Escrever

Escrever Marguerite Duras




Resenhas - Escrever


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Ricardo Rocha 25/11/2016

Marguerite escrevia para não enlouquecer, para isso serve a literatura. Quando se relaciona literatura a qualquer outra coisa, sobretudo coisas sensatas ou relacionadas a sucesso, estão falando de alguma outra coisa, não de escrever.
É desesperador você não conseguir escrever porque não conseguiu ficar sozinho, não conseguiu erguer um muro de silêncio em torno de sua vida. É disso que se trata. Marguerite escrevia, segundo essa visão de Rilke, porque não poderia viver de outra maneira. Não faz o menor sentido falar de universidade nesse contexto. Ela conseguiu. A própria vida social destrói a vida literária de um escritor. A conversa, na medida em que destrói a solidão com transitoriedade, as festas, os louvores mútuos, as panelinhas, o texto edificante, o texto que diz como é a quem quer escrever. Tudo isso não é escrever. Devido até que seja ler. Quando ela comprou a casa, reunia os amigos e se sentia menos sozinha e, diz, é quando esteve mais abandonada. Escrever não é um projeto. Não é possível falar com as pessoas sobre um livro que se escreveu, menos ainda que se esteja escrevendo. A solidão não é uma escolha, é uma sentença. O silêncio. O livro cresce em todas as direções, abarca tudo, sobretudo o destino. É aquele momento em que num clique súbito se descobre que não faz a menor diferença o que acontecer por causa do livro, porque a relação de sua vida com o seu livro é no fundo irrelevante, porque o livro tem vida própria. Não há consolo possível. É bom que não haja. É aquele momento em que se pergunta por que você e você não tem resposta. Tem aquela letra de Dylan que diz “fiz calçados pra todo mundo e continuo descalço” – não é um lamento, uma queixa – precisa ser assim. Marguerite não sabe o que é um livro, ninguém sabe, mas quando surge um livro, o sabemos. Não há uma boa escrita sem crise. U bom livro não nasce do conforto. E ler já é, de algum modo, escrever.
Wagner 25/11/2016minha estante
... excelente.


Ricardo Rocha 26/11/2016minha estante
bom final de semana, wagner!




Toni 03/03/2022

Leituras de 2022 | Cortesia da editora

Escrever [1993]
Marguerite Duras (1914-1996)
Relicário, 2021, 144 p.
Trad. Luciene Guimarães de Oliveira

Textos autorais sobre a arte de escrever têm sido uma obsessão minha por muitos e muitos anos. Uma das razões que posso apontar para esse interesse específico é o fato de que a cada leitura desses ensaios de "permaescrita" (para usar um excelente conceito da C. Saavedra em O mundo desdobrável) reitera a noção de que escrita e vivência não são só indissociáveis como determinam, em definitivo, até mesmo o entendimento que escritoras e escritores possam ter de literatura, ficção, escrita e “função da arte” (entre aspas para marcar o conflito de interesses premente).

Para Marguerite Duras – no ensaio que dá título a esta coletânea e abre a coleção da Relicário dedicada à autora –, escrever é “berrar sem fazer ruído” e o livro é o lugar onde existe “a solidão do mundo inteiro”. Com efeito, essa solidão e aquele silêncio de um berro são chaves de leituras fundamentais para quem deseja se aproximar da obra da escritora, capaz de criar ruídos com uma gota de suor e sufocar leitores com o excesso de ar em seus diálogos mais ambíguos. “Escrever”, o ensaio mais longo dos cinco presentes no volume, oferece uma espécie de balanço de uma vida dedicada à literatura e ao cinema, ainda que, contrariando expectativas e longe de encerrar conclusões, se desdobre em mais perguntas, reticências e novos riscos.

Mas o grande destaque do volume, em minha opinião, é “A morte do jovem aviador inglês”, um texto-diário escrito durante a passagem da escritora pelo vilarejo de Vauville, onde Duras descobriu a história de um rapaz de 20 anos morto um dia antes do fim da Segunda Guerra. Aqui, mais uma vez, grito e silêncio, solidão e trabalho atingem o paroxismo da escrita. Em tempos como o que estamos vivendo, o desnudamento da gratuidade, da irreflexão e da selvageria precisa ser um exercício de escrutínio diário. Um exercício que, como aquele da escrita, implica estar atento e aberto ao mundo para descobrirmos que “em torno de nós, tudo escreve” e “é isso que precisamos perceber”.

