annikav.a 10/02/2024
El que me nombra, me rompe
Pelo impacto da linguagem sem perder a complexidade narrativa (em tão poucas páginas, ainda!), a pertinência do tema da violência doméstica (mais especificamente dentro da comunidade lgbtqiap+) e a coragem do relato, a experiência de leitura desse livro não se compara à nenhuma outra. Em seus breves capítulos, Carmen reconta e interpreta o trauma de um relacionamento abusivo de diversas formas, coisa que a própria vítima faz interna, ansiosa e compulsivamente a todo momento, tentando erraticamente recolher e juntar os pedaços de uma mente fragmentada pelo estresse e instabilidade constantes. Mas ela não para na metalinguagem: talvez uma das melhores sacadas do livro é a de usar a função apelativa para colocar o leitor numa situação comum aos relacionamentos abusivos, fazendo-o escolher, tomar um papel ativo na narrativa, só para ser forçado a perceber, ultimamente, que não há possibilidade alguma que seja viável num relacionamento com uma pessoa tão tóxica quanto a mulher na casa dos sonhos (el que me nombra, me rompe, daí o duplo sentido do anonimato). Além disso, Carmen nunca deixa a desejar no quesito responsabilidade das mensagens passadas, ou mesmo na análise mais profunda das questões interseccionais de raça, classe, gênero e sexualidade que envolvem a violência doméstica. Ela mostra um domínio teórico muito grande, tanto do ofício da escrita quanto do estudo crítico da sociedade e das artes.