Calote

Calote Leonardo Valente




Resenhas - Calote


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Krishnamurti 27/02/2021

O calote geral na ilha da fantasia
Há coisa de uns duzentos anos atrás, época que passou à história como o Iluminismo, o ser humano andou acreditando que a época das “Luzes”, se configuraria não tanto como um compacto sistema de doutrinas, mas como um movimento em cujas bases estaria a confiança na razão humana, cujo desenvolvimento seria a condição de progresso para a humanidade e de libertação dos vínculos cegos e absurdos da tradição, das raízes da ignorância, da superstição, do mito e da opressão. A partir de então, os textos ficcionais que passaram à história como utopias, buscavam uma emancipação efetiva ao visualizar um mundo baseado em ideias novas. Sua confiança no futuro era o fundamento normativo que lhes garantia eficácia ideológica.

O tempo passou e, em suas marchas e contramarchas, avanços e recuos monumentais, a humanidade chega afinal à decretar o fim da história. O individualismo burguês atinge seu ápice numa ruptura entre as esferas da vida pública e privada e sob a égide de um discurso silenciador, o homem termina sendo visto como um terrível incorrigível. De forma que também em ficção, aquela forma de vida considerada perfeita, ou pelo menos superior, deu lugar às distopias que delimitam o desvio, a deturpação de um quadro de vida conhecido. Geralmente, são obras que se caracterizam pela existência de totalitarismos, autoritarismos e opressivos controles econômico-sociais. Uma sociedade oposta à utópica portanto. E ainda mais negativa, porque o Estado normalmente é corrupto, as normas que visam ao bem comum são flexíveis e a tecnologia é utilizada como ferramenta de controle, seja dos indivíduos, do Estado ou de corporações.

O fato é que a razão e o conhecimento científico (tão caros às utopias passadas), perderam sua legitimidade em função da não concretização das promessas do projeto iluminista. E estamos á braços com o pós-modernismo e sua descrença em um projeto histórico específico para o homem que o mobilize em termos da ação política, e que nos faz desconsiderar quaisquer ideais a serem realizados no futuro, encerrando-nos compulsoriamente no imediatismo do presente, no consumo do efêmero e, quando muito, em lutas políticas de ocasião ao sabor de interesses pontuais.

As utopias negativas expressam o sentimento de impotência e desesperança do homem pós-moderno perdido num labirinto em que a tal da racionalidade converteu-se em instrumento: em vez de ser a condição de realização daquela promessa pensada há séculos, passou a ser fim em si mesma, e de conluio com uma barbárie cada vez mais presente no tecido social. O que hoje parece ser a nossa cruel realidade, inclusive em termos ficcionais, é que o próprio conceito de “utopia” atrofiou-se a tal ponto, que passa a denotar a impossibilidade de qualquer transformação social mais radical. Colocar o futuro no registro simples do piorável, pode dar margem a meras apologias da decadência. Seria assumir definitivamente um vácuo existencial de sequer pensarmos projetos futuros.

O romance “Calote” do escritor Leonardo Valente, publicado no final do fatídico ano de 2020, apresenta elementos que poderiam classifica-lo como uma distopia. Segundo a sinopse da editora, lemos que houve aqui e agora e, no Brasil, uma revolução. Entretanto, nem uma pedra fora lançada, nem uma única vitrine quebrada, sequer uma passeata foi vista. A distopia, se caracterizaria como tal, tendo em vista o inusitado de uma situação. Um boicote geral aos pagamentos das contas por parte da população, supostamente indignada ante a escorcha violenta de quem vende “créditos”. Apenas os boletos, de repente, ficaram em aberto. Da noite para o dia, silenciosa e misteriosamente, a população parou de pagar suas contas, e o sistema liberal cruel e individualista começa a ruir.

