NatashaIshida 20/03/2012
Para os preguiçosos ou que reclamam que os textos são longos, já aviso, essa crítica não tinha como ser reduzida, e tenho três motivos pra isso. O primeiro é: não consigo falar desse livro sem pensar em mil e um detalhes que gostaria de compartilhar. O segundo: não falarei apenas de um único livro aqui, como ocorreu nos outros posts de crítica. O terceiro: O menor livro da série até agora tem 591 páginas e muitos detalhes, e pretendo comentar tudo que penso a respeito dele. Aqui será comentado sobre os três primeiros volumes: A Guerra dos Tronos, A Fúria dos Reis e A Tormenta das Espadas, mas não com detalhes sobre cada um e sim como a série em um todo.
A primeira coisa que eu tenho a dizer é NÃO SE APEGUE A NENHUM PERSONAGEM. No início, quando os personagens que eu gostava começaram a morrer, senti raiva e achava que isso estragaria muita coisa no livro. Mas agora que acostumei, começo a pensar que isso traz muito benefícios. Além de evitar que a história seja facilmente adivinhada, quebra todo tipo de expectativa que sua mente cria sobre o rumo dos acontecimentos, isso geralmente acaba logo no primeiro livro. A frase Valar morghulis é apresentada no segundo livro, e o real significado só aparece no terceiro, este significado explica sem rodeios por quê quase todo mundo da série morre.
Comecei a achar que a divisão por crônicas é muito melhor que por capítulos, talvez seja isso que faz com que o livro seja tão volumoso. Porém, apesar de ser uma leitura muito extensa, são poucas as vezes que se torna cansativa, depende muito do ritmo que o leitor pegar. As crônicas permitem que os detalhes apareçam mais, que a cronologia seja um pouco esquecida e os personagens tenham muito mais profundidade. Não acontecem em sequência, muitas vezes o que está se passando na crônica de um personagem é bem depois do que vai ser passado na próxima. Eu reparei também que a escrita do autor modifica em cada uma delas, por exemplo, as crônicas da Sansa são repletas de palavras de tom calmo e doce, nenhum vocabulário pesado; já as crônicas do Tyrion, as palavras são mais ácidas e recheadas por um tom rude e sarcástico. E não me refiro ao diálogo, e sim à narração ou descrição, isso faz com que o leitor sinta mais as características do personagem. Também é ótimo para mostrar o quanto a mente de cada personagem funciona, ocorre muito com a Sansa e Tyrion no terceiro livro.
Algumas coisas você passa a entender apenas no terceiro livro propositalmente, achei até que eu é que tinha entendido com lentidão, mas é isso que o autor pretende, ele precisa de uma cena pra explicar o porquê (eu tenho muitos exemplos, mas estou tentando o máximo possível não soltar nenhum spoiler), e isso é usado também no caráter dos personagens, alguns deles são perversos e escrotos, mas logo aparece uma cena que faz você duvidar se aquele personagem é realmente escroto como você imaginava. E geralmente, as pessoas que se mostram amigáveis são sempre as menos confiáveis, acho que George R. R. Martin está tentando esfregar na nossa cara essa verdade universal.
As adolescentes do livro são irritantes, ainda não sei se essa característica está sendo apresentada agora para depois elas se tornarem mais sábias, ou se o autor só que passar a mensagem “adolescentes que estão lendo, tá vendo como vocês são chatas?”. Em quase todas as crônicas da Sansa ou da Daenerys eu me irritava com alguma coisa que elas pensavam ou faziam, e é bom reparar que uma delas está em Westeros e a outra do outro lado do mar, mas ainda assim são tão semelhantes.
A medida que se passam os volumes, a história começa a ser ainda mais violenta e pornográfica, e cada vez mais emocionante e recheada de humor negro. Me irritei um pouco com a enrolação em A Tormenta das Espadas, que ficava fazendo alguns personagens percorrerem todo o mapa de Westeros várias e várias vezes, como foi o caso da Arya Stark, apesar de isso justificar algumas coisas que acontecem, gostaria que ela não tivesse passado tanto tendo vagando de um lado pro outro.
