Lucy 23/07/2022
Mais Que Abusivo
"Dash era um puto. Um idiota egoísta, imaturo e, às vezes, manipulador."
"Não havia nada a se romantizar em Dash [...]"
Mais Que Amigos (Kiss and Break Up no original, título que faz muito mais sentido) parece um romance fofo juvenil de dois amigos que se conhecem desde a infância e se descobrem apaixonados. Mas só parece mesmo. Na realidade, temos mais um exemplo de romance adolescente incrivelmente tóxico sobre personagens abusivos e manipuladores sendo tratados como heróis. E a relação entre Peggy e Dash está muito longe de ser a relação que se espera quando se trata de melhores amigos. O mais estranho é que a autora, visivelmente, tem plena noção da toxidade de Dash. Deixa bem claro o quanto ele é egoísta, mimado, narcisista, chorão. Vemos esse tipo de afirmação sair do próprio Dash. Porém, mesmo assim, Ella Fields achou uma boa ideia manter o personagem desse jeito até o fim. Sem qualquer traço de qualidade, sem qualquer chance de redenção.
Posso dizer, com absoluta certeza, que Peggy (nossa nobre, ingênua e virginal protagonista) está muito mal servida de homens. De um lado, Byron, o garoto popular da escola. Ele é cheio de grandes gestos fofos e públicos e sumiços constantes. Claramente alguém que nunca deu a mínima para ela e se mostrou um perfeito babaca. Do outro lado, Dash, o "melhor amigo". Dash, além de toda a extensa lista de qualidades já citadas, é extremamente abusivo desde o início. Em mais de uma vez, Peggy se vê obrigada a abandonar o próprio quarto, pois ele se recusa a sair de lá quando ela o manda embora. Ele sempre tem comentários desagradáveis na ponta da língua, independente dela estar feliz ou chateada. Ele nunca está lá para fazê-la se sentir melhor, não sem destilar seu veneno. Ela passa anos não se sentindo boa o bastante para alguém se interessar por ela, mas o culpado disso era Dash, que não deixava ninguém se aproximar dela. Ela diz isso a ele, entretanto, quem disse que ele se importa? Ele mesmo diz que é, assim como seus amigos, narcisista demais para se importar por muito tempo com alguém além de si. Tudo gira em torno dele. Ninguém sofre tanto quanto ele. Ninguém está tão machucado quanto ele. Peggy se agarrar com o namorado dela destruiu a vida dele. Ela beijar o próprio namorado o faz querer rasgar o c# com as unhas de tanta dor que isso lhe causa. Ele a ignora e não quer ouvir o lado dela da história. Mas... e quando ele faz pior e a machuca ainda mais? Ah, mais aí a culpa é toda dela. Ela arruinou tudo. Ela é terrível, e o que ele fez não foi tão grave. Que tal deixar isso para lá? Ela tem que ouvi-lo, tem que lhe dar uma chance porque ela é a garota dele e de mais ninguém. Vê? Ele nunca aceita um não como resposta e nunca reconhece os seus erros. Dash é sempre a vítima e nunca quem deve pedir perdão. E isso persiste até cerca de 92% do livro. É tempo demais para detestar um personagem e pouquíssimo tempo para tentar redimi-lo. Mas a autora nunca teve a intenção de fazê-lo ser melhor.
Já Peggy está sempre sofrendo, se sentindo culpada e pedindo desculpa por erros que ela não cometeu. Implorando perdão, mesmo sem ter feito nada de errado. É difícil simpatizar.
Temos abuso, toxidade, praticamente uma tentativa de estupro, temos rivalidade feminina de jovens idiotas brigando por moleques idiotas, temos muito álcool e muita maconha. Muita maconha. Mas Peggy ainda diz que é um exagero chamar Dash e seus amigos de zé-droguinhas (como sempre, ela se recusa a enxergar o óbvio). Os coadjuvantes estão lá para dar material para os livros seguintes. Chatos e inúteis. Não tenho qualquer interesse em ler mais sobre eles.
Resumo: livro ruim. Pelo menos a leitura foi rápida e o início parecia que ia ser legal. Mal sabia eu que as coisas iriam piorar tanto...