Promete esta ficção uma revolução em nossa maneira de pensar quanto a contrair e saldar dívidas, sem dúvida, no entanto a caracterização da natureza distópica da narrativa não se concretiza. O máximo que o texto rende nesse sentido são vagas referências a acontecimentos que se já não ocorreram, ou não foram ainda reconhecidos como verdades, por razões óbvias, não chegam a causar grandes perplexidades. “As massas perderam sua identidade na cerimônia de coroação do Mercado como o novo Soberano de são Paulo, a mais nova cidade-feudo obediente ao liberalismo radical”, o Mercado derrubou o empoeirado e já sem credibilidade Estado, a maior cidade do país passou a ter um gerente no lugar de um prefeito, e um conselho de acionistas onde uma vez figurou uma Câmara Municipal (só está faltando em verdade isto hoje). A novidade imaginativa fica mesmo por conta de a Avenida Paulista ter uma via só para as elites, que pagam por essa mordomia, uma pista na qual só circulam os ricos e seus carrões monumentais.

E a trama narrativa se desenrola desde o prefácio assinado por “Uma personagem endividada”, que não se identifica claramente, mas intuímos tratar-se de Marlene Scheidt, uma mulher da típica classe média baixa, que passa toda a primeira parte do romance – 60 páginas – a relatar sua vida de viúva e mãe de dois filhos menores. Como acabou se deixando levar pelo “canto de sereia” dos cartões de crédito e como uma bola de neve, sua dívida chegou à astronômicos R$ 22.333,52. E detalhe; o valor mínimo a pagar na fatura do mês, refletia um valor maior do que ela recebia como pagamento de salário. Não, Marlene não era irresponsável e esbanjava em compras de supérfluos, apenas deixou-se perder pelas acrobacias que todos nós fazemos para sobreviver em um país como o Brasil. O drama de Marlene se acentua porque o proprietário do apartamento em que ela vive resolve justamente nesse momento pedir que desocupe o imóvel. A “única” diversão que os filhos têm, a televisão, resolve queimar, pivetes de rua roubam os celulares dos filhos, tudo na mesma época. Um desastre, uma hecatombe para ela (à propósito desse termo, observamos na obra uma linguagem carregada de ironia e superlativismos. “extermínio”, “trágico”, “destruição total”, “hecatombe”, “desfechos funestos”). Marlene chega ao fim do poço, sem saber o que fazer e, em uma noite de completo desespero, ao buscar uma tábua de salvação qualquer, lembra-se de David Scheidt, filho de seu ex-marido morto, e irmão de seus dois filhos menores. Um verdadeiro vampirinho do mercado financeiro, sujeito neurótico que vive exclusivamente para o trabalho, e para ganhar cada vez mais e mais dinheiro. Até para trepar o sujeito é calculista (amor é produto inexistente em uma sociedade assim). O homem é gerente de um banco, e inventou lá um tal programa para controlar débitos e sobretudo contas a pagar de toda a população.

É nesta conjunção de conflitos terríveis que acontece o “dia da insubordinação civil”, e o tal calote geral. O desacerto dos acontecimentos leva a uma espiral de tensão. Marlene a tentar contato com David para pedir alguma ajuda financeira, e este imerso em uma pressão terrível dos seus superiores, para desvendar causas, ou cabeças, ou implicados, ou o que seja que está levando a esse comportamento dos devedores. De um lado o representante da meritocracia e dos privilégios; de outro a vítima da extorsão histórica que atingia a quase todos e, a partir de então, supostamente, uma combatente das novas e inusitadas trincheiras da resistência. Assim segue a segunda parte da obra que alterna capítulos entre “A fatura de Marlene Scheidt” e a “o dia da insubordinação civil”, até um desfecho surpreendente que passa por uma completa inversão de papéis. Milagrosamente o maldito cartão de Crédito de Marlene, graças à uma ‘anistia econômica’, se transforma em varinha de condão a abrir todas as portas do consumo, ao passo que David, embarca em uma viagem sem volta rumo à miséria econômica e social. Invertem-se os papeis. Mas seria um erro pensar que a oprimida de antes transforma-se em um ser consciente que tenta trilhar outros caminhos mais humanos. Não, busca a todo custo adotar o padrão de vida das classes privilegiadas, assume a máscara de pessoa de classe média alta, consumindo o que não tem, e vivendo em um mundo de aparências. Esse desenrolar nos faz lembrar do pensador alemão Peter Sloterdijk, que cunhou a expressão niilismo pós-moderno e que abriga um tipo de homem que renuncia à continuidade por meio da procriação e da transmissão de heranças culturais, em nome de seus próprios privilégios, numa espiral de egoísmo e autossatisfação. Não há em todo o romance qualquer registro sobre afetos, amores, amizades sinceras ou afeições entre aquelas tristes criaturas, todas feitas de puro cálculo do que pode o todo poderoso dinheiro. Até o amor maternal que Marlene devota aos filhos Hélio e Ricardinho é todo calcado no que ela pode ou não comprar ou proporcionar aos pequenos, tais como aparelhos celulares de última geração, vídeo games, assistir desfiles de escolas de samba na Marquês de Sapucaí ou finalmente, leva-los àquele famoso parque de diversões daqui mesmo da Bruzundanga, o Hopi Hari.

