jota 05/10/2019Candongas não fazem festa...Nos anos 1980 a editora Nova Fronteira consultou treze jornalistas especializados em literatura brasileira (através de seus escritos ou por solicitação direta), para que fossem conhecidos e publicados em livro os contos que eles acreditavam ser os melhores de Machado de Assis (1839-1908). O resultado foi este volume que traz trinta e três histórias curtas de Machado em ordem cronológica. Sim, trinta e três contos e não apenas trinta, como diz seu título. O esclarecimento pela inclusão de mais três contos - Três Tesouros Perdidos, O Caso da Vara e O Escrivão Coimbra – vem na Nota Editorial, uma espécie de apresentação da obra.
Apesar de não constarem entre os escolhidos como melhores contos, tanto o primeiro quanto o terceiro foram justamente o primeiro e o último dos contos publicados por Machado em vida: Três Tesouros Perdidos em 1858 (ele contava 19 anos então) e O Escrivão Coimbra em 1907 (um ano antes de sua morte). São contos pouco conhecidos e apreciados pelo próprio Machado, que nunca os incluiu em qualquer coletânea por ele mesmo organizada. Já O Caso da Vara, que é de 1891, foi destacado pela Nova Fronteira por se tratar de um dos contos mais populares do autor, muito reproduzido em coletâneas e que, curiosamente, não recebeu um único voto dos consultados. Vá entender...
Além de autor de algumas das mais importantes obras em língua portuguesa, Machado também é considerado nosso melhor contista, o que pode ser comprovado através de uma de suas histórias mais célebres, presente em toda boa coletânea de seus contos: O Alienista (que, no entanto, alguns especialistas preferem classificar como novela). O mesmo ocorre com A Cartomante, Uns Braços, Um Homem Célebre, Missa do Galo, Pai Contra Mãe etc. Ler esses contos é viajar no tempo, para o Brasil do século XIX, melhor, para um Rio de Janeiro de paisagens, tipos e hábitos curiosos, que se ainda guarda algumas belezas naturais e arquitetônicas dos tempos de Machado, transformou-se numa cidade bastante desigual e violenta: o malandro foi substituído pelo traficante etc.
O título deste comentário tem a ver com um dos contos selecionados, Um Homem Célebre, que é sobre um compositor de polcas (polca é uma dança popular de origem alemã, muito difundida no Rio na época de Machado) cujo editor de partituras tinha o hábito de dar nomes curiosos (ou estranhos, pode ser) às obras que publicava. Numa ocasião autor e editor conversavam sobre outra polca finalizada e este sugeriu que ela fosse intitulada “Candongas não fazem festa.” Então o compositor quis saber: “Mas o que quer dizer Candongas não fazem festa?” E o editor, de pronto: “Não quer dizer nada, mas populariza-se logo.” E para uma próxima composição o editor já tinha reservado outro título, nessa mesma linha: “Senhora dona, guarde o seu balaio.” Esses títulos lembram um pouco o que aconteceu muitos anos depois com uma canção do célebre Vinicius de Moraes (em parceria com Toquinho), A tonga da mironga do kabuletê, também um título sem significado algum...
A seguir a relação completa dos trinta melhores contos de Machado de Assis mais aqueles três incluídos pela Nova Fronteira, na ordem em que foram publicados e aparecem no volume:
Três tesouros perdidos (1858); A chinela turca (1875); O alienista (1881); Teoria do medalhão (1881); D. Benedita (1882); O empréstimo (1882); O espelho (1882); A igreja do Diabo (1883); Cantiga de esponsais (1883); Singular ocorrência (1883); Galeria póstuma (1883);
Anedota pecuniária (1883); Uma senhora (1883); Noite de almirante (1884); Evolução (1884); O enfermeiro (1884); Conto de escola (1884); D. Paula (1884); A cartomante (1884); Um apólogo (1885); A causa secreta (1885); Uns braços (1885);
Entre santos (1886); Trio em lá menor (1886); Viver! (1886); A desejada das gentes (1886); Um homem célebre (1888); O caso da vara (1891); Missa do galo (1894); Um erradio (1894); Pai contra mãe (1906); Suje-se gordo! (1906); O escrivão Coimbra (1907).
Lido entre 27/09 e 03/10/2019.