Aione 17/12/2021Baixo Esplendor marca o retorno de Marçal Aquino aos romances adultos, após 16 anos de publicação do renomado Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios. Jornalista e roteirista, o autor assina diversos títulos policiais na coleção infanto-juvenil Vagalume, gênero que agora retoma, porém destinado a um público mais velho.
O livro se passa no início da década de 1970, durante um dos períodos mais violentos da Ditadura Militar. Traz a história de Miguel, policial que trabalha infiltrado e, não apenas desenvolve laços de amizade com os criminosos que investiga, como também se apaixona por Nádia, irmã de um deles.
Violência, paixão, sensualidade e ação se misturam em uma trama intensa, marcada por um forte apelo sinestésico, sobretudo visual, tátil e olfativo. A escrita de Marçal Aquino é direta, muitas vezes crua, que, muito habilmente, faz o leitor mergulhar no cenário do submundo do crime. Há, também, diversas menções e descrições relativas ao corpo, seus fluidos e cheiros, o que contribui para os aspectos sensoriais da obra; aliás, os aspectos de adrenalina, romance e brutalidade aparecem simbolizados nas três diferentes partes nomeadas da obra: Suor, Sêmen e Sangue. Também, da mesma maneira que violência e paixão aparecem misturadas em Baixo Esplendor, quase que indissociáveis, o mesmo ocorre com a narrativa em terceira pessoa e os diálogos, que, embora marcados por separação de parágrafos, não são sinalizados por aspas ou travessão. Há momentos, ainda, em que certa repetição de passagens simbolizam a característica circular dos eventos nos quais Miguel está envolvido.
Muito me chamou a atenção a característica sensível que permeia a leitura, quebrando parte da agressividade do cenário policial. Os laços que Miguel desenvolve, seja por Nádia, seja por Ingo e Moraes, seja pela cadela Bibi, humanizam ainda mais o personagem e trazem mais camadas para a leitura, inclusive possibilitando discussões morais e éticas a partir delas. Também, há o paradoxo de, embora sentirmos conhecer o protagonista em sua essência, termos a noção de ser essa apenas uma impressão: assim como Nádia ao longo de boa parte da narrativa, sequer sabemos de fato seu nome real, o que vem prenunciado desde a primeira página do romance. Dessa maneira, o que Marçal Aquino mostra é que Miguel permanece um mistério não solucionado para nós.
Em linhas gerais, Baixo Esplendor proporciona uma leitura rápida, uma vez nela imersa, e impactante, seja por seu vocabulário tanto áspero quanto sensível, seja pelos próprios rumos tomados pela trama. Certamente me deixou ainda mais curiosa para conhecer a obra de maior sucesso de Marçal Aquino.
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