voandocomlivros 11/05/2022
"CHAMEMOS POR SEU NOME ESTA PENA À QUAL SE RECUSA QUALQUER PUBLICIDADE, ESTA INTIMIDAÇÃO QUE NÃO SE EXERCE SOBRE A BOA GENTE HONESTA, ENQUANTO O É, QUE FASCINA AQUELES QUE DEIXARAM DE SÊ-LO E QUE DEGRADA OU TRANSTORNA AQUELES QUE A ELA SE PRESTARAM. CERTAMENTE, ELA É UMA PENA, UM ESPANTOSO SUPLÍCIO, FÍSICO E MORAL, MAS NÃO OFERECE NENHUM EXEMPLO CERTO, SENÃO DESMORALIZANTE. ELA SANCIONA, MAS NÃO EVITA NADA, QUANDO NÃO DESPERTA O INSTINTO DO ASSASSINATO. ELA EXISTE COMO SE NÃO EXISTISSE, A NÃO SER PARA QUEM É ATINGIDO POR ELA, EM SUA ALMA, DURANTE MESES OU ANOS, EM SEU CORPO, DURANTE A HORA DESESPERADA E VIOLENTA EM QUE O CORTAM EM DOIS, SEM LHE SUPRIMIR A VIDA. CHAMEMO-LA POR SEU NOME, PELO QUE, À FALTA DE OUTRA NOBREZA, LHE DARÁ A VERDADE, E VAMOS RECONHECÊ-LA PELO QUE É EM SUA ESSÊNCIA: UMA VINGANÇA."
"TUDO ISSO PODE DURAR MINUTOS, ATÉ MESMO HORAS, NOS INDIVÍDUOS SEM DEFEITOS: A MORTE NÃO É IMEDIATA... DESTA FORMA, CADA ELEMENTO VITAL SOBREVIVE À DECAPITAÇÃO. SÓ RESTA AO MÉDICO A IMPRESSÃO DE UMA HORRÍVEL EXPERIÊNCIA, DE UMA CRIMINOSA VIVISSECÇÃO SEGUIDA DE UM ENTERRO PREMATURO."
"A PENA CAPITAL NÃO É SIMPLESMENTE A MORTE. ELA É TÃO DIFERENTE, EM SUA ESSÊNCIA, DA PRIVAÇÃO DA VIDA, TANTO QUANTO UM CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DIFERE DA PRISÃO. ELA É, SEM DÚVIDA, UM ASSASSINATO E QUE PAGA ARITMETICAMENTE O CRIME COMETIDO. MAS ELA ACRESCENTA À MORTE UM REGULAMENTO, UM PREMEDITAÇÃO PÚBLICA E CONHECIDA PELA FUTURA VÍTIMA; ENFIM, UMA ORGANIZAÇÃO QUE, EM SI, É FONTE DE SOFRIMENTOS MORAIS MAIS TERRÍVEIS QUE A MORTE."
"A CIÊNCIA, QUE PRETENDE PROVAR TANTO A INOCÊNCIA QUANTO A CULPA, AINDA NÃO CONSEGUIU RESSUSCITAR AQUELES QUE ELA MATA."
"NÃO HÁ JUSTOS, MAS APNEAS CORAÇÕES MAIS OU MENOS POBRES DE JUSTIÇA. VIVER, PELO MENOS, PERMITE-NOS SABÊ-LO E ACRESCENTAR À SOMA DE NOSSOS ATOS UM POUCO DO BEM QUE VAI COMPENSAR, EM PARTE, O MAL QUE LANÇAMOS AO MUNDO."
Você sabia que existe uma grande circularidade nas obras de Camus?
A obsessão pela gratuidade e o acaso trágico pairam em seus textos absurdistas. Para Camus, o absurdo "é um confronto, uma oposição entre a necessidade de encontrar o significado da vida e o universo, personificado por uma sensação de estranheza e de mistério". O natural e o inacrediável se mesclam e se metamorfoseiam por seus livros.
Uma das únicas lembranças que Albert Camus tem de seu pai é através de um relato familiar sobre o episódio em que Lucien Camus vai assistir a uma execução pública em Argel e termina transtornado. Essa cena ganhou um valor simbólico ligada ao sentimento do absurdo e acabou sendo recorrente em diversos livros do autor.
Ao ler "Reflexões sobre a guilhotina", ensaio em que Camus discute a pena da morte, o leitor tem conhecimento dos pensamentos, valores e princípios que o autor tinha sobre o assunto. E consequentemente, é possível compreender de forma mais clara o que aconteceu com Mersault, o herói de "O Estrangeiro", que aparentemente tinha uma vida tão banal e sem sentido.
"O Estrangeiro" é uma obra cheia de camadas, que, assim como "Reflexões sobre a guilhotina", tem em seu cerne, a associação entre indivíduo e sociedade.
Não imaginei que fosse gostar tanto, mas amei as duas obras. Fiquei impactada com "O Estrangeiro" e aprendi muito com "Reflexões sobre a guilhotina".
Ambos os livros são curtinhos e possíveis de concluir em apenas um dia. Fica aqui a minha recomendação para quem gostaria de conhecer o autor.
site: https://www.voandocomlivros.com/post/o-estrangeiro-e-reflex%C3%B5es-sobre-a-guilhotina-resenha