Phelipe Guilherme Maciel 12/06/20132666 - Roberto Bolaño | Companhia das Letras (Trad. Eduardo Brandão)"Humano, demasiado humano" [Friedrich Nietzsche]
Somente esta frase me vem a mente quando penso em criar uma resenha para um livro como este. Antes de mais nada temos que nos situar. Trata-se de Roberto Bolaño, uma recente sensação literária principalmente nos Estados Unidos da América, local justamente peculiar pelo fato de ser extremamente difícil situar um Latino entre os mais lidos e também na Europa. Bolaño é um escritor que apesar de ser citado como o maior nome Chileno (e Sul-americano) dos últimos tempos, mostra incansavelmente em seu texto que não é um escritor latino americano. Ele foge desta métrica.
Embora seja comum quando alguém te vê com um livro de Roberto Bolaño no Brasil, te dizer: "Nossa, o Chaves também escreveu livros?", também há certa popularização por este nome nas terras tupiniquins. E 2666 está nesta lista pop.
Justamente por isto é normal ver pessoas falarem mal deste livro. O texto é intenso, Bolaño vomita cultura em suas páginas, seu texto é prolixo, as sub-histórias são muitas. São 850 páginas, no meu caso, levaram 12 dias de leitura intensa, 5 a 6 horas diárias (Não, eu não vejo televisão), após tal odisseia, é comum a pessoa dizer: "Ufa, Hein?"...
Comum para quem não leu e apenas vê os números, ou para quem leu marginalmente. Este é um exemplo de leitura maravilhosa.
Não falarei muito sobre a estrutura do livro, nem resenha seria necessária dado tantas excelentes postagens já aqui. Mas quero meu registro.
São 5 partes.
A Parte Dos Críticos (130 pag.)
Vejo como "A Obsessão".
Além de ver quatro intelectuais, um francês, um espanhol, um italiano e uma inglesa se relacionarem entre si, compartilhando conhecimento, vida sexual, e um desejo obcecado de conhecer mais sobre o artista máximo em comum de todos os quatro, (considerados como os maiores especialistas no assunto, conhecemos também um pouco mais sobre a solidão, o desejo, a obsessão, sobre a loucura. Bolaño cria personagens demasiado humanos, transbordando emoções, e cria ambiente para que estas emoções se ampliem e gritem. Mostra com sutileza desde um desejo de suicídio, até uma trepada sem emoção, apenas carnal, como se todas essas coisas fossem fáceis de escrever como ditar alguém no ato de comer um pedaço de pão. Os quatro intelectuais a princípio apenas trocam informações em conferências sobre literatura alemã, e quando percebem sua afinidade em relação a Benno Von Archimboldi, começam a se freqüentar. Liz Norton, a única mulher do grupo, acaba se relacionando tanto com Jean-Claude Pelletier quanto com Manuel Espinoza. O francês, o espanhol e a inglesa vão para o México, cidade de Santa Tereza, guiados por uma espécie de rastro deixado pelo misterioso escritor, após muito teorizarem sobre ele na Europa, deixando lá apenas o debilitado Piero Morini, o intelectual italiano. Após infrutíferas buscas, conhecem o professor chileno Amalfitano (sim, será o mesmo que aparece em As Agruras do Verdadeiro Tira? De fato é o mesmo, salvo pequenas mudanças). Amalfitano conhece um pouco do misterioso escritor também, mas mesmo com ele, não há grandes avanços na busca. Liz Norton volta para a Inglaterra onde descobre com quem realmente deve se relacionar.
A Parte de Amalfitano. (64 pag.)
Vejo como: "A Loucura".
O texto expõe a vida deste professor de literatura, seu rapport com sua filha, e a história de sua ex-esposa, que ficou louca. Amalfitano no decorrer de sua parte, que também é a menor do livro, dá extremos sinais de loucura, ouvindo e conversando com vozes, tendo altos devaneios e sonhos estranhos. Mostra seu medo de ver Rosa envolvida nos crimes que acontecem em Santa Teresa, e sua relação com as pessoas com quem convive na universidade. Mal necessário na visão dele...
A Parte de Fate. (114 pag.)
Vejo como: "A Angústia".
Fate é um jornalista negro, que sofre pela sua cor, sofre pela perda da mãe, e pelo dilema do poço em que se encontra. Sofre a falta de uma real companhia, sofre com a falta de perspectiva para o imediato. Enviado para Santa Tereza para cobrir uma luta sem grande interesse real, acaba se envolvendo com Rosa Amalfitano e indiretamente com o cenário do horror da cidade, os seus crimes, com uma jornalista que também está envolvida na busca pela descoberta de o que há atrás dos crimes, e com personagens masculinos extremamente duvidosos.
A Parte dos Crimes. (264 pag.)
Vejo como: "A Frustração".
Basicamente vemos a parte árida do livro aqui. A maior parte do livro, são umas DUZENTAS páginas envolvendo dezenas de autópsias de mulheres assassinadas, um louco depravado que profanava templos, e acompanhamos de perto a vida do policial judiciário Juan de Díos, vemos sua frustração por não conseguir descobrir os culpados pelos crimes, sua relação com uma psiquiatra, e vários outros personagens menos recorrentes mas também muito importantes. Atente para todos os personagens desta parte, por mais árida que seja a leitura.
Bom dizer que Santa Tereza é o retrato perfeito de Ciudad Juarez, onde realmente o crime contra as mulheres é o retrato do que Bolaño mostrou neste livro, (e as mortes, também reais, ou baseadas).
A Parte de Archimboldi (243 pag.)
Vejo como: "A Solidão".
É a recompensa para quem passou por este deserto da parte 4. O encontro do Oasis. Leitura esplêndida, te leva de volta para a segunda guerra mundial, e te mostra quem realmente é o escritor desconhecido, sua vida, sua ligação com os personagens do livro, a história de cada um de seus livros. É a explicação de tantas perguntas que Bolaño deixa em sua obra, e em outras obras onde os mesmos personagens aparecem.
Mostra um personagem rico, interessante, e solitário por natureza, mais habituado a viver com as algas que com pessoas.
2666 - Claro que tem explicação! Isto é uma data, que faz com que todos os acontecimentos não fiquem nadando no vácuo. É a liga, o elo.