spoiler visualizarLaranja.Mousse 04/02/2024
Margot Mertz arruina a sua vida
Pela sinopse do livro e as avaliações que li aqui no Skoob, eu esperava um livro com uma forte mensagem feminista, e saí bem decepcionada. Pautas importantes são abordadas de maneira superficial e sem a seriedade que merecem. E a Margot, que é a maior militante que esse mundo já viu, tem zero conhecimento sobre o conceito básico de interseccionalidade, por exemplo. Até o feminismo branco e liberal de Barbie é melhor e mais profundo do que a mensagem que há nesse livro.
As vítimas de abuso não têm poder algum dentro da narrativa porque tudo gira em torno da Margot, e só lá pro terço final do livro é que as demais meninas são incluídas na ação (mas acabam não fazendo nada, graças a Margot que as deixa de escanteio novamente). Tem uma hora que ela comenta sobre O poderoso chefão não passar no teste de Bechdel, e o curioso é que se a Margot não tivesse uma conversa com sua mãe sobre ter esquecido a chave de casa, esse livro talvez não passaria também.
Aliás, nenhum coadjuvante tem qualquer tipo de desenvolvimento ou personalidade, é tudo muito raso. A reviravolta não choca por 1) ser óbvia desde o início e 2) a gente não ter qualquer tipo de conexão com o Sammi através da Margot. Ela afirma repetidamente que ele é o melhor amigo dela, mas ele mal aparece na história e ela sempre o trata mal.
Os autores (brancos, obviamente) têm um jeito bem peculiar de descrever o tom de pele dos personagens, e nunca perdem a oportunidade de ressaltar quão branca determinada pessoa é (e tem muitas pessoas brancas/extremamente pálidas na história).
A narrativa é fraca e preguiçosa, dando voltas e voltas sem chegar a lugar algum. Os obstáculos são resolvidos com incrível facilidade, e a solução de um problema chega a ser literalmente dada de mão beijada pra Margot em determinado momento.
Margot Mertz é uma protagonista completamente egocêntrica, antipática, arrogante e desagradável. Ela se considera melhor do que todo mundo e, apesar de se declarar feminista, tem como passatempo preferido diminuir outras garotas sempre que possível, afinal "ela não é como as outras garotas".
Pra uma pessoa tão desconstruída e evoluída como ela, é curioso notar a frequência com quem ela reproduz comportamentos tóxicos e discursos vazios. Como falar mais de uma vez pra sua ex-amiga sobre o cara que abusou essa ex-amiga; ou insistir em beijar o Sammi mesmo depois dele dizer que não queria aquilo; ou usar pessoas não-brancas pra atingir seus objetivos pessoais; ou dizer que é fã do estuprador Marlon Brando; ou julgar as pessoas pela sua aparência; ou criticar um autor por escrever demais quando ela faz exatamente isso; e por aí vai.
Só não dou uma nota menor porque o final foi realista e, por incrível que pareça, a Margot reconhece que é uma pessoa horrível e inicia uma jornada pra ser melhor, o que considero algo positivo. Ela não é perdoada por todos os seus erros e sofre as consequências (de algumas) de suas ações, além de não conquistar tudo aquilo que queria.