jmrainho 20/05/2023
Racismo estrutural e recreacionista
Este livro mostra como é difícil se livrar do racismo e dos preconceitos, e como eles perduram reforçados por hábitos sociais e familiares. Ambientado na cidade de Jackson, capital do Mississipi (EUA), terra natal da autora, a trama se passa no início dos anos 60 e fala das relações conflitantes de patroas brancas e suas empregadas negras. Como as brancas achavam natural inferiorizar e humilhar suas empregadas e se vingar delas e de seus maridos, colocando todos em lista negras da comunidade, caso fossem afrontadas de alguma forma.
Quando li esse livro acontecia aqui no Brasil um pseudo-humorista, um babaca chamado Leo Lins que teve seus videos retirados do Youtube pela Justiça de São Paulo, devido ao seu conteúdo racista, não são com negros, mas com índios, gays, e outros grupos minorizados. Uma parte da sociedade, inclusive o corporativismo de humorista famosos, chamou isso de censura. Esquecem que existe uma lei que criminaliza o racismo. Ele deveria estar preso. Esse é o chamado, hipocritamente de racismo recreacionista. Aquele que pode ser visto nas famílias, nas escolas, nas empresas, nos comentários mais escondidos nos banheiros, e nos stand-ups de mal gostos. E assim é perpetuado de pai para filho e reforça uma mancha social em grupos sociais e econômicos.
Outro olhar: aqui perto de minha casa existe um estabelecimento de ensino chamada Escola Ariana. Frequentada apenas por filhos de branco de classe média alta. Não se tocam que o termo ariano lembra políticas higienistas e o próprio nazismo. Os pais não ligam. Imagino que ali serve como pedágio para impedir que seus filhos se relacionem com negros e negras, e o que é pior, namorem ou até case com uma ou um deles. Então esses pais não admitem ser racistas, mas se precavem do contato que abominam.
Então o racismo estrutural contamina nossa sociedade. Se não existisse a Lei Áurea, alvo de protestos na época, não iriam ser práticas de ESG e empresas ou benemerência de clubes de serviços que acabariam com a escravidão. Foi preciso leis. E mesmo assim muita gente procura descumpri-la. Vejam as inúmeras denuncias de trabalho análogos a escravidão nas fazendas e casas brasileiras, com inúmeros trabalhadores e trabalhadoras sendo resgatadas todos os meses. É abominável e chocante.
O livro mostra uma realidade de bullying e injustiça contra empregadas domésticas que persiste ainda hoje. E os brancos não percebem ou acham normal. A própria autora, branca, lembra como é difícil um branco falar do sofrimento de um negro, mode sim, colocar-se em sua pele, praticar a empatia. Ela declarou a respeito: "Não pretendo pensar que sei como era ser uma mulher negra no Mississippi, sobretudo nos anos 1960. Acho que é algo que uma mulher branca que paga o salário de uma mulher negra jamais poderá entender completamente. Mas tentar entender é vital para a nossa humanidade”.
Kathryn teve uma empregada negra que amou e cuidou dela em sua infância, em um momento difícil que foi para ela a separação dos pais. Esse ponto originou a ficção. Mostra o afeto de empregadas negras pelos filhos das brancas, e como esse sentimento é pouco valorizado por quem contrata.
Foi o livro de estreia da autora. Mas sua qualidade se explica por ter frequentado bons cursos de escrita criativa e atuar como editora de revistas. A obra inspirou o filme Histórias Cruzadas (The Help), candidato ao Oscar de 2012 com cinco indicações, e ganhou como Melhor Atriz Coadjuvante. O livro rapidamente se tornou um best-seller, e o filme foi campeão de bilheteria. A autora demorou cinco anos para escrever a obra, que foi rejeitada por 60 editoras.