Paulo 25/10/2020
Li e reli
Morreste-me é um livro curto que li ontem e reli hoje. Mesmo breve, o livro passa muitas experiências emotivas escritas sobre alguém próximo que já se foi, que já não é mais. Repleto de memórias, onde cada cena ou objeto desperta imagens e sensações de tempos idos, dos quais agora só restou a saudade (palavra essa que não me lembro ter visto no livro).
É muito bonito como os portugueses escrevem o idioma. A escrita é poética, e as palavras parecem carregar mais sentidos do que apenas aqueles que elas têm no dicionário. É como Pujol Filho diz na orelha do livro: “Perceber que, como mesmo dicionário e a mesma gramática, se faz outra língua”.
Dentre todos os trechos que gostei, transcrevo aqui um que se trata do tema que mais me fascina: o tempo - ainda mais quando ele está aliado da morte, que nada deixa escapar exceto o tempo. Ei-lo: “Parada no ar, a minha mão dirigiu-se à tua gaveta. E, onde o pousaste cansado, o teu relógio de pulso, ainda à tua espera, ainda a passar os segundos: um outro outro outro: segundos a sobreporem-se ainda, mesmo depois de ti, ainda segundos e tempo, como se nada lhes tivesse alterado o labor ténue de tecer o fio delgado interminável, como se fosse interminável o tempo, o fio ténue, como se não pudesse ser cortado a qualquer instante, a qualquer segundo, como se não tivesse sido cortado, abruptamente cortado, para nunca mais voltar a se unir, nunca mais nos voltar a unir.”