Alessandro232 26/11/2022
É um clássico, mas não funcionou muito bem para mim
"Fausto" de Goethe é considerado pelos "entendidos"- os críticos literários uma das maiores obras-primas da literatura. Sem dúvida, sendo um clássico é um livro que merece ser lido, comentado e relido. No entanto, apesar de reconhecer sua importância, sua leitura para mim não foi tão prazerosa como eu gostaria.
Para quem não sabe, "Fausto" é obra que Goethe demorou quase a vida toda para escrever. Trata-se de um poema de dimensões épicas dividido em duas partes. Sendo que última foi publicada um pouco antes da falecimento de Goethe.
"Fausto" é uma das histórias sobre pacto diabólico mais conhecidas da literatura e o tema tem sido bastante revisto ao longo do tempo. Ou seja, não se trata de uma obra original. A lenda de Fausto já existia bem antes de Goethe escrever aquela que é considerada sua obra-prima. É importante lembrar que antes do poeta alemão, Christopher Marlowe utilizou a mesma trama para escrever "A tragédia do Dr. Fausto". - cujos trechos foram reaproveitados por Goethe em sua versão da lenda, na segunda parte.
Depois dessa explicação (um pouco longa, me desculpe), vamos as minhas impressões sobre a obra. Inicialmente estranhei o prólogo, no qual personagens discutem sobre o processo de criação de Fausto, não como poema épico, mas em forma de uma peça de teatro. Esse trecho é bastante metalinguístico exige bastante atenção do leitor.
Posteriormente, após esta espécie de introdução, temos o início da primeira parte, "Fausto" me cativou e prendeu minha atenção. Tudo começa com a aposta entre deus e diabo que evoca o livro de Jó da Bíblia e na sequencia somos apresentados ao Dr. Fausto.
Neste trecho chama atenção sua caracterização. É notável a forma Goethe o descreve com várias nuances. Embora, Fausto seja dotado de um profundo conhecimento em diversas áreas da Ciência, principalmente a alquimia, ele é incapaz de sentir-se feliz com isso. Por meio de sua escrita poética, Goethe consegue expressar a profunda tristeza de Fausto, sua enorme insatisfação pessoal, com o fato de estar envelhecendo e não ter conseguido aproveitar os prazeres da vida - no sentido carnal.
Também é muito interessante e bonito o trecho em que Fausto invoca os espíritos elementares da natureza em uma espécie de dança cósmica - uma referência a "Tempestade" de Shakespeare, de modo a estabelecer um diálogo entre Goethe e o dramaturgo inglês dentro da tradição da literatura ocidental.
Posteriormente, entre em cena, o demônio Mefistófeles - outra notável criação de Goethe-, que tenta convencer Fausto a assinar um pacto em troca de sua alma. No entanto, Fausto se recusa a faze-lo de forma imediata, e diz que somente o cumprirá depois que saciar seus desejos - que são materializados na bela e inocente Margarida.
Não vou falar muito sobre o que acontece depois. Mas até o final da primeira parte gostei muito do modo como Goethe desenvolve as situações, o envolvimento amoroso entre Fausto e Margarida, assim como a cena do sabá das bruxas - no aspecto imagético, um dos melhores trechos da obra.
Após o encerramento da primeira parte bastante dramático, e o inicio da segunda, "Fausto" perdeu seu encanto. Para mim, a grande dificuldade é sua mudança radical na estrutura narrativa- dá a impressão que você está lendo outro livro. A segunda parte de "Fausto" é de difícil entendimento.
A linguagem de Goethe torna-se muito hermética, com uma profusão de alegorias que também estão novamente relacionadas com à tradição da Literatura Ocidental que remontam á Antiguidade Clássica, a exemplo de "A Odisseia", de Homero que deixam o texto ainda confuso. Me deu a impressão neste trecho que Goethe quis até mesmo alegorizar a figura de Fausto, de modo a simbolizar às mudanças econômicas e sociais na Alemanha. - o trecho em que o ouro é visto como o bem mais preciso do homem enfatiza bem essa ideia.
Além disso, o tema do pacto diabólico é deixado um pouco de lado, e retomado somente no trecho final. "Fausto" termina de forma meio enigmática, mais sugerindo que mostrando o que realmente aconteceu com o protagonista. Goethe permite somente um vislumbre sobre o destino do personagem.
No fim da leitura, tive a impressão que muita coisa me escapou à compreensão. Com certeza vou ter que voltar a ler a obra, principalmente sua segunda parte que achei difícil de entender totalmente. De qualquer forma, "Fausto" mesmo não me agradando, é um clássico da literatura.
Sobre a edição: O Clube da Literatura Clássica caprichou em sua versão de "Fausto". O livro tem um belo projeto gráfico - um dos mais bonitos da coleção- com algumas belas ilustrações e várias notas de rodapé.