Lembramos que obras ficcionais classificadas como utopias ou distopias são, por força, tendencialmente fantasistas, radicam numa realidade que é variável, em função do ponto de partida de cada nova criação, e que figuram em uma linha de um futuro mais ou menos próximo. Difícil enquadrar “Calote” como uma distopia na acepção comumente conhecida. Pensamos que talvez se possa afirmar tratar-se, de uma distopia paródica (paródica aqui entendida, frise-se, como obra literária, com tom fortemente jocoso e satírico).

Edson Santos de Oliveira- da (EBAP-UFMG), escreveu um verdadeiro ensaio sobre o romance a que deu o título de “Elementos irônicos em Calote, de Leonardo Valente”. A certa altura ele bem caracteriza o tempo histórico da obra: “O tempo histórico do romance é o século XXI, começo de 2020, período da pandemia, momento marcado por uma economia instável, com quebradeiras de empresas, sistema de saúde sem condições de atender a demanda, desemprego crescente (mais de 14 milhões), instabilidade financeira e política provocadas por uma administração pública negligente. Numa política globalizada e neoliberal, o Estado perde sua autonomia, tornando-se incapaz de manter a dignidade do viver e as condições mínimas de cidadania, deixando a população à mercê do mercado. Os sindicatos foram desmantelados e as universidades, despolitizadas. As camadas da classe média e baixa ficaram a ver navios e os operários do baixo proletariado passaram a viver de migalhas do poder público através de auxílios emergenciais.”

Não resta dúvida de que a obra fornece elementos para pensarmos criticamente nossa contemporaneidade, na medida em que estimulam o senso crítico do leitor e servem como espaço de reflexão por representar causas e consequências de certos conflitos dentro da perspectiva macro em que o país vai afundando. Com efeito o enfoque dado leva-nos a enveredar por perspectivas focadas em outras questões que poderiam ter sido exploradas na trama romanesca. Questões que ultrapassam em muito os embates entre o Mercado (essa tremenda cachorrada inventada pelo capitalismo para ocultar, dentre outras coisas, as verdadeiras faces dos exploradores), suas taxas de juros extorsivas e, de outro lado os consumidores. Temos inegáveis e imensos déficits sociais que somente o dinheiro não teria condições de suprimir. Inclua-se o desemprego sistêmico, o subemprego sempre aceito como normal desde o tempo da escravidão, o tal racismo estrutural sempre negado, as superpopulações que entopem os entornos de todas as capitais brasileiras em ocupações desordenadas que ensejam a vigência de estados paralelos baseados em toda prática de terror, o nosso completo e histórico descaso pela educação de base, o altíssimo índice de analfabetismo no país e, infelizmente, essa mentalidade estúpida do farinha pouca meu pirão primeiro, sempre estimulada pela men-ta-li-da-de corrente.

