baía. Esta seria bem guardada, tanto pelas fortificações ali construídas quanto pela própria natureza subaquática, onde o relevo marinho , encoberto pelas águas, serviria de obstáculo a qualquer estranho que quisesse adentrar seus limites sem ter sido convidado. No tocante à proteção, a natureza seria auxiliada pelo engenho humano que ao mudar a sequencia de faróis que indicam o correto caminho na entrada da baía, condenariam ao naufrágio os que tentassem invadi-la.
Este pequeno golfo seria muito gentil aos utopianos que conhecem os atalhos de sua entrada e, uma vez lá dentro, encontram a calmaria das águas, propiciada pela inexistência de fortes ventos, devido à proteção das montanhas.
Tudo teria começado a mil setecentos e sessenta anos atrás , quando Utopus empreendera a colonização da “população grosseira e selvagem ”, fazendo, por motivos de segurança, da península de Abraxa uma ilha, usando seus soldados e nativos para desligar do continente a parte que viria a ser república de Utopia do continente ao qual estava ligada.


SOBRE A ZONA RURAL EM UTOPIA
Após fazer observações de caráter natural, Hitlodeu passa, então, à análise social, descrevendo, primeiramente, como era formado o campo e o estilo de vida das pessoas que o habitavam.
Diz que estas se veem mais como rendeiros do que como proprietários do solo . Afirma que um exército de trabalhadores é enviado pelas cidades bienalmente. Eles residem em casas providas dos instrumentos necessários para a prática da agricultura e estariam organizados em famílias agrícolas, sendo que cada família era formada por um mínimo de quarenta pessoas, comandadas por um “pai e uma mãe de família”.
Cada grupo de 30 famílias é dirigido por um filarca, na língua natal, que também é conhecido por sifogrante. Quando são reunidas trezentas famílias, os dez filarcas correspondentes obedecem a um protofilarca, também chamado de traníbora. Existe um rodízio entre os habitantes e, a cada ano, metade dos agricultores é substituída por outros vinte trabalhadores que vêm da cidade.
Desta forma, como explica Rafael, o trabalho penoso é dividido, sobrando tempo a todos para outras ocupações – salvo os que decidirem ali continuar por escolha própria - e o campo está sempre cuidado por um grupo experiente que ensina o trabalho à outra metade antes de partir.
Na época da colheita, os filarcas dizem aos magistrados da cidade de quantos braços a mais precisarão para o trabalho, e este os envia para que o trabalho seja encerrado no menor tempo possível; normalmente, um dia.
Quanto aos animais, comem carne de quadrúpedes, criam galinhas utilizando calor artificial para chocar os ovos, e usam o boi para o transporte e o trabalho na lavoura. Afirmam que o boi é mais forte e paciente que o cavalo, deixando, este, para a equitação, por meio da qual a juventude se exercita.
Os utopianos fazem pães com cereais e bebem suco que conseguem de determinadas frutas. Os utensílios domésticos e outros artigos que não existem no campo, vão buscar na cidade, não sendo necessária a compra dos mesmos.

SOBRE AS CIDADES UTOPIANAS
More, passa a explicar a vida citadina, dando, por exemplo, a cidade de Amarouta, não só por ser a capital do país, mas porque todas as cinquenta e quatro cidades utopianas seriam muito parecidas.
As cidades seriam cercadas por “altas e largas muralhas”, tendo torres e fortalezas. Canos de barros levariam a água do ponto mais elevado aos quarteirões que ficam abaixo dele. As nascentes dos rios, quando existem, seriam cercadas por fortificações para evitar, em caso de guerra, o envenenamento ou o desvio das águas.
As ruas e praças seriam bem dispostas, tanto para facilitar o transporte quanto para o abrigo dos ventos. As primeiras seriam ladeadas por edifícios que “brilham de elegância e conforto” e formariam duas fileiras contíguas.
Segundo podemos constatar pela narrativa de Rafael a respeito das casas, elas não possuiriam trancas, abrindo-se “facilmente com um ligeiro toque” e deixando “entrar o primeiro que chega”. Os utopianos trocariam de casa a cada dez anos para abolir a “ideia de propriedade individual e absoluta”, uma vez que eles aplicavam em toda a república o “princípio da propriedade comum”. Cada casa seria composta por três andares, constituídos por paredes externas de pedra ou tijolos e, internas, de estuque. O teto seria chato, recoberto de uma matéria moída que não pega fogo e nada custaria. O uso do vidro seria muito difundido na ilha, sendo escolhido, na maioria das vezes, para vedar as janelas e proteger do vento. Do lado externo possuiria um jardim e entre os quarteirões disputar-se-ia qual o mais bem cultivado.

