spoiler visualizarVanderlei 23/12/2015
Observações sobre a peça
Desaforado, Arthur Miller, como ele esfrega na nossa cara o que fizemos com Willy!?
Em “A morte de um caixeiro viajante” somos colocados diante das sequelas que a sociedade moderna cria, com uma frequência bastante indiscreta. Não tivemos escolha, somos parte dela, é o jogo que jogamos. O autor soube perceber no ar granuloso de sua época o prognóstico desse desastre, e sua peça traz esse registro.
Willy é, sim, vitima de nosso tempo, e por que não nossa!? Todos estamos expostos ao que aconteceu com ele, mas fazemos parte do que sustenta o sistema que o engoliu, tão atual.
A década de 50 nos EUA foi positiva economicamente, reacendeu o poder da locomotiva e, no eixo, foi aplicada toda a força para o “avanço”. Esse ar granuloso ao qual me referi, era o espírito visível do cada um por si, e luta constante pela sobrevivência, o mundo se reafirmando como selva. A mídia transbordava a imagem do american way of life, queria se mostrar um páreo forte contra o oriente.
Enfim, Willy sofre do mal do milênio. Busca o sucesso. Um bem escasso, para poucos. Não aceita sua vida medíocre, se prefere famoso. Transmite isso aos filhos, afinal, a renda não pode parar. E a vida pra qual Willy se doou deve ser passada em forma de moedas de ouro, ou filhos de ouro, que de preferência botem ovos de ouro e continuem erguendo os Loman.
Ben é o contrário, é o desenho da perfeição. Uma figura abstrata, que nunca está de fato presente. Dá essa impressão, pois é tão distante, inatingível que a obsessão de Willy por ele se mostra uma grande sandice “E se tivesse ido ao Alasca”. Dono de uma pressa, de uma urgência, inesgotáveis.
Happy e Biff são os impertinentes lembretes da realidade. Happy, embora visivelmente inadequado para os desejos do pai se esforça em participar do delírio. Biff é o favorito, homem com atitude filosófica, soube perceber que aquilo era uma fórmula, da qual ele não conseguiria, e, aliás, não precisava, participar. Soube mostrar ao pai que ser um fracassado, ou, não ser um homem de negócios não era o fim, o sucesso é relativo e as imagens padrões projetadas são raramente atingidas pela maioria.
Linda é uma mulher que não serve para os dias de hoje, dedicada e entregue é alguém fraco, que está tão fora do jogo que até para o mal que atinge o marido está imune, tamanha sua despolitização. O amor, a emoção, a piedade não entram no jogo dos grandes competidores.
Bernard e Charley dispertavam inveja. E no fim, conduzindo Linda, Happy era ladeado pelos dois. Dando a entender que embora Biff tenha despertado, o sentimento de Willy permanece, e quem mantém esses valores é a parcela poderosa das pessoas.
A morte de um caixeiro viajante não era bem como Willy imaginava. Uma profissão simples e pouco admirável, no contexto em pauta. “De chinelo verde e veludo no vagão para fumantes...Quando ele morreu centenas de vendedores e compradores foram ao enterro. Todo mundo triste numa porção de trens até meses depois.”
“A única coisa que vocÊ tem nesse mundo é o que vende.”, Charley para Willy.