#margueriteduras #escrever #ensaios #relicarioedicoes
Alê | @alexandrejjr 05/03/2022minha estante
Curiosidade real: as duas estrelas são meramente ilustrativas?




Dara 30/12/2020

Relato sobre a solidão de deixar restos
"Vou adorar contar a história que contei pela primeira vez a Michelle Porte, que tinha feito um filme sobre mim. Àquela altura da história, eu me encontrava naquilo que se chama a “despensa” na “casa pequena”, que se comunica com a casa grande. Estava sozinha. Esperava por Michelle Porte naquela despensa. Muitas vezes fico assim em lugares calmos e vazios. Por longo tempo. E foi no interior desse silencio, naquele dia que repente vi e ouvi, rente a parede, bem perto de mim, os últimos minutos da vida de uma mosca comum.
Sentei no chão para não assustá-la. Não mexi mais.
Estava sozinha com ela na casa inteira. Nunca tinha pensado nas moscas até então, exceto para rogar pragas contra elas. Como vocês. Fui educada, como vocês, no horror dessa calamidade para o mundo inteiro, que transmite a peste e a cólera.
Cheguei perto para vê-la morrer.
Ela queria escapar a parede, onde corria o risco de se tornar prisioneira da areia e do cimento que se depositavam sobre a parede, com a umidade do parque. Olhei como uma mosca dessas morria. Foi demorado. Ela se debatia contra a morte. Durou talvez algo entre dez e quinze minutos e depois cessou. A vida precisara cessar. Ainda fiquei ali para ver. A mosca continuou parada junto a parede como eu a tinha visto, como chumbada a parede.Eu estava enganada: ela ainda vivia.
Ainda estou ali, a olhar, na esperança de que ela recomece a esperar, a
viver.
Minha presença tornava aquela morte ainda mais atroz. Sabia disso e
fiquei ali. Para ver. Ver como aquela morte invadia a mosca progressiva-
mente. E também tentar ver de onde vinha essa morte. De fora, ou da
espessura da parede, ou do sol. De que noite ela vinha, da terra ou do
céu, das florestas vizinhas, ou de um nada ainda inominável, talvez
muito próximo, talvez de mim, que tentava refazer os caminhos da mosca
no esforço de passar para a eternidade.
Não sei mais qual foi o final. Sem dúvida, a mosca, no final de suas
forças, acabou tombando. As patas se desprenderam da parede. E ela caiu
da parede. Não sei mais nada, exceto que sai de lá. Disse para mim mesma:
“Você está a ponto de ficar doida.” E sai de lá.
Quando Michelle Porte chegou, mostrei a ela o lugar e contei que uma
mosca morrera ali as três e vinte. Michelle Porte riu um bocado. Ela teve
um ataque de riso. Tinha razão. Sorri paia ela, como intuito de pôr um
fim naquela história. Mas não: ela riu ainda mais. E eu, quando conto de
novo a história para vocês, assim, a pura verdade, a minha verdade, foi
tudo como acabei de dizer, aquilo que se passou entre mim e a mosca, e
que ainda não se presta a risos.
A morte de uma mosca e a morte. E a morte em marcha para um determinado
fim do mundo, que estende o campo do sono derradeiro. Vemos morrer um
cão, vemos morrer um cavalo, e dizemos qualquer coisa, por exemplo,
coitado do bicho... Mas se uma mosca morre, não dizemos nada, não
registramos nada.
Agora está escrito. E, talvez, a este tipo de derrapagem não gosto desta
palavra — muito sombria que nos arriscamos. Não chega a ser grave, mas
d um fato em si mesmo, total, de um sentido enorme: de um sentido
inacessível e de uma extensão sem limites.
E bom também se o escrito conduz a isso, a essa mosca em agonia, quero
dizer: escrever o pavor de escrever. A hora exata da morte, registrada, a
tornava já inacessível. Isso lhe dava uma importância de caráter geral,
digamos, um lugar preciso no mapa geral da vida sobre a terra.Essa exatidão da hora da morte faria com que a mosca tivesse funerais secretos. Vinte anos depois da sua morte, a prova esta aqui mesmo, ainda falamos dela,
Nunca contei a morte dessa mosca, sua demora, sua lentidão, seu medo atroz, sua verdade.
A exatidão da hora da morte remete a coexistência com o homem, com os povos coloniza- dos, com a massa fabulosa dos desconhecidos do mundo, as pessoas sós, na solidão universal. A vida, ela está em toda parte. Da bactéria ao elefante. Da terra aos céus divinos ou já mortos.
Não organizei nada em torno da morte da mosca. As paredes brancas, lisas eram já sua mortalha e fizeram com que sua morte se tornas- se um acontecimento público, natural e inevitável. Aquela mosca evidentemente estava no final da vida. Eu não podia me impedir de vê-la morrer. Ela não se mexia mais. Também havia isso, e de saber também que não se pode contar que essa mosca existiu.
Isso foi há vinte anos. Nunca contei este fato como acabei de contar aqui, nem mesmo para Michelle Porte. O que eu sabia — o que eu via — era que a mosca já sabia que aquele gelo que a atravessava era a morte. Isso era o mais assusta- dor. O mais inesperado. Ela sabia. E ela aceitava.
Uma casa só, isso não existe desse jeito. E preciso que o tempo passe ao redor dela, pessoas, historias, “reviravoltas”, coisas como o casamento ou a morte daquela mosca, a morte, a morte banal — a da unidade e do nome ao mesmo tempo, a morte planetária, proletária. A morte provocada pelas guerras, as montanhas de guerras que existem na Terra.
Naquele dia. Naquela data, deum encontro com minha amiga Michelle Porte, um fato visto apenas por mim, naquele dia sem hora, uma mosca morreu.
No momento em que olhei para ela, de repente eram três horas e vinte da tarde, um pouco mais: o ruído dos e litros havia cessado.
A mosca estava morta."
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Lu 29/04/2021