SOBRE OS MAGISTRADOS
As cidades utopianas seriam dividas em quatro quarteirões. Cada um deles recomendaria uma pessoa para concorrer ao principado. Aproximadamente 1200 sifograntes prestariam juramento de dar o seu voto ao cidadão mais virtuoso e escolheriam, dentre os quatro recomendados, aquele que seria o príncipe.
O principado seria vitalício a menos que o monarca se tornasse um tirano. Os traníboras eram escolhidos anualmente, mas só eram mudados em casos graves. E os outros cargos sofriam pleitos anuais.
Pelas leis utopianas, os assuntos de interesse geral seriam discutidos três dias antes de serem votadas e as reuniões para tratar destas moções fora do senado e das assembleias do povo eram punidas com a morte dos participantes. Quando uma proposta é feita, ela somente seria discutida no dia seguinte. Segundo explica Rafael, tal severidade asseguraria ao povo que príncipe e os traníboras não conspirariam juntos contra sua liberdade.

SOBRE AS ARTES E OS OFÍCIOS
A agricultura seria o ofício comum a todos os cidadãos, sendo que, dele, ninguém poderia ficar isento. Por meio de teoria na escola e prática nos campos vizinhos, as crianças se familiarizariam com o trabalho agrícola e, ainda, desenvolveriam suas forças.
Além da agricultura, cada cidadão aprende outro ofício: os principais seriam o de tecelão, o de pedreiro ou oleiro, e o de artesão de madeira e metal. As mulheres, por serem mais fracas, trabalhariam a lã e o linho, aos homens caberiam os ofícios mais penosos.
Tradicionalmente, as pessoas se especializam na profissão de seus pais, mas podem mudar de área, mudando, para tanto, de família. Em caso de possuir um número maior de profissões, o utopiano pode exercer a que for de seu agrado, desde que o Estado não lhe designe uma delas por conta de utilidade pública.


SOBRE O DIA DE TRABALHO
O dia em Utopia é dividido em vinte e quatro horas iguais, diferindo do horário adotado na Europa da época por que contam uma hora onde o velho continente assinala meio-dia. Antes do meio-dia, eles trabalham por três horas, depois do que, almoçam e repousam por outras duas, só então voltando ao trabalho material. Após a janta, têm tempo livre para se dedicarem ao lazer, mas não se entregariam ao ócio e à preguiça, antes, descansariam variando suas ocupações.
Conforme explica Hitlodeu, o trabalho não massacra o utopiano porque, além de todos o exercerem, ele é direcionado para a obtenção daquilo que a sociedade realmente necessita, sobrando tempo, então, para o aprendizado intelectual das artes e do que incrementa o espírito. Assim sendo, seis horas diárias são suficientes para produzirem em abundância para as necessidades e comodidades do povo e ainda fazem o excedente comercializado .
Divertem-se compondo música ou conversando e ainda praticando jogos pedagógicos, como a batalha aritmética ou o combate entre os vícios e as virtudes, já que desconhecem o baralho e outros jogos de azar, reputados por Rafael como “estúpidos e perigosos”. Ele cita o trabalho bem executado como outro fator de diminuição das obrigações, uma vez que algo benfeito demanda menos reparo, além de que, uma vez que não existe a propriedade privada, não existem herdeiros, ou melhor, se todos herdam, todos zelam.
Quando existe um acúmulo dos produtos, as massas de trabalhadores cessam seu ofício e se encarregam da reparação de estrada. Na falta desta ocupação, as horas de trabalho são diminuídas, uma vez não seria objetivo de o Estado fatigar inutilmente seus cidadãos.
Rafael alega que existem pessoas em idade de trabalho isentas dele por lei, mas que o número é muito baixo. Entre eles, estariam também os sifograntes, que abdicam deste direito para dar o exemplo aos demais. Os jovens, destinados pelo povo, também possuem tal privilégio e se desapontam as esperanças públicas são remetidos à classe operária. Assim como da classe operária pode ascender um indivíduo que mostre aptidão às letras .
Para os diversos cargos públicos, são escolhidos cidadãos letrados. E a felicidade dar-se-ia pelo desenvolvimento completo, que englobaria o estudo das ciências e das letras.
Antes de o sol nascer, abrir-se-iam os cursos públicos voltados às letras, mas, embora todos pudessem deles participar, somente os que exercessem cargos a elas ligados estariam obrigados à frequência. Segundo, Rafael, as salas ficam cheias.

