Gabriel 19/10/2021
Se em Ensaios de Patrício Casanova Nathália nos apresenta um interessante pós-vida e suas dificuldades, a novela Um Expresso e Começo de Tudo tem como as principais preocupações traçar uma divertida viagem por uma inusitada cena do cotidiano.
Desempregada há meses, Helena não acredita que será chamada após uma entrevista de emprego, embora sua amiga com quem divide o apartamento, Gabriela, tem certeza de que o emprego já é dela. E, aproveitando o momento de drama da amiga, Gabriela aposta que, caso ela consiga a vaga, Helena terá que provar sete tipos diferentes de café. Parece uma proposta inofensiva, a não ser por um probleminha: Helena odeia café!
Como era de se esperar, ela consegue o emprego, e em meio à imensa felicidade de finalmente poder pagar as contas, literalmente Helena agora tem de lidar com o amargo da derrota. É na cafeteria Dulce Café, onde a maior parte das cenas se desenvolve, que Helena conhece Mafe, a atendente, e PH, o barista que está disposto a ir às últimas consequências para que a difícil cliente finalmente admita que pelo menos uma de suas preparações a agrada.
Helena se vê participando de um jogo difícil. Nos primeiros dias, tem a sensação de que está passando por uma tortura, mas, aos poucos, conhece novas formas de consumir a tão repudiada bebida. Mas, aos poucos, começa a perceber que os momentos no Dulce Café, a despeito do amargor do grão, podem se revelar na verdade bastante doce — principalmente vindo das mãos de PH.
De forma descontraída, Nathália nos apresenta um romance que se desenvolve aos pouquinhos, de golinho em golinho, criando sempre uma deliciosa sensação de quero mais para descobrir o que vem no próximo capítulo. Num primeiro momento, a relutância, que aos poucos e de maneira muito plausível se torna apreciação, conforme as personagens se tornam mais próximas.
O que mais me agradou na obra, com certeza, foi a representatividade LGBTQIA+ que se apresenta de forma muito natural e informativa, sem cair no problema de ser didática demais, de um jeito que a autora sabe desenvolver com muita segurança por meio dos pensamentos de Helena, entre os quais perpassamos pelas inseguranças, dificuldades e felicidades que ser bissexual representa na sociedade, e que nos leva a refletir, através da jornada de autodescobrimento da protagonista, que a sexualidade é apenas um traço minúsculo de nossas vidas, que pode ser tão doce e saborosa quanto um café mocha se nos permitirmos arriscar a conhecer novas possibilidades.