Algo importante notar é como as pessoas que estão de fora não entendem as coisas e só pensam que entendem, nos faz refletir sobre o nosso cotidiano. Existe um personagem que é bom, apesar de tudo, mas só por causa das fofocas e picuinhas que cercam o reino as pessoas “comuns” odeiam ele, e é frequente tentarem atirar estrume nele sempre que aparece em público. Essa fofoca é o que faz tudo se movimentar, às vezes um pequeno comentário bobo faz com que haja uma enorme confusão.
A fantasia no livro é bem diferente daquela que está presente em Senhor dos Anéis, mas só usei esse exemplo pra explicar, eu me recuso de todas as formas a comparar o Tolkien com o Martin e participar dessa briguinha de crianças, cada um é bom na sua própria forma. A fantasia usada por Martin não envolve seres de mitologias como elfos e anões, apesar dos gigantes e alguns outros seres estarem presentes, o foco não é esse. Bem no início do primeiro livro são apresentados os Outros, mas para que você tenha a emoção de ler a respeito deles, não irei comentar mais nada. A partir de Tormenta das Espadas você consegue entender realmente por quê os livros se chamam Crônicas de Gelo e Fogo, apesar de ser bem subjetivo. Logo no início quando aparecem os Outros pela primeira vez você já tem uma idéia de que eles são importantes na história, o problema é que ao longo dos outros livros eles são deixados de lado, mas quando voltam a aparecer e você começa a entender o propósito daquilo tudo, seu cérebro explode e logo você terá de limpar massa cinzenta do teto.
Quanto à Game of Thrones da HBO, por enquanto está sendo muito fiel e a adaptação está sendo muito boa mesmo. “Posso ver só a série pra saber o que está nos livros?”. Não. E por que? Nos livros, até se o personagem está desconfortável na cadeira você fica sabendo, o que está passando na cabeça dele está lá, escrito. E a HBO tirou algumas muitas cenas ocorridas no livro e adicionou outras desnecessárias, um exemplo pode ser Khal Drogo e Daenerys, qualquer cena do livro é desculpa para acasalarem no meio de todo mundo, isso eles não mostram. Enquanto a escrita ajuda muito a saber os detalhes e o caráter de cada um, o seriado acaba se privando disso e é um dos pontos-chave que torna o livro tão bom, além de ter de incluir cenas que no livro não aconteceriam, pelo simples fato dos personagens adultos não confiarem em ninguém. Apesar de Game of Thrones da HBO ser uma série fiel, já houve boatos que outros personagens que estão vivos no livro irão morrer e ao meu ver, isso pode tomar um rumo completamente diferente.
Os apêndices dos livros servem para você se guiar entre todos os 99999999999 nomes que aparecem nos livros e para se aprofundar mais nas famílias, mas talvez seja desnecessário ler.
Crônicas de Gelo e Fogo conseguiu se tornar minha série favorita, até mesmo levando as trilogias em consideração. Eu nunca fiquei tão apegada a uma história como me apeguei a essa. Quando terminei de ler, apenas 30 minutos depois eu já conseguia sentir falta da narração e dos personagens e eu senti uma enorme vontade de ler novamente só pra matar a saudade. Recomendo a qualquer pessoa que quer um livro de qualidade e que queira dedicar um bom tempo em leitura.
É uma série para adultos, de fato, mas tantas lições de vida podem ser retiradas desse livro. Não confie na primeira pessoa amigável que aparecer na sua frente. As vezes as pessoas tem motivos pra serem tão perversas. Nem mesmo os reis tem uma vida fácil. Valar Morghulis.
Curtiu a crítica? Acessa pra ver mais: http://nerdandstuff.wordpress.com/2012/01/12/critica-cronicas-de-gelo-e-fogo-valar-morghulis/