caio.lobo. 21/08/2020
Por que não li Montaigne antes na minha vida?
Opinião, mudança de opinião, erros de opinião, inconstância, canibalismo, diferanças culturais, morte, sexo, impotência, erros médicos, maltrato aos animais, fé, educação, língua latina, aproveitar os pequenos prazeres e muito mais são os temas dessa edição condensada dos Ensaios de Montaigne (o "Ensaios" completo é muito maior que essa edição, mas com essa "pequena" edição já tive o gostinho de quero mais.
Percebemos a personalidade doce de Montaigne nos seus textos, sempre muito sinceros, elucidativos e longânimo. Parece realmente que ele conversa com a gente, nos aconselhando, desabafando, contando piada, botando dedo na ferida; imagine no século XVI já falar dos erros dos europeus que vieram ao Novo Mundo quando tentaram submeter populações. Aliás, Montaigne cita o Brasil, fala dos relatos que ouviu das maravilhas naturais e fala de nós brasileiros, os primeiros brasileiros que viviam aqui; Montaigne exalta a dignidade moral dos índios, que nunca pensam em torturar alguém antes de matar, assim como os espanhóis e portugueses faziam. O índios matavam e comiam os inimigos sem maltratar, mas o que dizer dos europeus que judiavam e matavam para nada...nem para comer a carcaça destruída. Esse ensaio sobre o Brasil inspirou Shakespeare a escrever sua peça "A Tempestade"; Montaigne, Brasil e Shakespeare unidos historicamente.
Outros pontos interessantes: a educação que seu magnífico pai lhe dá, fazendo com que Montaigne tenha como primeira língua o latim e só depois o francês, além de que seu magnífico pai botou ele para morar com os pobres algum tempo para aprender como é viver com menos e a saber a defender os pobres. Montaigne acha horrível o maltrato aos animais, vendo como uma atitude realmente desumana. Montaigne fala de sexo abertamente, fala que as mulheres podem ter os mesmo impulsos sexuais que os homens e que isso é natural e que podiam se satisfazer também; fala com tristeza de sua impotência sexual (um homem a frente de seu tempo por não se envergonhar por algo natural) e reclama da crueldade que uma mulher pode ter ao desprezar um homem por conta disso, mas também entende que a mulher fica entediada esperando a ação, mas para que reclamar? Todos os homens ficaram assim na velhice. Montaigne ri do seu pinto não ser tão grosso e que depois de velho piorou. Montaigne ri das pessoas que se acham sabichonas. Montaigne fica com raiva dos médicos que o privam das coisas boas da vida, tentando evitar a dor de uma doença com a perda do prazer; ele prefere aprender a suportar sua dor e poder saborear boas comidas, dormir tarde, se deliciar; pior quando o médico dá um remédio que para melhorar uma coisa piora outra.
Mas os pontos mais gostosos de ler para mim foi sobre morte. Montaigne ensina a aproveitar a vida e ensina a aproveitar a morte também, não adianta reclamar pois ela vai chegar. A morte e a motriz da filosofia, por isso para se viver bem precisamos pensar na morte, os conformamos com ela, além de se conformar com as doenças e fraquezas da velhice. E é melhor começarmos a pensar já na morte, para ela não nos pegar de surpresa, pois tem algo pior que receber a visita de alguém de repente e estar tudo bagunçado?
Montaigne realmente se torna um amigo da gente, ler seus Ensaios foi uma das melhores coisas que li nesse ano que para alguns foi fatídico por conta do Coronavírus, mas para Montaigne seria um ano que se deveria aceitar como ele é, e ele ainda aproveitaria para ler bons livros e ter boas conversas.