"Pois quando havia o mundo, me sentia ao mesmo tempo menos só e mais abandonada"
O processo da escrita enquanto palavra silenciosa e desconhecida de si mesma, a noite pura, uma selvageria completa que beira paralela a sua personalidade - a escrita de Marguerite é fascinante por todo seu silêncio e uma espécie de tempo suspenso na obra. Conhecer um pouco de como ela cria e me pareceu de um frescor e reencontro com ideias que estava cultivando.
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Erica 21/10/2021

Uma passagem incontornável
Escrever, de Marguerite Duras, ed. Rebuliço

O melhor dos ensaios é o "Escrever", mas há trechos belos por todo o livro, trechos sobre a escrita e outros que seriam perfeitos versos de poemas. Todos textos são incontornáveis, são amplos, vastos, e não há como seguir sem um mergulho.


“Isso faz da escrita algo selvagem. Unimo-nos a uma selvageria anterior à vida. E a reconhecemos sempre, é a das florestas, antiga como o tempo. A do medo de tudo, distinto e inseparável da própria vida. Ficamos ferozes. Não podemos escrever sem a força do corpo. É preciso ser mais forte que si mesmo para abordar a escrita, é preciso ser mais forte que aquilo que se escreve.” (p. 34)

“Um escritor é algo curioso. É uma contradição e também um absurdo. Escrever é também não falar. É se calar. É berrar sem fazer ruído. Um escritor com frequência é sossegado, e alguém que escuta muito. Não fala muito, pois é impossível falar com alguém de um livro que escrevemos e sobretudo de um livro que estamos escrevendo.” (p.38-39)

“livros encantadores, sem consequência alguma, sem noite. Sem silêncio. Em outras palavras: sem um verdadeiro autor. Livros do dia, de passatempo, de viagem. Mas não livros que se incrustam no pensamento e que falam do luto negro de toda a vida, o lugar-comum de todo pensamento.
Não sei o que é um livro. Ninguém sabe. Mas sabemos quando ele existe. E quando não há nada, sabemos, do mesmo modo como sabemos que estamos vivos, que ainda não morremos”. (p. 44-45)

Uma passagem incontornável (p. 45)


“Devemos ler sozinhos o livro que escrevemos, enclausurados no livro. Isso tem, claro, um aspecto religioso” (p. 55)

“Em torno de nós, tudo escreve, é isso que precisamos perceber, tudo escreve, a mosca, ela, ela escreve, nas paredes, ela escreveu bastante na luz da grande sala, refletida pelo lago.” (p. 55)

