Arte em deslocamento

Arte em deslocamento Org. Priscila Arantes




Resenhas - Arte em deslocamento


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Giovanna.Gregorio 21/05/2020

Lugares Abstratos
O Paço das Artes é com certeza uma das instituições culturais do Brasil que mais se atualiza dentro do cenário da arte contemporânea, suas iniciativas são sempre contundentes, com a inserção de debates importantes para a cidade assim como a inserção de jovens artistas no circuito da arte, e a organização desse seminário pela Priscila Arantes não poderia ser diferente.
A arte hoje se materializa de inúmeras formas e muitas tecnicamente reprodutíveis de qualquer canto do mundo, vide a videoarte e a fotografia, e da mesma maneira como a arte transita pelo globo com muita facilidade os debates acerca dessa produção também assim se espalha e a partir desse cenário nasce infinitos pontos de vista ao abordar a produção contemporânea associada a contextos diferentes, e Arte em Deslocamento vai propor exatamente algumas perspectivas sobre os trânsitos geopoéticos da arte.
O primeiro capítulo do livro recebe o título "Entre o local e o global: como pensar as diferenças nos dias de hoje e seus reflexos na arte e cultura contemporânea”, ele se inicia com o texto impecável do Moacir dos Anjos discutindo o papel do local e do global assim como o papel da curadoria ambientando sua discussão na 29ª Bienal de São Paulo, a qual ele foi curador, a exposição de 3 obras: October 18, 1977, de Gerhard Ritcher; bólide Homenagem a Cara de Cavalo, de Hélio Oiticica; Inserções em circuitos Ideológicos - Projeto Cédula, de Cildo Meireles e também a participação inusitada de Sandra Gamarra vai revelar não só como a produção artística possui sim uma dimensão contextual no lugar onde ela habita, aqui o cubo branco morreu, a autonomia agora é articulada por um discurso potente que as obras podem clamar quando bem articuladas pelo projeto curatorial, e principalmente discussões institucionais que por exemplo impedem que o MoMA de Nova Iorque faça empréstimos de obras para uma intuição de caráter Menor (assim caracterizado por Moacir) que apresenta uma curadoria a qual escolhe mostrar muito do que o estatuto ocidental vai chamar de Arte Menor e como o discurso curatorial final pode se enriquecer ao incorporar essas intempéries institucionais, esse texto é imperdível.
O próximo texto é da Priscila Arantes que já desenvolve uma pesquisa em torno de uma produção latino-americana partindo de uma perspectiva decolonial, com foco voltado para arte produzida em situações de extrema violência por parte Estado, como as ditaduras militares que assolaram os territórios latino americanos. Aqui ela propõe a discussão dos deslocamentos que permeiam os circuitos da arte, como o nascimento de circuitos alternativos como a Bienal de Havana e a Bienal do Mercosul que fogem da hegemonia eurocêntrica vista como "oficial", o debate também permeia o deslocamento de discurso, (dai a pesquisa decolonial) tendo como eixo central o consagrado texto curatorial do Frederico Morais "Reescrevendo a História da América Latina" que ao escolher "America Invertida" de Joaquín Torres Garcia para ilustrar seu texto, literalmente inverte o local de discurso do norte para o sul, e por fim ela situa o Paço das Artes e seu trabalho com o arquivo digital de arte contemporânea e o papel do arquivo como dispositivo para deslocamentos.
Pablo Lafuente trará a discussão de classe, quando falamos de acesso aos circuitos de arte a mobilidade urbana aparece como um grande problema para a maioria da população dentre outras inúmeras carências que são extremamente convenientes e elitista dos circuitos artisticos, deixo aqui apenas essa citação: "Talvez porque o sistema da arte não conseguiria sobreviver sem as catracas que o protegem, física e simbolicamente, de possíveis ocupações" esse texto é um tapa na cara necessário.
