sagonTHX 24/07/2011EXCELENTE THRILLER DE SUSPENSE HISTÓICO
Giordano Bruno é um monge italiano que se coloca na contra-corrente dos dogmas da Igreja Católica do século XVI, vivendo um período histórico conturbado onde impera a Inquisição Católica e a Reforma Protestante. Apesar das pressões religiosas, Giordano enfrenta a ortodoxia cristã com suas ideias revolucionárias sobre o universo. Mesmo sendo excomungado, fugindo da Itália para salvar a própria vida, Giordano Bruno não permite que sua voz se cale, e ela o leva a vagar erraticamente pela Europa, vivendo de favores e dando aulas em universidade para manter-se vivo. Na França, na corte do rei Henrique III, ele encontra apoio e alguma notoriedade. Posteriormente,indo em busca de liberdade de expressão entre os acadêmicos e eruditos ingleses, parte para a Inglaterra, sob o reinado da Rainha Elisabeth. Em Londres, sob a proteção de Sir Francis Walsingham, Ministro da Rainha, Giordano seguirá até a Universidade de Oxford, a pedido deste, para espionar os acadêmicos em busca de católicos remanescentes ou infiltrados, que ainda apoiam o Papa. Ao seu lado segue o amigo Philip Sidney, o qual conheceu em Pádua, na Itália, e o palatino polonês Albert Laski, um fidalgo excêntrico que está sob a proteção da rainha. Apesar de sua icumbência nada agradável, como espião da corte inglesa, portanto dos anglicanos, Giordano Bruno se aproveitará do convite feito pelo diretor de Oxford,John Underhill, para um debate sobre as suas ideias e, de quebra, em sua permanência naquela escola, procurar um livro raríssimo e condiderado uma lenda entre os livreiros. O livro foi escrito por um egípicio chamado Hermes Trimegisto, o qual viveu antes da Era Cristã. No entanto, ao contrário do que espera Giordano, os acontecimentos que o aguardam em Oxford irão colocar à prova não somente a sua recente lealdade à coroa britânica como, também, as suas próprias convicções religiosas, filosóficas, teológicas e éticas. Após presenciar um terrível assassinato, Giordano Bruno é arrastado por uma série de acontecimentos funestos e imprevisíveis que ameaçarão não somente a integridade de Oxford, mas, também, a vida de todos aqueles que se envolverem na tentativa de solver o caso.
Resumidamente, este é o escopo central de Heresia, de S.J. Parris. Um romance histórico com sofisticado requinte, repleto de reviravoltas no melhor suspense que o gênro pode oferecer.
Já de imediato quero dizer, dada as minhas boas impressões sobre o livro, que Heresia não se parece em nada ao "estilo Dan Brown". Aos leitores equivocados, sinto muito. Se iludem pensando dessa maneira, obviamente, por não saberem ler nada melhor além deste famigerado "estilo". Assim, Heresia está para Código da Vinci da mesma forma que o óleo está para a água. Apesar de os dois serem líquidos, não se misturam.
S.J. Parris pode ser comprada, sem equívocos, a Agatha Christie. Seu personagem, Giordano Bruno, ou Dr. Bruno, se preferirem, está mais para Hercules Poirot do que para Robert Langdom. E se Heresia deve ser comparado a algum outro livro, esse seria "O Nome da Rosa", de Humberto Eco.
Heresia tem muito a seu favor:
a) o estilo escolhido pela autora foi perfeito, fugindo dessa "herança maldita" de Dan Brawn, onde um expert em desvendar sinais ocultos se propõem a encontrar um segredo que, se revelado, promete
abalar os alicerceres do Cristianismo... blábláblá... Felizmente, S.J. Parris vai na mão contrária.
b) a narrativa é soberba, nem clássico demais e nem moderno demais, estruturada na medida certa, com diálogos inteligentes e uma trama bem alinhavada, consistente, factível. Apesar dos capítulos serem longos, a leitura tanscorre de forma natural e viciante. Parris lança a isca e a gente morde logo nas primeiras páginas, ficando-se preso ao anzol até a última página.
