Naiara 14/01/2013
O que é cinema?
Jean-Claude Bernardet, professor da Universidade de São Paulo, procura abordar neste ensaio alguns momentos da história do cinema que foram relevantes, ou que marcaram por apresentar mudanças na produção cinematográfica – avanços, inovações de estilo, edição, enquadramento, etc. Contudo, é chegada ao fim a leitura e a pergunta “O que é cinema?” para o autor continua sem uma resposta, afirmando ele não ser possível responder a tão “pretensiosa” pergunta. Assim, o que ele propõe é que façamos um passeio por esses anos de vida de sua existência.
O autor relembra o episódio que, para a historiografia, ficou conhecida como a primeira exibição da máquina criada pelos irmão Lumière. O primeiro filme – com poucos minutos, sem som, sem narrativa ou mesmo sem uma história para ser apresentada – mostrava a chegada de um trem na estação, gravado em um ângulo capaz de pegá-lo ainda ao longe e vindo aproximando-se na direção da câmera. Essa cena, bastante conhecida por quem trabalha com a história do cinema, ficou famosa pela reação da plateia – receosos com o trem vindo na direção deles, a maioria se apavorou, se assustou, ou saiu correndo. Para o autor, tal episódio trazia o que seria característica presente nos filmes, a ilusão – “impressão de realidade, foi provavelmente a base do grande sucesso do cinema” (pág. 12).
Em seguida, o autor busca compreender melhor como o cinema, que inicialmente não foi visto como um divertimento (o mesmo foi criado no intuito de ajudar à ciência), vai se constituindo enquanto empresa e lucrando com a distribuição – os EUA, a partir da Primeira Guerra Mundial começam a investir tanto na sua produção de filmes quanto em leis que os coloquem nas salas de exibição dos cinemas exteriores (dentre eles, a Europa era um dos maiores focos de distribuição). Observando alguns conceitos presentes em Marx, o autor faz-nos perceber como se uma mercadoria a ser trocada e o quanto ela precisa divulgar, pois seu produto não pode ser testado – o primeiro contato (o momento de compra do ingresso, do assento para aquela sessão específica), para o autor, já se está consumindo. E mais, no momento em que um número x de poltronas para uma determinada sessão não foram preenchidas, ali se resulta em perda de dinheiro, o qual não mais poderá ser recuperado.
O capítulo A luta pela linguagem o autor trás a chegada da narratividade – o contar histórias – como algo que era o projeto do cinema nos idos de 1915. Assim, afirma: “A linguagem desenvolveu-se, portanto, para tornar o cinema apto a contar histórias; outras opções teriam sido possíveis, de forma que o cinema desenvolvesse uma linguagem científica ou ensaística, mas foi a linguagem da ficção que predominou. Os passos fundamentais para a elaboração dessa linguagem foram a criação de estruturas narrativas e a relação com o espaço” (pág. 33). Neste capítulo então, o autor trás a tona alguns conceitos de cinema importantes tanto para o entendimento de um filme quando se quer analisá-lo quanto para o acompanhamento do desenvolver do cinema.
Observaremos agora algumas técnicas que facilitaram aos cineastas nessa empreitada de contar histórias. A primeira delas está na movimentação da câmera, agora permitida por conta do travelings (ou carrinhos) e pelos planos panorâmicos (pág. 34). A partir daí o espaço – outro ponto observado – pode ser mais explorado. Agora podia-se filmar um pedaço do corpo de uma pessoa à um horizonte em diversos ângulos, com câmera alta ou baixa (cada uma com um significado específico). Nessa análise alguns termos técnicos são dignos de menção aqui: plano (uma cena entre os cortes realizados pela montagem), ângulo (a posição em que a câmera é posta para a tomada) e, dentre os planos, podemos ter o plano geral, o plano de conjunto, o plano médio, o plano americano, o primeiro plano e o primeiríssimo plano (sendo todos eles um modelo de tabela tipicamente europeu) .
Um ponto importante mencionado por ele de maneira um tanto rápida é o surgimento do star system, o qual cria estrelas para os filmes responsáveis, na maioria das vezes, pelo grande sucesso que um filme venha a alcançar. Assim, exemplos como Marylin Monroe, Marlon Brando, dentre outros, se tornavam a marca divulgadora do filme e o ator/personagem (misturando-se frequentemente) querido da plateia (que, na maioria das vezes, ia para ver o ator/atriz mais do que ao filme em si). Seguindo tal discussão, afirma o autor: “um diretor que planeja um filme dificilmente pensará seu projeto sem uma vedete, mesmo que preferisse trabalhar com um ator anônimo. Isso leva não a adaptação da vedete à personagem, mas a submissão do personagem à vedete” (pág. 81).
A partir dos anos 1950, o autor percebe várias modificações no campo do cinema, muitas delas talvez causadas pelo alcance da TV, além de outros fatores. Com diversos dados quantitativos ele observa a diminuição tanto das salas quanto das pessoas que frequentavam o cinema enquanto se registrava significativos aumentos nas redes de TV. Os anos 1950 começa também a registrar diversos movimentos nacionais de valorização de seu próprio cinema. Assim, ele elenca o neorrealismo na Itália, a Nouvelle Vague na França, o Cinema Novo no Brasil, dentre outros, trazendo um pouco de suas características e cineastas que consagraram o movimento. Para finalizar, ele dedica um tópico ao caso do Brasil, à desvalorização do filme nacional pela elite e o momento de um pouco mais de valorização quando filmes do Cinema Novo passam a ganhar prêmio em concursos na Europa.