Maikel.Rosa 14/09/2021
As pessoas costumam chamar de "maquiavélico" alguém que acham inescrupuloso, traiçoeiro ou mesmo diabólico.
Mas os estudados sabem que o termo tem origem no "maquiavelismo", considerada uma das teorias políticas mais bem elaboradas sobre o Estado e a manutenção do poder, apresentada no livro "O Príncipe", de Nicolau Maquiavel.
"Teocracia brasilis" é, sem dúvida, uma obra maquiavélica - em ambos os sentidos.
Assim como o filósofo italiano, o André L Braga conseguiu criar, com genialidade e atenção aos detalhes, um livro muito bem arquitetado sobre vingança e jogos de poder, resgatando personagens emblemáticas de seus predecessores, o romance "Do inferno ao planalto" e o conto "Monkey 19913".
Nesta distopia que amarra misticismo e scifi de um jeito genial, André traz de volta Priscila (versão em carne e osso de Leviatã, que governa o reino das trevas), sua amante e "vice"-presidente Aline Bolsoy, o ex-chefe do executivo Pastor Marcelo Morano e também o idealizador do grupo "ativista" 19913, além de outros peões importantes pra essa trama maniqueísta onde só um lado prevalece - o do mal.
Dividido em 4 partes densas e repletas de trechos propositalmente revoltantes, o livro antes contextualiza o cenário que levou o país a se tornar (oficialmente) uma teocracia, trazendo uma série de notícias de abril de 2019 até dezembro de 2023.
Depois, é só ladeira abaixo... Aos poucos, André vai conduzindo o leitor por uma jornada de desespero e indignação com a podridão de Bolsoy e sua turma, manipuladores que mal sabem, por sua vez, o quanto são manipulados por uma mão ainda mais poderosa.
A coisa toma uma proporção titânica: tem conspirações envolvendo diversas potências mundiais, a criação de uma Ursal católica e de uma Aliança protestante, a ação castradora do novo "Ministério dos Costumes" no Brasil, a organização de uma gigantesca rede de tráfico e a manipulação de armas biológicas de alcance global.
Mas o mais apavorante são os "zooms" que o André dá em algumas das práticas chanceladas pelo novo modelo de governo. Torturas de um sadismo nauseante, experiências cruéis com cobaias humanas, linchamentos institucionalizados e os atos mais pérfidos que se pode imaginar pra derrubada de inimigos políticos.
Ou seja, o livro é sensacional e perturbador!
Trazendo críticas ferozes disfarçadas de ficção, "Teocracia brasilis" já é, pra mim, uma obra-prima da literatura independente nacional, construído com muita inteligência e um senso apurado sobre a realidade.
Não se engane se, ao terminar a leitura, pensar que ela foi simplesmente produto das paixões rebeldes de um anarquista. Como o próprio André escreve, "as melhores coincidências da vida são aquelas que foram cuidadosamente planejadas."
Que o "Anjo Gabriel" esteja com você durante essa nova jornada ao inferno!