Mariana Soares 06/04/2012[Resenha] Quase Noite - Alice Sebold"No final das contas, matar minha mãe foi bem fácil. A demência, conforme desponta, tem o poder de revelar o âmago da pessoa afetada. O âmago de mamãe era podre como a água fétida de um vaso de flores mortas. Ela era bela quando meu pai a conheceu e ainda capaz de amar quando eu, filha temporã, nasci. Mas, naquele dia, ao me encarar com seus olhos vidrados, nada disso importava mais". (p.7)
É assim que Alice Sebold começa a narrativa do matricídio cometido pela personagem principal, Helen Knightly. A trama se passa em uma pequena cidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, em um subúrbio típico da classe média, onde a rotina impera e nada de diferente acontece, até aquele momento.
Acompanhamos com Helen as 48 horas que se seguem ao assassinato. Não só mergulhamos com ela em suas lembranças (quando nos apresenta fatos do seu passado permeados pela doença mental da mãe e pela fraqueza moral do pai), como também vivenciamos as questões práticas do seu ato, como: o que fazer com o corpo, como contar as filhas, como reagir à polícia, etc.
Essa alternância entre passado e presente é, inclusive, um dos fatores negativos do livro. Tornou a leitura confusa, fazendo com que tivesse que voltar e reler vários trechos.
A protagonista, através de suas memórias, tenta justificar seus atos, não só para si mesma como também tenta nos convencer de sua atitude desesperada. No entanto, sua insanidade não ficou restrita ao crime, Helen deixa aflorar os pensamentos mais absurdos e acaba colocando-os em prática, sem se importar com as consequências que seus atos terão não só a ela mesma, mas também sobre as pessoas com quem mantém contato. No fundo, ela sabe que responderá pela sua conduta, mas isso parece insuficiente para trazê-la de volta à realidade.
Vale ressaltar que o livro está escrito em primeira pessoa, o que nos faz ter uma visão unilateral dos fatos. Portanto, é difícil analisar se os fatos apresentados pela personagem principal ocorreram da forma com que ela conta.
Confesso ter comprado esse livro sem ao menos ler a sinopse. Depois de ler os outros livros da autora, "Sorte - Um caso de estupro" e "Uma Vida Interrompida - Memórias de um anjo assassinado" tornei-me uma grande admiradora de seu trabalho.
Assim como suas outras obras, "Quase Noite" é uma história pesada, densa e cruel. Daquelas que, por vezes, precisamos largar o livro para digerir tudo que foi contado até o momento, para só então retomar a leitura.
Até para mim, que sempre gostei de livros fortes e instigantes, é uma leitura perturbadora. Então, só indico para aqueles que estão dispostos a respirar fundo e encarar essa complexa relação entre mãe e filha, em que a linha entre o amor e o ódio é mais tênue do que nunca.
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