c) os personagens possuem profundidade, personalidade, carisma, enlevo, sagacidade, são inteligentes, sórdidos e asquerosos, às vezes, mas nem por isso deixam de encantar. Da mesma forma é a ambientação da Inglaterra do século XVI, sombria, escura, úmida, fria, insensível, enlameada (no sentido ambiental quanto no espiritual).
d) além do suspense bem construído, Parris também investiu no dramático e no lado sombrio do ser humano. Em nome de Deus e do Cristianosmo o ser humao prova que é capazes de atos inimagináveis. No transcorrer da leitura de Heresia, sua narrativa e ambientação me fez lembrar do filme "A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça" (Sleepy Hollow, 1999, de Tim Bourton - com Johnny Depp como Ichabod Crane).
e) o livro termina de forma surpreendente e violenta. Possui também um gancho para uma continuação, obviamente, arrancando-nos uma certa ansiosidade quanto ao segundo volume.
Apesar de todos esses pontos fortes, entre outros, Heresia possui três pontos decepcionantes:
1) a autora teria ajudado muito aos leitores que não conhecem a história real de Giordano Bruno (Nola, 1548 Roma, Campo de Fiori, 17 de fevereiro de 1600), se tivesse anexado um adendo no término do livro com uma breve biografia sobre ele. Tem muita gente que leu o livro sem saber quem foi o sagaz teólogo-filósofo Nolano do século XVI, e talvez continue assim se não consultar outros livros sobre Giordano ou o Google.
2) Parris não se aprofundou na vida do personagem histórico, e menos ainda em sua vasta bibliografia e em seus conceitos sobre o universo e o homem, o que é lamentável. O Giordano Bruno que se vê, já em Oxford, é mais um personagem de ficção do que histórico, por isso é chamado o tempo todo de Dr. Bruno, como uma espécie de Sherlock Holmes da Idade Média.
3) o grande debate entre Giordano Bruno e o diretor Underhill, tão ansiosamente aguardado, quando acontece não passa de poucos parágrafos onde, sem muita criatividade, Parris sai pela tangente para não se prolongar, ou, quem sabe, por não saber como conduzir um debate que deveria expor, com muita propriedade, toda a teoria de Giordano Bruno, defendida com paixão e entusiasmo. O que se vê é bem o contrário, e decepcionante.
Afora esses detalhes que só interessam aos que são fãs da filosofia de Giordano Bruno e tiveram o prazer de conhecer as suas obras, Heresia mantem o nível e segue adiante primando mais pelo suspense policial investigativo, que é o seu ponto forte. Afinal de contas, trata-se de uma ficção de época, e não de um tratado teológico sobre o cosmo ou o humanismo do século XVI, não é mesmo?
S. J. Parris é o pseudónimo de Stephanie Merritt. Nascida em 1974, colaborou como crítica e jornalista numa série de jornais e revistas, na rádio e na televisão. Actualmente escreve para o The Observer. Vive na Inglaterra em companhia do filho.
Prós: O suspense bem alinhavado; a ambientação de época; os diálogos; os personaens: Sophia, Dr. Bruno, Underhill, Gabriel Norris, Cobett (o Porteiro), Slythurst; o desfecho final; a capa do livro;
Contra: A autora não explora em profundidade as ideias de Giordano Bruno; o debate que, lamentavelmente, não aconteceu, apesar de ter acontecido; a falta de um adendo sobre a vida histórica e bibliografia de Giorano Bruno, no término do livro, além de um Dramatis Persona dos personagens do livro, para diferenciar os personagens históricos dos fictícios, o que nos pouparia uma consulta ao Google;
Heresia, sem dúvida alguma, é mais do que recomendado, principalmente para os que gostam de um suspense histórico, com estilo policial investigativo; para os fãs de Agatha Crhistie e Humberto Eco; para os que já conheciam a vida e obra de Giordano Bruno; e para os que odeiam Dan Brown (azar dos que só sabem ler o "estilo Dan Brown")