Jennifer.Ernesto 27/11/2023
Amigos, amores e aquela coisa terrível
Eis um livro que me deixou com muitos sentimentos e com tantos incômodos que eu não sei ao certo o que dizer sobre a leitura. Mas, como muitos de vocês me pedem indicações constantes de livros, eis um livro para incomodar, pensar sobre solidão e vício.
A autobiografia de Matthew Perry retrata a sua jornada de vício (em medicamentos, álcool e cigarro), sua doença e a solidão a qual viveu durante toda a sua vida. E, apesar de diversos amores e amigos serem boas referências, a presença obsessiva do vício, as suas idas e vindas às reabilitações faz com que o leitor sinta sua agonia. Seria, talvez, uma pincelada dos altos e baixos da vida de Matthew. ?Eu passei por mais de 65 desintoxicações ao longo da vida, mas a primeira aconteceu quando eu tinha 26 anos.?
Matthew relata a sua dificuldade de se abrir para as pessoas, mas especialmente para as mulheres que se relacionou. Em quase - ou se não todos - os seus relacionamentos, ele levou ao fim com o medo do abandono.
E, apesar de todas as dificuldades, um dia ?(...) conheci um conselheiro chamado Burton, uma figura com ares de Yoda que me disse que eu gostava do drama e do caos da dependência química. ?Do que você está falando??, perguntei. ?Isso destruiu a minha vida. Acabou com tudo de bom que eu já tive.? Fiquei muito irritado. Mas, e se ele tivesse razão??
Em seu relato, percebe-se a dualidade entre ser viciado e se ver curado do vício. O vício e sua cura muitas vezes lhe deu propósito, como poder ajudar outras pessoas e se sentir válido. Isso esteve presente não apenas na comédia e na sua profissão enquanto ator, mas principalmente quando ele se fazia útil à dor dos outros.
Ele viveu de extremos. E, ser rico e famoso facilitou a convivência com vícios em níveis astronômicos. Mas, nenhum dinheiro do mundo foi capaz de evitar a agonia de conviver com sua doença, e as consequências que ela impôs em sua vida. É tão grande o sofrimento do ator, que o mesmo relata que abriria mão de todas as suas conquistas e riquezas para se ver livre da dependência química. Ele trocaria de lugar com qualquer outra pessoa para se ver livre desta doença.
O humor da narrativa é trágico. Segundo declarações de Perry e de seus amigos, o livro teria ressignificado um pouco do seu sofrimento e agonia. Mas, não sei ao certo o quanto ter consciência da dor, de fato a afaga. Sua história me deixou no mínimo: reflexiva, incomodada e triste.
Infelizmente, o ator foi encontrado morto no dia 28.10.2023, em uma banheira de hidromassagem de sua casa, em Los Angeles. E, que ele teria sido vítima de afogamento. E, espero que esse ator brilhante, que fez com que eu risse muito na minha adolescência e vida adulta tenha enfim encontrado a sua paz.
E, apesar que eu tenha muitos pensamentos sobre raça, gênero e classe e os abusos de substâncias, não acho que vem ao caso neste contexto. No final das contas, é bem triste, angustiante. E bem, é o sofrimentos humano e como vamos lidando com os nossos vazios.