Minha Velha Estante 10/03/2021Rose Tremain nos leva à Suíça, inicialmente no período pós Segunda Guerra Mundial pelos olhos de Gustav, garotinho órfão de pai, que vive com a mãe uma vida de privações e seu único brinquedo: um trenzinho de ferro através do qual ele mantém amizade com os seus passageiros imaginários. A única coisa que ele sabe sobre o falecido pai é que, segundo a mãe, ele foi um herói.
“Ele foi um herói, Emilie lhe lembrava todo ano. Eu não entendi no começo, mas ele foi um bom homem em um mundo horrível.”
Gustav é um garoto solitário, se sente esquecido pela mãe que mal olha para ele e sequer tem um gesto de carinho, não tinha amigos na escola até o dia em que ajuda Anton, aluno novo, a enfrentar os seus medos. Filho de um banqueiro judeu que sobreviveu aos horrores da guerra, Anton e Gustav vão protagonizar, por toda a vida, a amizade mais improvável do ponto de vista de um adulto.
Dividido em três partes, o livro dá saltos através da história. A primeira parte é quase uma apresentação dos personagens, suas histórias e entrelaçamentos. O meio conta o passado e nos dá várias respostas para o que aconteceu na primeira parte. E a última parte traz o desfecho da vidas dos nossos protagonistas.
Na segunda parte da história conhecemos o ato de heroísmo do pai de Gustav condenado pela famosa neutralidade suíça. Por outro lado, ele também será responsável pela eterna amargura de Emilie e sua falta de amor em relação a Gustav.
Na terceira e última parte vamos encontrar Gustav e Anton já jovens senhores, lidando com o que os moldou no passado, tendo que lidar com as consequências de suas escolhas e vivendo suas realizações.
Acompanhar esses dois personagens dos 6 aos 60 anos nos faz vivenciar uma ambiguidade de sentimentos entre duas pessoas tão diferentes: de um lado Gustav, acostumado a solidão e a escassez de afeto, ensinado a não demonstrar sentimentos e ser sempre neutro. Do outro lado, Anton, intenso, febril, sempre teve amor, mas é ressentido, apesar de se entregar a qualquer emoção.
A história flui e prende o leitor desde o começo mesmo trazendo temas tão pesados quando os horrores da guerra, a fome, a solidão, a descrença em um futuro melhor e a falta de esperança. Te faz rir, faz chorar, alegra e entristece na mesma medida. E termina com uma pergunta principal: o que leva alguém a escolher o caminho da neutralidade, seja ela no amor, na amizade ou em qualquer área da vida?
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