Arthur Bispo do Rosário

Arthur Bispo do Rosário Luciana Hidalgo




Resenhas - Arthur Bispo do Rosário


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Christiane 24/07/2021

Arthur Bispo do Rosário, esquizofrênico-paranoico ou um místico? e qual seria a diferença? penso que o que mais influencia é o contexto e a cultura onde se está, a diferença entre o louco e o santo.

Sabe-se muito pouco sobre ele no real, por causa de um registro de batismo em uma igreja encontrado pela autora pode-se afirmar que ele nasceu em Japaratuba no Sergipe e conhece-se os nomes de seus pais: Claudino Bispo do Rosário e Blandina Francisca de Jesus. Os significantes nos nomes de seus pais chamam a atenção: Bispo, Rosário e Jesus.

A cidade de Japaratuba tem um rico folclore e muitas festas religiosas, de onde provavelmente vem muito do que Arthur bordou em sua vida. Nada se sabe de sua família, infância. Entrou para a Marinha, trabalhou na Viação Excelsior e depois trabalhou para a família Leoni no Rio de Janeiro. Após uma visão no dia do Natal em 1938 de sete anjos e vagou por dois dias até chegar ao Mosteiro de São Bento. Considerava-se o Cristo. Tinha 30 anos quando foi registrado no Hospital Nacional dos Alienados e depois transferido para a Colônia Juliano Moreira em Jacarepaguá. Ia e vinha entre a colônia e a casa dos Leoni.

Dizia que foi obrigado a construir seu mundo paralelo, que criava seguindo as ordens que recebia. O fato é que deixou uma obra belíssima em miniaturas, bordados e assemblages. Pessoalmente gosto de ver isto como um bricolage, onde ele reordena objetos de seu cotidiano no mesmo espaço, mas de outra forma, ou seja, mexe na estrutura, resignificando.

Em sua obra destacam-se as palavras e nomes, e isto me remete a duas grandes artistas - Frida Kahlo e Louise Bourgeois que também trabalhavam com palavras. Uma de suas frases mais marcantes é " o louco é um homem vivo guiado por um espírito morto".

Também chama a atenção de Bispo executar uma arte dentro de seu mundo fechado, sua casa-forte, que ao mesmo tempo se desenvolvia no mundo da arte, o novo realismo.

A obra de Bispo é no fundo autobiográfica, seu inconsciente está presente ali e lhe traz os traços e reminiscências da infância e do que viveu e dos principais significantes para ele, porém como é algo que ele produz, como um sonho, mas ninguém consegue interpretar, nem mesmo ele, não há como decifrar ali sua história, mas para os que são mais sensíveis é possível ver uma construção ficcional de sua vida, o que não deixa de ser a realidade, uma vez que todos nós construímos uma ficção, só que temos algumas referências, e ele não as dizia ou não lembrava.
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IvaldoRocha 24/05/2016

Prêmio Jabuti de 1997, mais do que justo e merecido, vale a pena ser lido.
O que mais me impressionou é que ao final você fica com a impressão de ter lido vários livros em um só.
Arthur Bispo do Rosário, já com trinta anos, recebe na véspera de natal a visita de sete anjos, que lhe dizem ser ele o escolhido de Deus. Ele vai até a igreja da Candelária no Rio onde espera ser reconhecido pelos padres como tal, é preso e diagnosticado como esquizofrênico-paranoico e vive durante cinquenta anos entre a realidade e a ficção.

O Livro fala da sua vida de uma maneira sensível e honesta, mostra o seu relacionamento com a família Leoni onde viveu por um bom tempo. Fala da sua paixão pela estagiária de psicologia Rosangela, fala de passagens engraçada e até alguma coisa um tanto sobrenatural.

Além disso, o livro também apresenta uma amostra do pensamento reinante na época e de como os alienados eram tratados.
Para ser ter uma ideia, Rodrigues Calda, o primeiro diretor da ”Colônia Juliano Moreira”, (onde Bispo ficou internado a maior parte do tempo), em seu discurso saudando o então Ministro da Justiça (Alfredo Pinto), responsável por remodelar a assistência aos alienados através da criação de colônias, revela a intenção clara de segregar em um subúrbio distante não apenas os considerados loucos, mas igualmente os tarados, pobres, bêbados, retardados, delinquentes, mendigos, comunistas e anarquistas. E segundo o Livro “Holocausto Brasileiro” de Daniela Arbex, que conta a história do hospício de Barbacena onde morreram mais 60 mil pessoas, também iam, epilépticos, homossexuais, meninas grávidas pelos patrões, mulheres confinadas pelos seus maridos, moças que haviam perdido a virgindade antes do casamento, etc.
Ainda existia a influência do pensamento Eugênico, que buscava a pureza e o aprimoramento da raça, evitando que aqueles que pudessem empobrecer este aprimoramento, físico ou mental, pudessem procriar.
A colônia estava sempre disposta a testar novos experimentos europeus como eletrochoque e a lobotomia, para isso criou a moderna “Clínica Psicocirúrgica Egas Moniz”, nome do neurologista português que ganhou, acredite, o Prêmio Nobel de Medicina pela invenção da lobotomia. Um em cada dez pacientes operados na clínica morria e os demais ficavam em um estado lamentável.
Como contraponto o livro cita a psiquiatra Nise da Silveira uma revolucionária na sua época e contrária aos tratamentos violentos, especialmente eletrochoque e lobotomia. Fazia com seus pacientes um trabalho envolvendo pinturas e aquarelas que foram apreciadas por C. G. Jung, em Zurique no II Congresso Internacional de Psiquiatria. Arthur Bispo não teve contato com ela.
Sobre a arte de Arthur Bispo o livro cita como se deu a descoberta e o reconhecimento do artista por de trás do alienado. Basta dizer que as obras de Arthur Bispo representaram o Brasil na Bienal de Veneza de 1995, todos hão de concordar de que não é pouca coisa.
Uma de suas peças “O Manto da Apresentação” é toda bordada com reprodução de objetos, palavras e símbolos, sendo que no avesso do manto estão bordados os nomes das pessoas que ele levaria consigo para o outro mundo, para a salvação.
Lima Barreto autor de “Triste Fim de Policarpo Quaresma” que também passou pelo sistema manicomial, na época escreveu:
“ ... nosso sistema de tratamento da loucura ainda é o da idade média: o sequestro”
Arthur Bispo em uma de suas avaliações com os médicos disse:
“ Doentes mentais são como beija-flores, nunca pousam, ficam a dois metros do chão”
E agora, que acabei de escrever tudo isso, é que reparei que na minha janela tinha um beija-flor. Coincidência.
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Adriana Scarpin 11/05/2017

Para além de um estilo de biografia usual, Hidalgo utiliza de uma prosa poética sedutora para ressaltar os meandros de vida e arte de Bispo. Coisa fina.
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