André Vedder 24/06/2022
Um início impecável.
Érico Verissimo já havia me dado uma aula de política e história em "Incidente em Antares", livro no qual aborda o período da ditadura. E aqui novamente, além do prazer de lê-lo, aprendo um pouco mais sobre a história, em especial, sobre o sul do Brasil.
No enredo aqui temos um vai e vem do tempo, onde somos apresentados às famílias Terra e Cambará, assim como suas origens em uma época permeada de guerras e lutas.
O autor é genial nessa mistura de ficção com fatos históricos e sua narrativa nos leva direto pra esse ambiente criado com maestria, onde o leitor sente-se próximo dos fatos e também dos personagens.
Personagens que por sinal, Érico consegue em poucas palavras, as vezes um pequeno diálogo ou uma atitude, sintetizar toda a essência daquela figura. E assim até mesmo personagens com pouca relevância se tornam únicos e marcantes de certa forma. Característica que vejo como uma virtude dos grandes escritores.
"Nossa mente, Alonzo, é como uma grande e misteriosa casa, cheia de corredores, alçapões, portas falsas, quartos secretos de todo o tamanho, uns bem, outros mal iluminados. No fundo desse casarão existe um cubículo, o mais secreto de todos, onde estão fechados nossos pensamentos mais íntimos, nossos mais tenebrosos segredos, nossas lembranças mais temidas. Quando estamos acordados usamos apenas as salas principais, as que têm janelas para fora. Mas quando dormimos, o diabo no entra na cabeça e vai exatamente abrir o cubículo misterioso para que as lembranças secretas saiam a assombrar o resto da casa. O demônio não dorme. E é quando nossa consciência adormece que ele aproveita para agir."
"Devia existir um Deus que governa o mundo e as pessoas, um ser poderoso acima do qual nada existe. Mas ninguém sabe direito o que esse Deus pretende. Pelo menos ele, Pedro Terra, não sabia. O vigário fazia sermões e falava em céu e inferno, mas às vezes Pedro se convencia de que o céu e o inferno estão aqui embaixo mesmo, neste mundo velho e triste, que no fim de contas é mais inferno que céu."