jota 31/01/2012História sem fimNão sei se é possível empregar no extenso panorama criado por Alberto Manguel em Uma História da Leitura, a expressão que celebrizou o historiador francês Fernand Braudel em 1949 (ano em que publicou o livro O Mundo Mediterrâneo à Época de Felipe II), "história de longa duração".
Possível ou não, Manguel vai fundo naquilo que trata - uma história da leitura, desde as primeiras tabuletas sumérias da Antiguidade até o hipertexto nos textos em nossos computadores. Uma história de longa duração que, como o próprio Manguel diz, felizmente não acaba nunca. Não mesmo; quando ele terminou de escrever o livro, em 1995, os e-books e os os aparelhos leitores de e-books ainda não deviam existir. Ou não existiam como os conhecemos hoje.
Este livro é um trabalho profundo, bastante erudito, apresenta uma infinidade de informações e referências, mas não é nunca aborrecido (também é fartamente ilustrado, ainda que apenas em p&b); pelo contrário, estimula, em grande parte do tempo, nossa curiosidade em conhecer mais. Pois Manguel sabe muito bem misturar a longa história da leitura com as histórias ocorridas com ele, amigos, escritores, leitores, etc. Várias delas são bastante engraçadas ou originais. Então, ele não deixa nosso interesse cair em nenhum momento, mesmo nas passagens de cunho puramente historiográfico - felizmente as notas foram todas remetidas para o final do livro; não há rodapés.
Durante a juventude, por cerca de dois anos, Manguel leu livros para o escritor cego Jorge Luis Borges, mas ao contrário do mestre argentino, ele escreve claramente e se há algo de fantástico (o gênero de histórias que consagrou Borges) aqui é exatamente o modo como ele reuniu o conjunto das informações todas que coletou, de uma forma bastante agradável de se ler. Nenhum capítulo é tão extenso ou pesado que nos tire a vontade de lê-lo até o final, sem interrupções.
Além disso, claro, ninguém escreveria uma história como esta se não amasse profundamente os livros. Separado deles por algum motivo, Manguel escreve: "Sei que algo morre quando abandono meus livros e que minha memória insiste em voltar a eles com uma nostalgia pesarosa." Depois prossegue: "(...) Quanto mais decrépita minha memória, mais quero proteger esse repositório do que li, essa coleção de texturas, vozes e odores. A posse desses livros tornou-se fundamental para mim, porque agora sinto ciúme do passado."
Cinco estrelas, claro. Ou mais, se fosse possível.
Lido entre 30.12.2011 e 30.01.2012.