outroelton 13/09/2023
Protagonismo feminino
?Cai a noite em Hollywood? (The Dark Hours, no original) é o 23° livro envolvendo o detetive Harry Bosch. E digo ?envolvendo? porque, justiça seja feita, desta vez Bosch surge como coadjuvante (coadjuvante de peso, é verdade), já que o protagonismo fica por conta da detetive Renée Ballard.
Publicada em 2021, a narrativa começa na noite de réveillon, numa Hollywood ainda sob efeito da pandemia de Covid, enquanto Ballard e Lisa Moore, sua parceira temporária, aguardam para agir, caso um novo crime de assédio sexual seja cometido por criminosos conhecidos como Homens da Meia-noite. Porém, as detetives são mobilizadas para investigar o assassinato de um imigrante mexicano dissidente de uma gangue, uma investigação que pode colocar em risco a reputação do Departamento de Polícia de Los Angeles.
E onde o detetive Harry Bosch entra na história, talvez você esteja se perguntando? Como reforcei na introdução da resenha, na minha avaliação, o protagonismo fica por conta de Renée Ballard, que assume a investigação dos dois crimes com um compromisso no mínimo atípico para uma detetive que atua no turno da noite. Embora a participação de Bosch seja relevante para o andamento das investigações, é Ballard quem decide quando o detetive aposentado do DPLA será envolvido e qual será o seu papel em cada situação.
O que me traz a um desafio particular enfrentado por Renée: o fato de ser uma detetive mulher. Connelly explora muito bem esse aspecto na narrativa, expondo o machismo, o preconceito e os obstáculos adicionais que Ballard precisa enfrentar nas diferentes esferas burocráticas do departamento, para provar o seu valor como uma detetive competente e respeitada.
E um exemplo específico chama atenção na segunda parte do livro. A certa altura, Renée é interrogada por um agente do DPLA e é questionada sobre as motivações por trás da sua colaboração com o ex-detetive Harry Bosch. A cena seria protocolar, se o interrogador não revelasse uma dose extra de machismo ao fazer a seguinte pergunta: ?E não existe nada de romântico entre você e Bosch??, ao que Renée lhe responde categoricamente: ?Se eu fosse homem e tivesse procurado um detetive aposentado que tivesse conexão com o meu caso, o senhor perguntaria se havia algum romance entre nós?? Perfeito, Renée.
Como já é comum nas obras de Connelly, a narrativa tem um ritmo excelente e os acontecimentos se desdobram de uma forma que deixam a leitura sempre instigante. O papel de coadjuvante de Bosch não chega a ser um problema, porque Connelly constrói a trama apostando no carisma e na coragem da detetive Renée Ballard. E, felizmente, é bem-sucedido nessa empreitada.