Urbano 23/05/2023
Teórico cânone do restauro, precursor teórico da arquitetura moderna
Em seu verbete "Restauração", de 1865, em oposição ao pensamento conservador sobre o restauro e a conservação preciosista de John Ruskin em "A Lâmpada da Memória", de 1849, Viollet-le-Duc traz à luz um importante ponto na preservação de bens patrimoniais arquitetônicos: o resgate da vida do edifício (logo, entende-se que o edifício tem a vida intrínseca a si, e assume, no campo da memória e da história, o papel e as possibilidades de um ser vivo/ser humano de constante construção da sua imagem e valor no presente e pelo presente).
Tomando o resgate físico e funcional a partir de ponderações racionais sempre em tríade (estrutura, função e morfologia), e também o resgate metafísico e significativo do edifício (um objeto-também-portador-de-sentido), Viollet-le-Duc pormenoriza a sua teoria do restauro, a qual por vezes é lida na chave do exagero ou equívoco, e por vezes é lida na chave do moderno e inovador.
O que não é possível negar é que, na busca de entender os edifícios medievais na França pós Revolução como um modelo a ser compreendido, restaurado, conservado, permeado e não copiado, como nos casos de replicação carimbada de fachadas, Viollet-le-Duc engendrou uma nova possibilidade de ver uma memória material histórico-artística nacional e coletiva construída e reconstruída na narrativa contada pela própria matéria do edifício, e escrupulosamente reafirmada (ou enviesada, deturpada, desmanchada, arruinada...) pelo arquiteto no projeto de restauro. Temos em Viollet-le-Duc um arquiteto que dialoga com o passado para construir o presente e o futuro.
"Ademais, o melhor meio para conservar um edifício é encontrar para ele uma destinação, é satisfazer tão bem todas as necessidades que exige essa destinação, que não haja modo de fazer modificação. [...] Mas compreende-se, então, que é preciso deter todos os recursos que possuíam estes mestres antigos, que é preciso proceder como eles mesmos procediam." (VIOLLET-LE-DUC, 1865, p.65).