Danielle 04/07/2012
No inferno é sempre assim.
Na orelha: Termino de ler estes contos com a certeza de que leitor algum passará ileso por eles. A orelha em questão é a do livro No inferno é sempre assim e outras histórias longe do céu (que título lindo, meu Deus) (Dublinense, 2011) no qual a autora, Daniela Langer, nos oferece onze deles.
Segundo Poe, conto é onde o autor tem que conseguir, com o mínimo de meios, o máximo de efeitos. Mas Cortázar tem um definição magistral: no romance se ganha por pontos, em contos, por nocaute.
Então que, quando você pega o livro da Daniela, cuidado, você pode sair nocauteado.
A narrativa dessa autora é intimista, com uma evidente preocupação com a linguagem (era todo pedra quando jogou força à vitrine) que faz um momento se desdobrar num infinito dentro da cabeça do personagem, dentro de sua cabeça, labirinto melancólico onde perfilam personagens com vidas, aparentemente, ordinárias, e por isso mesmo, tão próximos de nós. Personagens que, seja nos mil olhos de um mosca, ou no reflexo de uma vidraça, caem numa epifania que quase cega o leitor mais desatento.
Daniela joga uma carga sentimental bruta em cima do papel, que pesa. Imagens tão reais que dá pra sentir na ponta dos dedos. Mas também esconde pequenas caixinhas mágicas perdidas (Wells, olhos de ressaca), ou seja, você sai de um sorriso maroto pra um nó na garganta em segundos. Palmas.
Evidente que não é fácil manter uma pulsação ritimada em livros de contos, mas Daniela consegue contornar os percalsos do estilo da melhor maneira possível.
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O dragão envolvia o músculo teso, volteando pela axila, a tinta-chama-vermelha saindo de onde os tufos de pelos escuros gotilhavam água feito lágrima de despedida. O dragão com a cauda em mil voltas, milhares de voltas a cauda que, em linhas indivisíveis, virava corpo, que, sem nenhuma fronteira, transmutava-se em chamas. As chamas duras, rococós, um enfeite nulo. As chamas escorrendo pelo braço, fugindo pelo cotovelo – vomitando o verão.
Trecho do conto: Primo Lucas.