RELAÇÕES ENTRE OS CIDADÃOS
À mulher, é dado um marido com o qual ela vai morar. Os homens advindos do matrimônio não deixam suas famílias. O chefe é o membro mais antigo da família e em caso de alguma debilidade, sucede-lhe o segundo mais velho. Cada cidade é composta por seis mil famílias . O número de homens em idade de puberdade é limitado a dezesseis. As mulheres servem a seus maridos, as crianças, a seus pais, e os mais jovens, aos mais velhos.
Quando uma família torna-se muito numerosa, o excedente era colocado em famílias com menor número de pessoas. Caso isso ocorresse com a ilha toda, seria decretada emigração geral. Como explica Rafael, os emigrantes fundariam uma colônia no continente mais próximo, “onde os indígenas dispõem de mais terrenos do que cultivam ”. Neste espaço a ser colonizado por eles, chamariam os nativos a formarem juntos uma mesma comunidade social, porque “esta união é benéfica a todos ”. Se houvesse um decréscimo populacional em Utopia, seus cidadãos que viviam no exterior seriam convocados a repovoar a ilha.

O pai de família vai ao mercado e retira de lá o que necessita para prover a si e aos seus. A certeza de que ninguém retiraria mais do que realmente precisasse vem da abundância na qual os utopianos vivem. Uma vez que o indivíduo é ciente de que nada lhe faltará, a busca pelo acúmulo se torna desnecessária. O outro motivo para a acumulação seria o orgulho de ser mais opulento do que os demais, mas na Utopia, tal situação também seria debelada pelas instituições.
Os provedores se reúnem no mercado em uma determinada hora, sendo atendidos primeiro os responsáveis pelo abastecimento dos hospitais e, em seguida, os víveres são distribuídos entre os refeitórios, sem distinção de qualidade, levando-se em consideração a proporção numérica entre existente entre eles. Ao indivíduo em particular é permitido que fosse ao mercado retirar alimentos para preparar sua própria comida, mas somente após o abastecimento de todos os refeitórios públicos. E poucos são aqueles que optariam por tal.

ALMOÇO E CEIA NAS CIDADES UTOPIANAS
Nos refeitórios públicos, são servidos ao mesmo tempo o príncipe, o pontífice, os traníboras, os embaixadores, e, quando há, os estrangeiros. Todos se sentam às mesas, são três no total.
As posições na mesa se alternam, propositalmente, entre dois jovens e dois idosos para que a gravidade e o respeito que a velhice inspira contenha a petulância dos jovens.
Os homens do lado da parede, deixando as mulheres à sua frente para que, em caso de mal-estar, possam ser retiradas sem incomodar ninguém. As mulheres que amamentam são colocadas em salas especiais, aquecidas e com água limpa e berços.
A mesa é servida por meninos e meninas que se encontram na faixa de idade compreendida entre a puberdade e o casamento. As melhores porções de alimentos são destinadas aos velhos das famílias que ocupam lugar de destaque na sociedade, tudo mais é repartido em igualdade perfeita . Os favorecidos idosos, por sua vez, repartem-na entre os demais na mesa, retribuindo a homenagem.
Antes de comer, é efetuada uma breve leitura de um livro de moral, e, ao término, iniciam-se conversas nas quais os velhos analisam a personalidade dos jovens.
O almoço, por ser seguido pelo trabalho, dá-se mais rapidamente que a ceia. Esta é regada a música e procedida por sobremesa.
Na Zona Rural, devido à distância existente entre os moradores, cada família realiza a refeição em sua própria casa; como ocorre nas cidades, sem que nada lhes falte.

