Paulo 21/11/2014
melhor a cada releitura
A Trilogia Nikopol é um quadrinho que quanto mais eu paro pra pensar nele, quanto mais eu absorvo as suas ideias e reflito sobre a sua história, mais eu gosto. Não é uma leitura fácil. Veja, Enki Bilal não é um quadrinista que segue aquela linearidade convencional que encontramos na maioria dos quadrinhos ocidentais, e porque não, orientais. Porém, nem por isso A Trilogia é um quadrinho confuso: a história básica é bem linear e simples de se acompanhar. Mas o que torna esse quadrinho acima da média são as reflexões que podemos fazer encima desse universo insano criado pelo Bilal. A visão de mundo que o autor nos apresenta guarda muitas semelhanças com o nosso próprio tempo, seja no domínio político que as grandes corporações passaram a ter, no altíssimo nível de corrupção, seja nas mudanças e bizarrices climáticas ou no descaso e abandono dos menos afortunados, na farsa política, nas chantagens dos grupos com o poder em vigor ou nas ameaças dos descontentes com esse poder. A Trilogia Nikopol fala sobre a brevidade da vida humana, e sobre a incoerência de um sistema que não sente o que é ser humano para cada indivíduo, não importa a que casta pertença. Ekil toca nas mais ocultas feridas sociais, passando pela religião, questionando o o modo como governos e ideologias são obedecidos, e como se erguem e caem com uma facilidade impressionante. Dos três volumes compilados na belíssima edição da editora Nemo, o mais fraquinho é A Mulher Armadilha, que apresenta boas ideias, mas não me mostrou a que veio. A arte é belíssima, mas extremamente suja, assim como é o distópico mundo de Bilal. Vale ressaltar a sua criatividade e a falta de medo para criar os cenários e personagens mais bizarros possíveis. Enfim, é uma obra recomendadíssima, apesar de não ser nada convencional e poder causar estranheza aos não iniciados em quadrinhos europeus. Para se ter na estante e emprestar pros amigos, pra depois rolar aquela discussão a respeito de suas interpretações.