“Escrever.
Não posso.
Ninguém pode.
É preciso dizer: não podemos.
E escrevemos
É o desconhecido que carregamos dentro de nós: escrever, é isso que se alcança. É isso ou nada.” (p. 63)


Tudo é claro em torno da morte (p. 84)

“Não podemos escrever sobre isso. Ou então podemos escrever sobre tudo. Escrever sobre tudo, tudo ao mesmo tempo, é não escrever. É nada. E é uma leitura insustentável, assim como um anúncio comercial” (p. 85)

“Eu escrevo por causa dessa oportunidade que tenho de me envolver em tudo, dessa oportunidade de estar neste campo da guerra, nesse teatro vazio da guerra...” (p. 91)

Literatura da morte viva (p. 93)

“A escrita da literatura é aquela que apresenta um problema em cada livro, em cada escritor, em cada livro de cada escritor. E sem a qual não há escritor, não há livro, não há nada. E a partir daí parece que também podemos dizer que, por causa disso, talvez não haja mais nada.” (p. 93)

O colapso silencioso do mundo (p. 93)
A sombra dos que observam rios (p. 101)
Medo do visível das coisas (p. 102)
Adorável e breve coincidência (p. 104)
Gritos ditos com as mãos (p. 107)
A cor de seus olhos atrás das janelas da prisão (p. 110)

“Com as mãos vazias, eles olhavam para fora. Os verões. Os invernos. O céu. O mar. E o vento.
– Era assim que eles faziam com Deus. Falavam com Deus como as crianças brincam.” (p. 111)

“Olhe pra ela.
Ela.
Feche os olhos.
Você vê esse abandono.
– Sim. Vejo.” (p. 115)
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Victor Almeida autor 04/11/2021

Decepção
Não era bem o que esperava. A primeira parte funciona. Mas as demais não achei muito úteis para quem procura reflexões sobre o ofício da escrita.
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Arodahnos 09/01/2022

La voix de Marguerite Duras
C'était le premier livre de Marguerite Duras que je lis en français. Il avait d'autres que j'avais lu en portugais. Dans tout les cinq petit textes je retrouve sa façon d'écrire, très passionnant. C'est intimiste et, encore, ça écriture a un mouvement qui tourne, reviens. C'est comme si elle écrit dans son journal, comme si elle murmure et essaye de se souvenir. C'est toujours un souvenir à récupérer. Ce sont de raisons pour lesquelles j'adore lire ses livres. C'est intimiste, délicat, mélancolique. Tout ça. C'est sa voix un peu plus avec nous.
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Renata 16/01/2022

Não só sobre a escrita
Marguerite Duras foi uma autora incrível, que publicou uma imensa quantidade de livros, produziu filmes, etc. Este livro contém ensaios, textos-filme, no qual ela reflete sobre diversos temas, em principal a escrita. E a escrita dela é extremamente poética.
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Taiane Martins 16/01/2022

Achei que seria melhor
Tinha lido algumas coisas a respeito e esperava mais. O ensaio que dá título ao livro não é muito extenso, tem boas reflexões, mas é extremamente repetitivo. O que, pra mim, tira grande parte da força do que ela está tentando refletir.

Ao ensaio seguem-se quatro textos ficcionais numa tentativa de aprofundar o que ela diz sobre a escrita. A morte do jovem aviador inglês têm a mesma estética de repetir e repetir, não apenas o pensamento, mas as frases (achei demais, não deu funcionou) mas tirando isso é um bom texto.

De Roma (terceiro texto) gostei um pouco mais e os últimos dois não fizeram muita diferença (ademais, são os mais curtos).

A edição da Relicário está linda e caprichada. Não é um livro ruim, mas também não é tudo aquilo que ando lendo por aí.
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Felipe 25/01/2022

Acaba muito antes do fim
O livro começa muito bem, e gostei bastante da primeira parte, porque ela cumpre o esperado, trazendo as reflexões da autora sobre o ofício da escrita. Marguerite Duras, de modo muito honesto e inspirador, nos fala de seu processo criativo e de como se molda um escritor. As demais partes, entretanto, são narrativas que destoam do tema principal, afastando-se da proposta do livro. Tanto no conjunto quanto isoladamente, essas partes seguintes me pareceram muito fracas, como exercícios de escrita pouco consistentes.
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Alanna Fernandes 15/10/2022

Quem sou eu pra criticar uma escritora consagrada, né? Mas vamo lá ¯?\?_?(???)?_?/?¯

O primeiro capítulo é maravilhoso, ela fala da relação dela com a escrita.

