Amanda 09/10/2020AssustadorPraticamente todos que viveram a década de 1990 já tiveram algum contato meio traumático com uma lenda urbana, as famosas creepypastas que eram freneticamente repassadas entre os jovens e garantiram algumas noites insones para os desavisados. Desde a loira do banheiro, o ET de Varginha e as maldições sinistras que se iniciavam por algum descuido na internet, todas tinham esse poder macabro de mexer com um dos nossos medos mais profundos: aquilo que não podemos compreender.
A coletânea Creepypastas, em seu segundo volume, apostou nessa nostalgia noventista para recriar a aura do mais puro terror e ingenuidade tecnológica, trazendo 32 contos curtinhos (ainda bem) com as mais variadas temáticas, porém todos com a mesma intenção: perturbar o sono do leitor. E eu não vou mentir, é altamente não recomendado ter essas Creepypastas como leitura de cabeceira.
No que diz respeito à obra completa, foi feito um excelente trabalho em reunir diferentes textos com o mesmo propósito, com qualidades relativamente similares entre eles e uma unidade narrativa interessante. Como são histórias bem curtas, o único entrave para o ritmo da leitura é realmente ter fôlego para encarar vários contos de uma vez só. Particularmente, acho que a experiência fica mais interessante com uma leitura mais controlada, mas para os antigos e nostálgicos fãs dos fatídicos fóruns de lendas urbanas, talvez isso seja impossível.
Como são muitos textos, não cabe analisar em detalhes cada um, mas vou ressaltar alguns com base em alguns critérios pessoais.
Entre os mais medonhos que eu li (e que me perturbam até agora), não posso deixar de citar Boneca Russa, do Álex Souza - provavelmente o conto mais difícil de digerir entre todos. Mas sobressaem-se também Hora Errada, de Kelly Amorim, por uma excelente narrativa curta, além do mal-estar que a história causa, A Casa de Espelhos, de L.A. Tecau, e 100 Cartas, do Alec Silva, ambos abrindo a coletânea e desde já estabelecendo o tom das histórias que se seguem.
Um dos meus favoritos, e que considero também um dos mais criativos, é O Canto das Baleias, de Leonardo Araújo, que me remeteu diretamente a uma espécie muito interessante de fusão entre lenda urbana e new weird, o que me surpreendeu bastante. Como a maior parte dos contos encontram algum eco de memória entre as lendas urbanas que eu mesma tive acesso na minha adolescência, este conto em especial acabou se destacando positivamente.
Quero também enaltecer os autores que utilizaram referências tipicamente brasileiras, sejam folclóricas ou regionais, valorizando aquelas lendas assustadoras de cidades do interior e enriquecendo um pouco mais a coletânea com as raízes do terror nacional. Nesse ponto, os que mais chamam a atenção são Linha Direta, do Lucas F. F. A., e Dias Sombrios, Noites Claras, do Diego de Araujo Silva, ambas as narrativas inovadoras tanto na estrutura quanto na temática escolhida.
Creepypastas: Lendas da Internet é uma excelente forma de matar a saudade dos anos 90 e das madrugadas de internet discada acessando sites e fóruns que ferviam de histórias que cresceram no imaginário popular. Aos que não viveram a época, também vale a pena conhecer um pouco mais dessa cultura popular dos primórdios da computação no Brasil.
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