A primeira parte encerra com um texto lindíssimo e poético do Diógenes Moura que partindo do sertão nos enxerga como vulneráveis e barrocos em busca de um sentido no mundo globalizado.
O segundo capítulo aparece sob o título de "Arte, mobilidade, cidade e outros circuitos"
O texto de abertura é de Guilherme Wisnik que vai nos conduzir a reflexão do que hoje nós podemos considerar espaço público, definitivamente não é mais a praça que delimita a dimensão pública, aqui ele defende como o espaço público coincide com a mobilidade, o que pra mim faz todo sentido quando pensamos o tempo diário que gastamos nos transportes públicos, a quantidade de comércios e encontros em terminais de ônibus e rodoviárias...
Karen O'Rourke vai falar propriamente de cartografia, aqui nosso passo é tão pessoal quanto uma impressão digital, seu livro Walking and Mapping: Artists as Cartographers coloca pedestres como cartógrafos situando-os numa "psicogeografia", o caminhar é posto como prática de arte: "é preciso que arte seja mais forte que a vida para que as pessoas possam sentir"
Lucas Bombozzi vai debater a substituição da noção de lugar por fluxos, aqui o termo lugar transita por inúmeras possibilidades de entendimento:
O lugar para a arte,
O lugar da arte,
A arte do lugar (site-specifc),
O ponto de deslocamento na arte,
Trânsitos do conceito de lugar.
O lugar num sentido físico, discursivo e social.
O capítulo se encerra com o Grupo Poéticas Digitais (ECA USP, CNPq) na voz de Gilberto Prado falando um pouco sobre a suas produções e a arte como um sistema aberto que não é alheio ao conhecimento tecnológico e científico.
"Arte e sistema da arte" é o terceiro capítulo que se inicia com a Clarissa Diniz falando sobre o espaço social e como o sistema da arte e a própria arte se comportam como territórios.
Jorge Menna Barreto aborda a obra de Ian Hamilton Finlay sob a perspectiva da tradução, como deslocar sentidos entre diferentes linguagens dentro do sistema da arte "a verdadeira tradução não é outra coisa senão uma forma de leitura; vale dizer, de desleitura" ele traz à luz como a tradução não é livre de perspectivas e parcialidades, e isso não se apresenta como uma problemática necessariamente.
Meu texto favorito junto com o do Moacir dos Anjos com certeza é da Graziela Kunsch no qual ela discorre acerca da sua ação no CCSP de inserir "Tem uma catraca no meio do caminho" nas entradas da instituição que é vista como a instituição de arte mais democrática da cidade de São Paulo, aqui vamos discutir que apesar da instituição não ter catracas, a cidade é permeada por catracas e em sua maioria menos literais, a ação foi realizada na 31ª Bienal de São Paulo também na tentativa de desnaturalizar essa experiencia de passar pela catraca.
É terminar esse texto esperançosamente desejando que as catracas não estejam mais por ai..
O capítulo se encerra com a Lilian Amaral retomando a cartografia, dessa vez a cartografia dos sentidos, as geopoéticas das narrativas artísticas contemporâneas e para tal ela analisa o projeto R.U.A - Cartografias Inventadas.
O último capítulo do seminário: "Olhares e miradas a partis do sul: territorialidades latino-americanas" abre com o texto do Plablo Leon de la Barra, um texto bem complexo e difícil de ler e que ao discorrer a respeito da exposição Under the Same Sun: Art from Latin America Today vai levantar questões muito interessantes sobre a conceituação de uma arte latino-americana que apesar de coesa apresenta muita diferenciação.
Jaime Vindel faz apontamentos acerca da exposição "Perde a forma humana" e a discussão que ela apresenta de arte e política dos anos 1980 e a conjuntura política atual.
O livro encerra então com o texto maravilhoso do Jorge La Ferla "Territórios Imaginados: América Latina" e suas reflexões sobre o que há aqui à sul do mundo de mais particular e original considerando nossos circuitos artísticos e produções.
Gian Paolo 21/05/2020minha estante
Deu até vontade de largar tudo e ler agora!




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