SOBRE A GUERRA, OS ESCRAVOS E OS DOENTES
O ofício de carniceiro, que tem por obrigações o abate, a limpeza e o retalhamento dos animais que são consumidos, não é facultado aos cidadãos para que estes não percam o sentimento de humanidade com o exercício da matança. Tal trabalho fica a cargo, então, dos escravos . Nos refeitórios, os trabalhos mais sujos e penosos da cozinha são obrigações dos escravos.
Assim como ocorreria com os matadouros, os hospitais também são situados além dos muros da cidade. Estes são descritos como espaçosos e munidos do todo necessário para o pronto reestabelecimento das pessoas afetadas por doenças. O utopiano doente não seria obrigado a ir para a enfermaria pública, mas poucos prefeririam se tratrar em casa em face dos cuidados recebidos naquela.
A guerra é tida pelos utopianos como uma atividade animalesca, e, portanto, que deve ser evitada a todo custo. Os cidadãos de Utopia, diferentemente das outras nações da época, não buscam a glória no campo de batalha. Isto não inibe a prática da disciplina militar, inclusive para as mulheres, com o objetivo de todos estarem prontos se o combate for inevitável.
Nem todo prisioneiro de guerra é tomado como escravo, tal destino é reservado para aqueles que são apanhados com armas nas mãos. Outro modo de aquisição de escravos no estrangeiro seria a compra de pessoas condenadas à morte, conseguindo-os a preços baixos ou até mesmo de graça.
Em contrapartida, aquele que era escravo em seu país recebe a liberdade e uma nova chance assim que toca o solo da ilha.

SOBRE AS AUTORIZAÇÕES PARA SE VIAJAR
Para que possam viajar entre as cidades, os utopianos precisam de uma autorização que, se não houver um empecilho maior, é facilmente dada pelos traníboras. Esta autorização é expressa por meio de uma carta na qual consta o dia de regresso. Apesar de ser fornecido ao grupo de viajantes uma carruagem e um escravo, normalmente ele os dispensa não se munindo de quase nada, uma vez que tudo lhe seria provido por onde passasse, como se estivesse em casa.
Se o viajante permanecer mais de um dia em uma cidade, tem o dever de trabalhar exercendo sua profissão no local.

SOBRE A POSSIBILIDADE DO ÓCIO
A organização social tornaria impossíveis a ociosidade e a preguiça pois, cada um, continuamente exposto ao olhar de todos, sente-se feliz em trabalhar e repousar, não havendo, então, tabernas, casas de prostituição, lugares propícios às assembleias secretas.

CARACTERÍSTICAS ECONÔMICAS
As Estatísticas Econômicas são estudadas nas primeiras sessões do Congresso, em Amarouta. Uma vez percebido a carência de uma cidade e a abundância de outra, a última vem em socorro espontâneo da primeira, recuperando o equilíbrio, fazendo da ilha uma grande família.
A Ilha é abastecida por dois anos, precavendo-se perante a possibilidade de uma má colheita. Pratica-se o comércio externo a colocando-se um preço moderado nos itens que se exporta. A sétima parte de tudo o que é vendido é doada aos pobres do país com o qual se faz a transação.
Com este comércio, Utopia importa aquilo que não produz, além de se enriquecer. Tal riqueza é utilizada no empréstimo a uma nação vizinha ou no pagamento de tropas mercenárias por advento de uma guerra: o governo de Utopia preferiria expor à morte os estrangeiros a seus próprios cidadãos.
Os utopianos não venerariam o dinheiro como fazem outros povos. O ouro e a prata não teriam maior valor do que o ferro, por exemplo, que lhe é muito mais útil . A personagem Rafael explica que somente a loucura humana poderia depositar tanto valor a um objeto devido, apenas, à sua raridade. Diz, ainda, que a raridade do ouro e da prata se devia à sabedoria da Natureza que escondera na profundeza metais de tão baixa importância para o homem, deixando à superfície aquilo que lhe é mais útil, como a água, a terra, o ar.
Segundo explica Rafael, com o ouro e a prata, os utopianos não fazem nada que possua valor de uso, porque, em caso de necessidade de seu uso, traria prejuízo ter que fundir os objetos valorosos. Sendo assim, os cidadãos de Utopia, comiam e bebiam em pratos e vasos de louça e barro, enquanto o ouro e a prata eram deixados para fazerem pinicos e correntes para prenderem os escravos, além de adereços, como argolas, anéis e colares, que identificavam os que haviam cometido crimes infames .
Enquanto a posse de pérolas e pedras preciosas representa posição social privilegiada na maioria dos países à época em que fora escrita a obra, em Utopia, elas também tinham serventia: eram usadas pelas crianças como brinquedo pela beleza inútil que trazem consigo. Ao crescerem, as crianças, conforme adquirem maturidade e percepção daquilo que é realmente possuidor de valor, abandonam o uso das pedras. Em uma passagem comentada por Rafael, os utopianos se espantam ao receberem uma comitiva de um país vizinho, Anemólia, onde seus integrantes, dotados dos valores ocidentais, revestem-se de artigos de ouro, prata e pedras preciosas: indagam-se como poderiam os representantes da citada nação apresentar-se utilizando objetos destinados a escravos e crianças!

