Maria5792 11/11/2021Os editores deixaram passar apenas porque a autora é uma celebridadeNora Roberts não é uma das minhas autoras favoritas e eu não saberia explicitar exatamente o porquê, mas a constatação disso é o fato de eu ter abandonado grande parte dos livros dela que me dispus a ler. A exceção sendo a série Mortal, que me agradou desde o início por ter unido — de forma elegantemente singela — investigação policial com os clichês de um bom romance, além da adição de elementos futuristas que foram construídos de modo a elevarem um pouco a complexidade da trama, sem deixar de ser uma narrativa simples, casual.
É uma saga extensa e, até onde eu sei, sem data definida para acabar, que parece ter dado certo ante ao seu sucesso e a continuidade de publicações. Contudo, nem a escrita mordaz e inenarrável talento da autora — já consagrada no mercado editorial com os vastos títulos que carregam seu nome — são capazes de impedir os altos e baixos que acompanham as obras com essa natureza contínua.
Como não acompanho o processo de escrita de Nora e muito menos seu cronograma — que deve ser uma loucura considerando a quantidade livros que essa mulher lança ano após ano! — não posso falar com precisão, mas certos detalhes da série me fazem pensar que às vezes ela peca na elaboração das histórias, no planejamento. Isso porque, embora estejamos agora no volume de número 34 lançado no Brasil, avançamos apenas cerca de 3 anos (no máximo!!) desde o primeiro livro, o que faz com que a maioria dos fatos dentro da série devessem estar frescos na cabeça das personagens, certo? E até se vê um certo esforço da autora de evidenciar isso, citando vez ou outra situações que ocorreram em volumes anteriores, porém, há certos mínimos detalhes que — ao meu ver — enriqueceriam mais a história nesse aspecto. O planejamento a longo prazo sendo o mais sublime deles.
É o caso do terceiro volume, sob o título Eternidade Mortal, que trata de um caso que envolve o setor de narcóticos do Departamento de Polícia de Nova Iorque, algo que está — dentro da história — ocorrendo entre os anos 2058/2059, que foi bastante significativo na vida pessoal da personagem principal considerando os acontecimentos no final e a descoberta da identidade do criminoso. Corta para o livro de número 32, cujo título aqui é Corrupção Mortal, em que o ponto central da trama também é o mesmo setor de narcóticos, a cronologia dos fatos não tendo ocorrido sequer um ano e meio depois do narrado em Eternidade Mortal. Aqui, vejo que se a autora tivesse planejado com certa antecedência, ela teria dado um jeito de ligar elementos das duas histórias uma a outra em ambos os livros, mas obviamente nenhum elemento é colocado no terceiro livro — o que demonstra que quando ela o escreveu ainda não havia formulado muito mais a frente da série — de modo que possa ser unido ao mais adiante, e parcamente se observa alusões das circunstâncias dele no livro de volume trinta e dois — o que também aduz que ela não se preocupou muito em visitar as histórias anteriores quando foi escrever essa.
Saliento aqui outra vez, o que ocorreu em Eternidade Mortal foi bastante significativo na vida pessoal não só da Eve, como também — em algum ponto — de outros personagens secundários que continuam atuando em Corrupção Mortal, principalmente o Roarke, mas além dele a psiquiatra Mira, a polícial (na época) Peabody e a jornalista Nadine Furst; há também o curto espaço de tempo entre as duas histórias na cronologia da série. Seria presumível que ao menos um deles desse certa importância ou relembrasse das circunstâncias do passado, não? Se muito o fizeram, decerto foi um comentário jogado de qualquer jeito sobre existir policiais corruptos no sistema.
Mas tudo bem, conforme disse lá em cima, é compreensível que haja alguns furos — ou seriam mera falta de preciosismo? — dentro da série considerando a quantidade imensa de livros lançados e o tempo decorrido entre entre uma publicação e outra, já que a autora escreve para dezenas, centenas de outros títulos além dos feitos na saga Mortal. A título de curiosidade, o primeiro livro, Nudez Mortal, foi inicialmente publicado em 1995 e ela segue escrevendo seus sucessores até os dias atuais.
De qualquer forma, para não me delongar mais ainda, vou às minhas considerações para a referida obra resenhada, Celebridade Mortal, que ocorre logo após o eletrizante — porém nem tão satisfatório — Viagem Mortal. É perceptível que a protagonista ainda está refletindo sobre tudo o que ocorreu no episódio anterior e nos impactos que isso trouxe para a sua vida e a impressão que dá é que a autora quis focar nisso mais do que na trama principal — o assassinato de uma atriz de Hollywood —, mas falhou em ambos os cenários. Faltou tanto em aprofundar os sentimentos e reflexões da Eve como também de amarrar bem certinho os permenores da parte policial da história. Haviam diálogos fora de lugar, indagações da Eve que pareciam não caber dentro do ponto específico em que estavam inseridas, situações convenientemente surgindo vez ou outra. Os investigadores sequer consideraram outras possibilidades do crime, quem o fez foi o marido da tenente (o incrível consultor-civil com suas sensacionais e inigualáveis habilidades) e a teoria foi rapidamente descartada com argumentos rasos sem nem um segundo pensamento dados a isso Em suma, o caso foi resolvido muito mais por repetitivos golpes de sorte e conveniências do que de fato pela perspicácia da sagaz e implacável tenente de polícia.
E esse é um erro que podemos deixar passar em autores novatos, pessoas ainda se aventurando no gênero, algo que é notório estar bem longe da realidade de Nora Roberts. Sigo gostando da série e, principalmente, das aparições sempre tão pertinentes de Roarke e alguns outros personagens cativantes que — por uma infeliz vontade da autora — são pouco aprofundados ou dados menor importância na história.
Em geral, Celebridade Mortal é um livro sem grandes emoções, raso, morno, de fácil leitura para quem não tem nada melhor pra ler e que, se você não o encara com um olhar crítico, pode te garantir algumas horas de entretenimento. Mas não muito.