Marcelo Stepon 13/07/2016minha estanteA TERRA DESOLADA ( T.S. Eliot )
( por Marcelo Steponkevicius, poeta )
Realizado entre 1920 e 1921 e publicado em 1922, ?The Waste Land?, de T. S. Eliot (1888-1965) é considerado por muitos críticos o mais importante poema do século XX, quiçá dos mais importantes de todos os tempos. Faz uma vasta exploração poética da esterilidade da vida moderna tendo como referência a destruição da Europa após a Primeira Guerra Mundial. Logo no primeiro verso da obra : ?Abril é o mais cruel dos meses...? percebemos metaforicamente a noção de uma agonia , qual seja , a da chegada incerta da primavera ao hemisfério norte, ao mundo. Ao final do poema, o leitor se depara com questões fundamentais à humanidade : ainda germinará a primavera para a humanidade? Uma humanidade auto-destrutiva e impotente diante de seu próprio destino.
Após os horrores da Primeira Guerra Mundial, T. S. Eliot, descreveu em seu poema liricamente um mundo no qual o potencial humano de destruição deixou a humanidade estéril e aponta para a crise da cultura ocidental repleta de destruição e contaminada pela barbárie desde seu início até o pós primeira guerra mundial.
Das cinco partes do poema A Terra Desolada há muitas referências e citações, como um caleidoscópio , um verdadeiro diálogo com a literatura européia, à literatura indiana e à Antiguidade clássica. Homero, Dante Alighieri (1265-1321), Virgílio (70-19 a.C.), William Blake (1757-1827), William Shakespeare (1564-1616), Baudelaire, etc além de canções populares, passagens e citações em seis línguas estrangeiras, inclusive frases em sânscrito aparecem metaforicamente para dar corpo à obra.
O Poema está repleto de ricas e densas metáforas ligadas a temas recorrentes como a chuva, a esterilidade principalmente , a violação, a barbárie , a ruína da civilização e da vida pessoal e social , costuradas numa ligação entre passado e presente ?atemporal ? remetendo-se a toda experiência da vida e da organização social humana.
Em The Waste Land a cultura, a moral, estética, religião, sociedade e sujeito aparecem mutilados metaforicamente ; Eliot cria uma ? estética da fragmentação? tentando construir uma imagem e história do homem a partir de imagens rotas, fragmentadas.
Símbolo da civilização sem rumo do pós-Primeira Guerra, este grande poema contribuiu decisivamente - ao longo de seus mais de 400 versos - para sedimentar as bases do modernismo tentando traduzir o universo de infertilidade do pós guerra, das incertezas do homem diante de seu passado e de seu futuro .
O poema é dividido em cindo capítulos ; saindo do lugar comum não organizados exatamente dentro de uma sequência lógica ; são eles : I. O Enterro dos Mortos II. Uma Partida de Xadrez III. O Sermão do Fogo IV. Morte pela Água V. O Que Disse o Trovão
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A Terra Desolada (T. S. Eliot)
I. O Enterro dos Mortos
Abril é o mais cruel dos meses, germina
Lilases da terra morta, mistura
Memória e desejo, aviva
Agônicas raízes com a chuva da primavera.
O inverno nos agasalhava, envolvendo
A terra em neve deslembrada, nutrindo
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.
O verão; nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee
Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos
E ao sol caminhamos pelas aleias de Hofgarten,
Tomamos café, e por uma hora conversamos...
Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham
Nessa imundície pedregosa? Filho do homem,
Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces
Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol,
E as árvores mortas já não mais te abrigam,
nem te consola o canto dos grilos,
E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas
Uma sombra medra sob esta rocha escarlate.
(Chega-te à sombra desta rocha escarlate),
E vou mostrar-te algo distinto
De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece
Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando;
Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó...
Cidade irreal,
Sob a fulva neblina de uma aurora de inverno,
Fluía a multidão pela Ponte de Londres, eram tantos,
Jamais pensei que a morte a tantos destruíra.
Breves e entrecortados, os suspiros exalavam,
E cada homem fincava o olhar adiante de seus pés.
Galgava a colina e percorria a King William Street,
Até onde Saint Mary Woolnoth marcava as horas
Com um dobre surdo ao fim da nona badalada.
Vi alguém que conhecia, e o fiz parar, aos gritos: "Stetson,
Tu que estiveste comigo nas galeras de Mylae!
O cadáver que plantaste ano passado em teu jardim
Já começou a brotar? Dará flores este ano?
Ou foi a imprevista geada que o perturbou em seu leito?
Conserva o cão à distância, esse amigo do homem,
Ou ele virá com suas unhas outra vez desenterrá-lo!
Tu! Hypocrite lecteur! - mon semblable -, mon frère!"
(Trechos de Terra Desolada, de T. S. Eliot. Tradução de Ivan Junqueira)