SOBRE A EDUCAÇÃO
Existe um pequeno número de pessoas que é dispensado dos trabalhos materiais, dedicando-se exclusivamente à cultura do espírito. Rafael explica que se tratam daqueles que, quando pequenos, demonstram “aptidões raras, um gênio penetrante, vocação científica ”. Ele afirma que, do mesmo modo que um trabalhador braçal pode ascender a um trabalho intelectual se demonstrar vontade e habilidade, aquele a quem, inicialmente, fora permitido abster-se das obrigações materiais, poderá ter que lidar com elas caso decepcione a sociedade em suas funções de origem.
Apesar haver esse pequeno número de pessoas, acima relatado, todos os cidadão de Utopia receberiam uma educação liberal, e, tanto homens com mulheres, dedicam seu momentos de repouso e liberdade para os trabalhos intelectuais.
Segundo Rafael, os utopianos aprendem a ciência em sua própria língua, e nos campos da música, aritmética, geometria e dialética, haviam feito descobertas similares aos europeus; conheceriam modestamente a meteorologia e os fenômenos resultantes do movimento dos astros e sua cosmologia; no terreno específico da dialética, seriam bastante inferiores aos filósofos modernos do velho continente . Rafael, durante sua estadia na ilha, teria deixado alguns volumes de determinados pensadores ocidentais.
Sobre a Filosofia, explica-nos Hitlodeu, que seus sistemas cosmológicos assemelham-se aos dos antigos gregos, enquanto que, no campo da Moral, suas dúvidas coincidem com as dos ocidentais: existência da alma; busca pela felicidade; aplicação do conceito Bem para os elementos que suscitam felicidade material e intelectual, ou se só caberia ao que desenvolve as faculdades do espírito; discutem sobre virtude e prazer, entre outros.
Em suas discussões sobre o Bem e o Mal, partem de premissas obtidas na religião ou na Filosofia por terem medo de edificarem o raciocínio em bases falhas, concebendo, assim, falsas teorias.
Possuem dogmas religiosos, mas acreditam que a razão pode induzir, por si mesma, à suas conclusões.
São favoráveis à obtenção de prazeres, mas a volúpia – entendida como todo deleite natural proveniente do movimento ou do estado da alma ou do corpo - a que pleiteiam seria aquela a qual não se sucederiam por dores maiores do que a alegria proporcionada. Não seria toda espécie de voluptuosidade que traria a felicidade, mas, somente, aquela pautada em prazeres bons e honestos, e nisso constituiria a própria felicidade. Virtude, para os utopianos, seria viver em conformidade com a Natureza. Sabedoria seria buscar a felicidade sem violar as leis. A religião seria trabalhar pelo bem geral, praticando ações justas, que se constituiriam em “calcar aos pés a felicidade de outrem, em busca da sua” . Sacrificando-se por outro, privando-se de algum prazer em nome de outro, estar-se-ia mostrando um coração nobre: esta boa ação receberia a reciprocidade como consequência e a consciência do ato benéfico praticado agradaria à própria alma de uma maneira ainda maior do que o faria o prazer do qual se abrira mão.
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jorge.luiz.589 28/11/2015

Loucura não ler!
Entre todos livros, todos os estilos literários este é um dos meus preferidos. Já li e reli e tenho vontade de ler de novo!
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