Todo esse desarranjo nos levar a refletir na urgente necessidade de que surja um pensamento revolucionário através do qual, se não transforme a atualidade, prepare potencialmente um “tempo de agora” ao subjetivar os indivíduos como entidades desejantes de profundas transformações sociais e não meros objetos ou autômatos. Mas isto, nos faz retornar com mais vigor ainda ao já escrito. Não poderá jamais ocorrer nesse estado terrível de divisão antagônica em que vivemos (35 partidos políticos que se afiguram mais como escolas de samba com suas preferências de cores e enredos exclusivistas). Não poderá ocorrer sem que surja afinal, alguma simpatia pela espécie humana e sobretudo, sem um sentido do coletivo. Há uma epígrafe da autoria de José Saramago, que abre uma das partes do romance. Afirma: “A única maneira de liquidar o dragão é cortar- lhe a cabeça, aparar-lhe as unhas não serve de nada”. Francamente; não é preciso grandes exercícios intelectuais para percebermos nitidamente que estamos com os dois pezinhos na areia movediça e, nem mesmo o mal cheiro adicional de um calote generalizado pode modificar sensivelmente a situação dessa imensa ilha da fantasia em que o Brasil se eterniza.

Livro: “Calote” – Romance de Leonardo Valente 1ª edição – 2020, Editora Mondrongo – Itabuna/BA – – 179 p. – ISBN: 978-65-86124-15-6
Contatos para compra e pronta entrega: https://www.editoramondrongo.store/produto/199900/calote
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vicki4you 02/03/2021minha estante
Olá ,
como você está? Meu nome é Srta. Vicki Dickson, vi seu perfil hoje e me interessei por você, quero que envie um e-mail para meu endereço de e-mail privado (vdickson200@gmail.com) porque tenho um assunto importante que quero compartilhar com você




Alexandre Kovacs / Mundo de K 20/01/2021

Leonardo Valente - Calote
Editora Mondrongo - 180 Páginas - Capa: Cláudio Duarte - Lançamento: 2020.

No mais recente romance de Leonardo Valente, o Brasil se tornou uma espécie de distopia financeira e, por sinal, assustadoramente semelhante à situação na qual vivemos atualmente. Em um futuro próximo, imaginado por Leonardo, o Mercado toma de vez as rédeas da nação em nome de um liberalismo econômico extremo, formatado por um conceito de meritocracia injusto e assumindo as funções de um Estado falido, burocrático e corrupto. O capitalismo predatório prioriza a atividade financeira em detrimento da produtiva, direitos trabalhistas são flexibilizados ou cancelados, deixando a população assalariada refém dos juros extorsivos do cartão de crédito e excluída de qualquer possibilidade de ascensão social.

Neste contexto, o romance acompanha a trajetória de dois protagonistas que representam, cada um a seu modo, os extremos deste sistema. Marlene Scheidt é uma sobrevivente da classe média e tem acesso a cada vez menos privilégios, viúva com dois filhos pequenos, trabalha em uma loja de departamentos na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, desesperada com as dívidas exponenciais no cartão de crédito que já não consegue pagar e prestes a não ter onde morar. Já David Scheidt, jamais deixou de pagar o valor total de seu cartão de crédito black sem limite pré-estabelecido, um defensor do mercado financeiro, diretor de um banco especializado em investimentos na Avenida Paulistra que venceu uma concorrência aberta para criar uma lista nacional centralizada de controle de pagamentos, dívidas em atraso e inadimplentes.

"São Paulo viu fechar quase tudo o que um dia foi chamado de público, e o que sobrou virou comércio honrado, empreendimento inovador ou contrato arrojado. O verde do maior parque da cidade passou a cobrar de seus habitantes a sua visita, em nem um só banheiro de toda a metrópole deixou de ter uma máquina de cartões de crédito e débito em sua entrada. Até as praças ganharam seus planos de negócios e seus executivos estressados com o balanço, não o de brinquedo, mas aquele que deveriam apresentar ao final de cada ano para seus acionistas. As massas converteram-se em indivíduos e os cidadãos em clientes. (...) Um modelo, passaram a pregar os paulistanos mais entusiasmados, que se espalharia rapidamente pelo Brasil, ou pelo menos pela parte menos indolente dele. Uma cidade-empresa capaz de gerar lucro a seus acionistas só poderia ser um plano fadado ao sucesso e aos investimentos vultuosos dos estrangeiros, admirados e ávidos por participarem de tamanha empreitada." (pp. 64-5)

