Lodir 16/02/2011Um livro que beira a perfeição John Boyne é um escritor curioso. Quando li “O Menino do Pijama Listrado”, eu adorei. Quando parti para o segundo livro de Boyne em português, “O Garoto no Convés”, ele logo se tornou um dos melhores livros que li. A expectativa para esse livro então era grande. Confesso que a sinopse não me agradou tanto, pois a história não parecia tão interessante quanto as anteriores. Para a minha surpresa, esse livro não só não decepcionou, como conseguiu superar o anterior e ser ainda melhor.
A história desse livro e a de “O Garoto no Convés” são semelhanças. Ambos os livros são romances históricos ambientados em acontecimentos reais que marcaram o mundo. Ainda assim, os livros trazem protagonistas fictícios convivendo com personagens que realmente existiram. Esses protagonistas são garotos adolescentes que enfrentam grandes desafios e amadurecem rapidamente, sempre depois de algum incidente que os joga em uma nova vida.
No entanto, não é nada disso que faz John Boyne um dos melhores escritores dos últimos tempos. A magia de seus livros resumisse a uma única palavra, da qual ele entende muito bem – narrativa. Boyne sabe narrar como ninguém. Sua narração é contagiante, envolvente e suave. A descrição dos personagens, suas emoções e seus movimentos é sempre feita de maneira única, como nenhum outro escritor que já li conseguiu fazer. Leva o leitor pela história e, falando sempre em primeira pessoa, o conduz junto com o protagonista. A leitura corre tão fácil que é difícil largar o livro e, no meu caso, torna-se normal atravessar noites adentro vencendo o sono e o cansaço em busca dos próximos acontecimentos.
Tudo isso eu já havia percebido nos dois primeiros livros de Boyne. O diferencial de “O Palácio de Inverno” é que a narração acontece divida em duas fases. Primeiro vemos o jovem Geórgui em sua adolescência, deixando sua origem para torna-se guarda imperial da família real russa no começo do século XX. Na segunda narrativa, a vida do mesmo personagem é mostrada, mas agora com ele já adulto, em uma cronologia decrescente. Ele está com oitenta anos, mas cada próximo capítulo mostra o que aconteceu nas décadas anteriores. Dessa forma, temos uma narrativa duplicada sobre a mesma história, que acabam se encontram no final do livro, em um desfecho surpreendente – em todo o sentido real da palavra. Esse final me deixou boquiaberto e sem entender como não percebi o óbvio antes. Essa forma de narração funciona muito bem, e nos faz curioso enquanto acompanhamos momentos tão distantes da vida de um mesmo personagem, tentando descobrir como as coisas se tornaram como se tornaram e tentando entender a ligação de certos pontos em si.
Acredito que não é necessário abordar muito da trama aqui. Basta dizer que Boyne tornou um romance histórico – que geralmente são chatos – em algo extremamente leve e divertido. Prepare-se para viver os palácios russos dos tempos imperiais. Há romance no livro – e daqueles em que o amor é impossível. O final, contudo, é o melhor da obra. Os personagens vão mesmo continuar na cabeça do leitor após a última página.
Nas minhas resenhas, eu costumo apontar os pontos fracos até mesmo daqueles livros que gostei. Não é algo que consiga fazer com “O Palácio de Inverno”, simplesmente porque não consigo encontrar qualquer um que seja. A trama é interessante, os personagens bem construídos, a narrativa é excelente, a linguagem é culta e a tradução para o português é bem feita. Se há livros que conseguem beirar a perfeição, eu, como leitor, apontaria os de John Boyne.
Recomendo esse livro a todos, mas principalmente a quem aprecia uma literatura bem construída. Para quem é escritor, John Boyne é uma excelente aula. Ler seus livros atentamente – sempre com atenção na forma como ele escreve – será uma ótima oportunidade de aprender com um mestre.