Mas o resto é muito ruim! O estilo de escrita dela não me agradou nem um pouco. Ela é exaustivamente repetitiva, parece aqueles adolescentes que vai apresentar um trabalho para o qual não estudou e fica enchendo linguiça e passando vergonha. Alguns parágrafos enormes, outros muito pequenos. Me parece que a autora não tinha critério nenhum. Algumas descrições irrelevantes para o todo da narrativa. Narrativa essa que não chega a lugar nenhum, vai amassando barro até você ficar enlouquecido e querer largar o livro. Umas histórias desinteressantes, pobres.

Que triste esse livro ter sido tão caro...
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Thais CardBeg 22/10/2022

Maravilhosa
Como sempre maravilhosa, Duras nos leva a refletir sobre sua necessidade para escrever e como ela se casa com a própria vida, sua respiração, seu resgistro.pessoal e sob endereçamento de ver e refletir o mundo. Agradeço, MARGUERITE, por retornar a vontade de escrita.
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oipedro 20/11/2022

Escrever
Não é um livro pra ler de uma vez, li em gotas durante o ano inteiro. Posso dizer que de certa forma Duras me acompanhou em 2022. Escrever seja o livro ou o verbo é colocar em ação aquilo que ruge dentro de cada um, seria como construir uma casa. Alicerces, tijolos, concretos, paredes, janelas, portas, vidros, tintas, canos, piso. Cada palavra sustenta um mundo inteiro.
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Jasmine 01/12/2022

Impressões sobre ?Escrever?, de Marguerite Duras
Diante da escrita arrebatadora de Marguerite Duras, terminei a leitura com a sensação muito forte e real de mudez, não pelo vazio da emoção, mas pelo preenchimento numa tal capacidade que dificulta o passo, como quando estamos imersos na completa escuridão ou no absoluto incandescente do Sol.

Uma escrita que é vida, mas também é morte; escrita que é solidão, mas também outra coisa que se alimenta do isolamento de quem escreve; ?um estado de dor sem sofrimento? ou até prazer. A escrita que jamais abandona, companheira invisível que só se aproxima e existe na solidão. E, nesta solidão, cabe muito bem o mutismo racional, proposital, enquanto se escreve um livro. A escrita durassiana é selvagem e não existe sem a força do corpo, do que atravessa a carne e interpela a noite. É a contradição, o absurdo, o impossível, o grito e o desconhecido. Não é passatempo, mas o ?luto-negro de toda a vida?.

?Escrever? está dividido em cinco ensaios, e o primeiro tem esse mesmo título, que contém a substância primordial que aparece nos outros textos e ao mesmo tempo os conecta. Em ?A morte do jovem aviador inglês? está o indizível e, de novo, aquilo que se sente tanto, naquele raro e incômodo jeito obsessivo e dolorido de não entender, não poder dizer, mas precisar escrever. Depois do último parágrafo desse texto, pensei: a escrita seria, pois, um caminho para perseguir o infinito? Um veículo que atravessa a paisagem só para vê-la melhor, mas nunca para inventá-la, porque ela existe e nunca morre. Mas eu não sei e, ainda bem, havia uma página em branco logo em seguida. Fico nesta página em branco.

Na sequência, os textos ?Roma? e ?O número puro? - sobre este, Duras disseca a pureza alemã e o peso da morte endêmica dos judeus, para, ao fim, criar o muro do proletariado, na inocência do número. Brilhante, eu diria! E, por último, para alimentar essa mudez de que falei no início, ?A exposição da pintura?, em sete páginas que parecem a etnografia do belo, da arte, do texto, da escrita e, por que não, da vida.
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Priscila 16/01/2023

Não é para ser lido de uma vez só, mas eu li
Iniciei a leitura numa livraria e fiquei abismada com as palavras de Duras. Deu vontade de perguntar para as pessoas se elas já tinham se dado conta do que estava sendo dito ali.
Acho que fiz descobrimentos.
Lerei outras vezes e talvez muitas outras vezes.
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