Lucas1429 13/08/2020
A paranoia angelina setentista
Em Vício Inerente, Thomas Pynchon retrata a Los Angeles dos anos 70 de forma magistral. A obra é conduzida através de um narrador em terceira pessoa que a todo momento ilumina o detetive particular Larry "Doc" Sportello. O personagem é ótimo, divertido, e, bom, paranoico. Em determinados momentos Pynchon consegue construir o ambiente de confusão pela própria dificuldade do personagem, graças às drogas, de distinguir a realidade do que ele imagina, ou daquilo que é espiritual, chegando a determinados momentos em que o mesmo perde o controle até sobre o que diz ou deixa de dizer.
O autor é amplamente enciclopédico e gosta de mostrar sua variação de conhecimentos, no caso, surf music, cabelos afro, e, muita cultura pop da época. Todavia, as informações não acabam funcionando como uma masturbação intelectual, mas sim, como uma imersão no contexto em que a história se passa.
A escrita do autor é marcada por cortes quase que repentinos de cena e construções rápidas, assemelhando-se a um pensamento, o que também acompanha o método do próprio Sportello de investigar, que, diferentemente dos famosos detetives da literatura, apenas segue o que lhe aparece, não tem organização alguma, o que pode confundir o leitor. (Apenas entre na paranoia e isso não será problema).
A obra é carregada de personagens que se distribuem em características de contracultura, ou contra-contracultura, e, às vezes, os personagens transitam esses dois "lados". A atmosfera paranóica que envolve o livro é criada com muita sutileza, capítulo após capítulo, conforme a mística entorno do canino dourado vai criando forças, ao mesmo tempo que a forte presença hippie é a própria paranoia para os mais conservadores (contra-contracultura), devido ao recente incidente Mason. Aqui temos um ponto essencial, acredito que por mais que algumas oportunidades possam ter sido "perdidas" por Pynchon, como no personagem de Mickey Wolffmann, ou até mesmo nas possibilidades da "cidade perdida", ou do canino dourado. Penso que o ponto da história não era esse, era, essencialmente, a paranoia angelina setentista; os hippies paranoicos, sejam por consequência das drogas ou dos movimentos conservadores ou organizações secretas de dentistas, e, os conservadores, pelo recente episódio da Família Manson, o que incendeia uma dúvida ferrenha sob o aspecto passivo e pacífico dos hippies, como todos sendo assassinos em potencial, além da questão Macarthista, que, num pano de fundo, também se espalha.
Vício Inerente foi meu primeiro contato com a obra de Pynchon e anseio pela próxima leitura. Recomendo.