kleris aqui, @amocadotexto no ig 24/01/2012Imortal: quando a eternidade não é o bastanteO Imortal
Apesar do nome, imortalidade não é exatamente o tema central do livro. Alquimia e tempo, que, por um momento achei que ficariam como segundo plano, atingiram a marca do primeiro plano da história. Algumas dessas marcas se estampam na capa ~linda~, chamando nossa atenção.
Os estudos da química antiga (alquimia) conseguiram boas conquistas sobre o mundo, sobretudo, o mundo material. Porém, eram fissurados pela descoberta da imortalidade, uma incessante busca por algo que materializasse os anseios de crenças e conhecimentos da época. E conhecimento às vezes pode ser demais, pode ser catastrófico. Uma experiência a partir de certos elementos ultrapassou os limites do que se era conhecido e aqueles que estiveram no mesmo ambiente, menos o alquimista ganancioso que realizara o experimento, fizeram a passagem para a imortalidade.
Nicolas é quem narra, filho desse alquimista ganancioso pelo poder da morte, como tem passado os últimos 500 anos desde o fatídico dia. O que seria para seu pai o grande prêmio da “vida”, para Nicolas é praticamente uma maldição, porque viver por muito tempo desgasta as pessoas, principalmente se for uma pessoa solitária. Não tendo muitas opções de viver nesse para-sempre, ele continua os estudos e pesquisas da família para chegar àquela mistura que condenara sua vida, agora “congelado” em seus 33 anos, para então chegar a um antídoto. Como sempre falta um elemento específico, ele passa a apostar num plano B que uma vez comentara com Eistein: uma máquina do tempo.
Enquanto tenta reverter tudo isso, vive num castelo de sua família na França, chamado Vale de Loire em companhia do único amigo que lhe restou, Pierre, uma figura de pessoa. Juntos eles passaram pelos 5 séculos se escondendo da sociedade e do mundo mortal, pois quem vive esse tanto de tempo tem que nascer, viver e morrer várias vezes para que ninguém note algo diferente neles. Os outros imortais não resistiram por muito tempo, acabaram forçando a morte. Assim eles descobriram que não eram totalmente intocáveis, que eles podem se machucar e podem morrer se a força de um acidente ou suicídio conseguir os levar. Descobriram também uma conexão, pois quando um deles estava prestes a se matar ou a pouco de morrer, todos os imortais “vivos” sentiam e viviam um pouco da mesma sensação. Graças a essa conexão que Pierre salvou milhares de vezes Nicolas quando se via frustrado, sem mais esperanças do seu trabalho e pesquisa. Pierre, então, era mais que a consciência de Nicolas, era ele que segurava todas as esperanças. É por essa amizade que Nicolas se esforça em trabalhar na máquina do tempo, pois além de levá-los de volta à vida antes da catástrofe, ele traria Catarina de volta, mulher de Pierre, como forma de compensar tudo aquilo que eles têm vivido.
Nesse meio tempo, acontece de um dia ele conhecer Sophie, uma mochileira que ficou com o carro no prego junto com uns amigos num lugar próximo ao castelo. Nicolas, que não é de se aproximar bem das pessoas, acaba aceitando-os como hóspedes para ajudá-los a seguir viagem, atitude bem observada por Pierre que estranha logo de cara. Pelo breve momento que estiveram próximos, Nicolas percebe que Sophie era a mulher que ele fez questão de não procurar pelo mundo por achar que amor não era algo verdadeiro. Acometido por esse amor à primeira vista, sofre ao descobrir que ela estava de casamento marcado com um de seus companheiros de viagem, Mark. Por isso ele não luta, mostrando mais de seu lado altruísta ao esperar pela decisão dela, que ele achava que deveria contar. Por um momento ela foi fraca e ficou com Mark, mas não aguenta se casar e se entrega à Nicolas. Mark então vira uma pedra no sapato dos dois. No meio de uma jornada de conhecimento, amizade, do incerto e do inimaginável, o imortal tenta encontrar seu lugar que foi roubado naquela experiência alquimista.
A trama é bem elaborada, apesar de umas fissuras que acho que pode deixar o leitor um pouco confuso, não por falta de explicação, mas sim de descrições. Às vezes muito rápidas, exageradas, ou mesmo ausentes, abria um espaço para muitas dúvidas quanto à ação ou os personagens. Nicolas era muito reservado e se entregou fácil ao amor, algo que ele não acreditava, e isso contribui para quase um ceticismo por parte do leitor, pois deixa o personagem muito impulsivo e direto quando se espera um pouco de hesitação ou dúvidas. Quase o mesmo para Sophie, que se mostra leviana e entregue a esse amor, sem questões, considerações ou mesmo espanto com essa relação que brota dos dois, afastando-se de todos para viver esse seu amor. Ela praticamente aceita sem muita resistência, numa entrega perigosa que poderia ocasionar uma fácil desilusão. Mas aí vem a questão da confiança muito rápida que pode garantir sua segurança, uma rapidez que leva ao ceticismo novamente, pois eles se conheciam por dias para nutrir tamanha relação. Talvez seja aquela ideia de paralelo em que realmente tudo é possível; tendo isso em consideração, a trama pede ao leitor que deixe de ser cético e acredite nessa possibilidade.
Um salve para Pierre que, sem querer, parece roubar um pouco das cenas. Amigo fiel, ele tenta equilibrar essa vida imortal com bom humor e serviço, ajudando como pode. Mark também não fica muito atrás, é aquele empecilho que perturba o casal por razões claras. Verdade que ele não merece a mulher com quem ia casar, mas seu papel é bem descrito.
A narração é bem leve e simples, assim como os diálogos, ora espontâneos, ora ensaiados, que fazem a leitura correr e, junto com a trama, constrói uma história que surpreende, pois quando achamos que as coisas vão correr para um lado, a autora desperta algo que não relacionamos de primeira. Como disse anteriormente, não é apenas a imortalidade o centro de tudo ~suspense~, e isso acho que foi bem trabalhado. Uma observação para o Apocalyptica que gruda fácil na cabeça. And nothing else matters...
Sempre pensei em mudar a decoração, mas, nunca o fiz de fato. Mudanças me deixam nervoso. [...] Desliguei o telefone e suspirei alto. Não gostava de visitas. Pessoas me deixam nervoso.
p. 10
- Você deveria estudar psicologia... é a décima vez que sugiro isso.
- Eu não preciso estudar pra ver o que está na cara.
- Você tem o dom, Pierre. Poderia ser o Freud desses novos tempos.
- Grande cara. – Pierre balançou a cabeça.
p.61
I never opened myself this way
Life is ours, we live it our way
All these words I don't just say
And nothing else matters
Trust I seek and I find in you
Every day for us something new
Open mind for a different view
And nothing else matters
(Mettalica - Nothing Else Matters)
~~ Vanessa Bosso é escritora e publicitária.