Um tênue laço familiar une os dois personagens, David é filho de Ricardo, de quem Marlene é viúva, mas ambos perderam o contato há algum tempo. O desespero de Marlene frente à inviabilidade de continuar rolando as dívidas no cartão de crédito, faz com que ela considere, depois de uma noite em claro, a vergonhosa alternativa de pedir auxílio financeiro a Ricardo, afinal ele é irmão de seus dois filhos por parte de pai. No entanto, no dia seguinte, ocorre no país o surpreendente dia da insubordinação civil, no qual a população das classes C, D e E, silenciosa e misteriosamente, para de pagar as suas contas, provocando a queda das ações na Bolsa e um verdadeiro terremoto no mercado financeiro.

Uma revolução silenciosa abala o país e o ultraliberal David Scheidt não consegue acreditar nos índices apresentados por sua equipe, esperando a confirmaçao de que se trata de um erro do sistema. Contudo, os dados estavam rigorosamente corretos e, naquele primeiro dia do Calote, ficou comprovado que o índice de pagamentos em aberto das classes C, D e E superava os 97%, enquanto nas classes A e B, ficava em menos de 8%. Considerando que a maioria esmagadora dos dados das contas vinha das classes mais pobres, não apenas por ser mais numerosa, mas porque também fazia mais dívidas, a situação era muito grave.

"Era um calote. Ficou claro quando David, que dessa vez acordou às seis da manhã sem despertador e sem ninguém ao seu lado, recebeu as primeiras parciais por telefone, às sete e cinco da manhã: 91,5% das contas com vencimento naquele dia, e que normalmente seriam pagas no período, estavam em aberto, sendo que nenhuma das contas em atraso do dia anterior havia sido quitada até aquele momento. Percebeu a gravidade da situação e, como todo diretor intermediário com muita arrogância e poder sobre os subordinados, mas nenhuma autonomia sobre o que realmente interessa, jogou a informação imediatamente para cima. Enviou mensagens para o presidente e para os acionistas com os primeiros indicadores, e recebeu como resposta a confirmação de uma entrevista coletiva às nove e meia, pouco antes dos mercados abrirem, e uma enorme lista de dados para enviar." (p.81)

O poderoso Mercado que sempre soube como manter o poder durante tantos anos, não estava preparado para uma revolução tão fora dos padrões e uma singela verdade que se anunciava: "De agora em diante, o devedor é o verdadeiro credor." Leonardo Valente conseguiu um feito curioso porque, ao final da leitura, ficamos na dúvida se o livro trata de uma distopia ou utopia, acho que isso vai depender do valor de sua dívida atual no cartão crédito, caro(a) leitor(a), mas, de qualquer forma, vale a pena conhecer e julgar por você mesmo(a).

"O Mercado e seus súditos se prepararam por anos para as ameaças externas, bloquearam suas fronteiras e ergueram um muro quase intransponível, combateram com vigor todas as reações, até eliminá-las pela fadiga. Absorveram tudo o que vinha de fora como ameaça, e converteram em produto rentável. Para não serem mais surpreendidos com sustos provocados pelos bárbaros e aventureiros, montaram vigília permanente em seus minaretes, de onde se via o exterior ao longe. Mas Calote veio de dentro, e sem precisar furar suas armaduras por debaixo dos paletós, passou a comer-lhes as carnes moles e duras. Poderosos no combate externo, mas incapazes de olhar para a própria pele, os defensores da ordem em xeque se desesperaram." (p. 133)

Sobre o autor: Leonardo Valente é escritor, jornalista, cientista político e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nascido em Niterói-RJ, em 1974, tem três romances publicados, cinco livros de ficção e três de não-ficção. Foi um dos vencedores do Prêmio José de Alencar 2017, da União Brasileira de Escritores, com um original ainda não publicado. Pela Mondrongo publicou Apoteose (Contos, 2018), O beijo da pombagira (Romance, 2019 - livro finalista do Prêmio Rio de Literatura, categoria novo autor fluminense) e organizou junto com Carol Proner a coletânea Antifascistas: contos, crônicas e poemas de resistência (2020).
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