Flávia Menezes 16/04/2022
DORMINDO COM O INIMIGO.
?Rose Madder?, de Stephen King, publicado em junho de 1995, é uma história forte, sobre uma mulher que tem 14 anos de sua vida roubados pela violência sofrida em um relacionamento abusivo (tanto física quanto psicologicamente) com um marido violento e corrupto, que trabalha como policial em uma cidade pequena onde todas as suas atrocidades são encobertas. Apesar da trama trazer um enredo tão denso, tenho que dizer que foi muito mais fácil de ler do que eu imaginava. E o resultado, é mais uma obra prima desse brilhante autor.
Como todo bom vilão desenvolvido por King, Norman Daniels é um homem cruel e bastante violento, e o autor foi sagaz lhe dando um nome tão sugestivo como esse, já que o mesmo foi utilizado no romance de suspense ?Psicose?, de Robert Bloch, onde o antagonista, Norman Bates, também é um homem igualmente violento e bastante cruel.
A caracterização de Norman é marcante não apenas por seus atos animalescos, mas porque ele mais parece ser um cruzamento entre Ted Bundy e Hannibal Lecter. Só por aí, já é possível perceber que suas cenas são bastante carregadas de muito horror, resiltando tanto choque quanto repulsa.
Tão bem desenvolvida quanto seu marido antagonista, a protagonista Rosie Daniels é uma mulher a quem logo de cara nos afeiçoamos. Primeiramente, porque sofremos com ela por toda a violência sofrida ao lado desse marido. Rosie é o retrato da mulher que está presa a um casamento com um homem abusivo. Ela sofre todos os atos grotescos aos quais ele a expõe, totalmente calada. Não porque ela seja ?mulher de malandro?, e que gosta de apanhar. Mas por não saber, como fugir dessa realidade caótica vivida ao lado de um homem que tem proteção da própria polícia para manter seu comportamento violento.
Nesse ponto, King é brilhante ao descrever as cenas iniciais, nos fazendo, inclusive, sentir todo o vazio e toda a falta de esperança que existe em Rosie. E quando ela decide ir embora, sofremos com ela a cada instante pelo medo de que esse homem consiga encontrá-la.
O crescimento da personagem, ao longo da história, é simplesmente fascinante. Da mulher cheia de medos, sofrendo de estresse pós-traumático, para a mulher que encontra o seu lugar no mundo, e vive a vida com uma intensidade, é algo muito tocante.
Um outro ponto bastante genial da parte do autor, é a forma como as narrações vão sendo oscilando do ponto de vista da Rosie para Daniels. Enquanto nas partes da Rosie sentimos toda a paixão, todo o desejo de viver a vida intensamente, todo o gosto por cada nova vitória, nas partes de Norman, é palpável toda a fúria, ódio e prazer em ferir os outros, que saltam de cada palavra escolhida pelo autor.
Cada momento desse livro é escrito com grande maestria. Claro que minha paixão pelo mestre me faria dizer algo assim, mas a verdade é que surpreende cada detalhe grandioso dessa história. A forma com que o King nos mantém apreensivos quando um personagem é colocado em perigo, é fantástica. Você quer gritar para que ele fuja, que não entre em determinado local, e essa sensação é tão intensa, que você tem que se segurar! Somente um escritor dessa categoria, para fazer algo tão brilhante assim.
Uma curiosidade que eu gostaria de compartilhar nessa resenha, é que uma coisa que me chamou muita atenção quando iniciei a leitura, é que a trama tinha pontos em comum com o livro (e filme) do autor Nicholas Sparks, chamado ?Um Porto Seguro?. Só que, Nicholas publicou seu livro 15 anos depois da publicação do King. O que nos faz pensar que... Ah! Nicholas seu danadinho!!
Enfim, confesso que é até difícil falar desse livro, porque eu amei tanto a forma como ele foi escrito! Os personagens são envolventes, existe uma pitada gostosa do bom romance ao estilo King, e por mais que algumas cenas nos choquem, ao mesmo tempo, ele nos instiga de um jeito que é impossível largar essa leitura.
Minhas expectativas com esse livro foram todas superadas. King mais uma vez foi brilhante! Sem contar que nessa história, o mestre praticamente faz uma reverência a todas nós mulheres, pela nossa coragem em continuarmos firmes e decididas a sermos felizes, mesmo em um mundo onde muitas vezes, o masculino nos seja tão hostil.
Obrigada mestre, por mais uma obra prima tão incrível quanto essa.